Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O aborto em discussão

A revista Claudia parece ter reencontrado sua vocação de pioneirismo na discussão dos temas femininos com ‘O mapa do aborto’. A matéria – seis páginas da edição de junho – é ilustrada por um infográfico que mostra a situação mundial em relação ao aborto: de países (em vermelho) onde é proibido aos países (em verde) onde é permitido sem restrições. E, em um convite para as leitoras, toma posição: ‘Leia esta reportagem e entre no debate para pressionar o Congresso Nacional – se depender dos parlamentares, nossa legislação vai andar para trás.’

Sem tratar de casos pessoais e sem apelar para argumentos emocionais, a revista presta um serviço às leitoras com as estatísticas que revelam os efeitos dos abortos clandestinos, mostra os projetos relacionados ao tema e explica o que está acontecendo hoje no Brasil:

‘O Projeto de Lei nº 1.135/91, que elimina a pena de prisão (de um a três anos) para quem aborta e que pode tirar o Brasil da zona vermelha para alinhá-lo com os países modernos, corre risco de engavetamento. Depois de ser rejeitado na Comissão de Seguridade Social e Família, aguarda um parecer na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, onde a possibilidade de vitória é remota: quem a preside é o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), membro da bancada evangélica e um dos signatários da proposta que torna o aborto um crime hediondo.’

Um problema que é de todos

Além de discutir a pressão religiosa no Congresso, a revista fala de propostas que classifica como ‘pérolas do atraso’: a concessão do pagamento de um salário mínimo por mês (por dezoito anos) para mulheres vítimas de estupro que tenham o filho e o projeto quer criar um registro público de gravidez. E mostra o que o governo tem feito para ajudar mulheres vítimas de práticas inseguras.

Sem discutir aspectos éticos, religiosos ou morais da opção pelo aborto, a revista preferiu discutir a realidade – os dados sobre a prática ilegal, a situação no resto do mundo e convocar as leitoras ao debate, argumentando:

‘Mesmo que você seja contra o aborto e tenha certeza de que jamais irá praticá-lo, deve entrar nessa discussão, já que a proibição não impede que, a cada ano, conforme estimativas, 1 milhão de abortos sejam realizados no Brasil, sendo que 220 mil deles levam a infecções graves e perfurações no útero, entre outras complicações. Concordar com a descriminalização não é endossar a prática como método de planejamento familiar. Trata-se de respeitar o direito de quem pensa diferente, numa sociedade diversa e plural como a nossa.’

Sem dúvida, uma maneira jornalisticamente eficiente de trazer para suas páginas um assunto que diz respeito às leitoras e a todas as mulheres: um assunto sério, discutido com seriedade, sem menosprezar a inteligência de quem lê.

Fica agora, além do convite para as leitoras de Claudia, um convite para os demais veículos da mídia, principalmente aqueles que se autoclassificam como preocupados com os problemas da sociedade como um todo: que sigam o exemplo da revista e também discutam, sem entrar no terreno da religião, um problema que é de toda a nação.

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Jornalista