ELEIÇÕES 2006
Guilherme Scarance
Internet revela ao eleitor em quem não votar
“Ao digitar 21 vezes os botões da urna eletrônica, no dia 1º, o eleitor brasileiro estará sob intensa pressão. Operações da Polícia Federal, CPIs e denúncias sobrepostas numa velocidade inédita na história do País revelaram a importância de uma escolha consciente. Para se certificar de que os cinco candidatos selecionados não estarão no próximo escândalo, o brasileiro tem, na internet, um grande aliado. Para ajudar indecisos ou reforçar convicções, pelo menos seis portais especializados trazem o raio X detalhado daqueles que brigam pelo voto dos 125,9 milhões de eleitores.
Organizações não-governamentais como Voto Consciente, Contas Abertas e Transparência Brasil criaram páginas e ferramentas na internet que permitem conhecer o candidato, saber se ele está envolvido em denúncias ou se responde a processos criminais. Dá ainda para acompanhar a prestação de contas e a evolução do patrimônio. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e os Tribunais Regionais Eleitorais listam as candidaturas sob suspeita.
Desde o escândalo do mensalão, em junho de 2005, o Legislativo tem sido alvo constante. E isso se converteu em indecisão e desconfiança do eleitor. Habituada a acompanhar o noticiário político pela internet e se aprofundar pelos jornais, a engenheira química Andrea Fernanda, de 33 anos, é um exemplo. ‘Não sei em quem votar para o Legislativo, porque todas as propostas são iguais. E, quando chegam ao poder, não fazem nada’, protesta, indignada com os recentes casos de corrupção.
O portal Excelências, da Transparência Brasil, filtrou dados da Câmara, de diversos tribunais e da própria ONG para criar perfis detalhados dos candidatos a deputado federal e ajudar indecisos como Andréa. Após selecionar Estado, partido e nome do candidato, o internauta terá uma ficha completa. Se o político estiver tentando a reeleição, será possível destrinchar carreira política, ocorrências na Justiça, notícias, bens, receitas e despesas da campanha, lista de doadores da eleição de 2002 e ver o balanço da sua atuação parlamentar.
RANKING
Em 2005, 88,7 milhões de brasileiros se conectaram à internet, revelou no último dia 15 a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), o mais completo estudo socioeconômico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São 21% dos brasileiros, a maioria jovens que, com simples cliques de mouse, podem vasculhar o passado dos candidatos.
Quem aponta o interesse crescente dos jovens por política é o movimento Voto Consciente, ONG formada por voluntários que fiscaliza vereadores e deputados estaduais de vários Estados e faz regularmente um ranking dos parlamentares paulistas. O site do movimento traz, adicionalmente, informações básicas sobre as funções de cada Poder e indica cursos de política. Só em agosto, recebeu 123 mil acessos na sua página na internet. Em um único dia, foram 7,5 mil visitas.
Contas Abertas é uma entidade da sociedade civil, sem fins lucrativos, que reúne ‘interessados em conhecer e contribuir para o aprimoramento do dispêndio público’. Com base em dados e balanços oficiais, prepara análises ligadas ao Orçamento e à sua execução. Costuma denunciar o uso eleitoreiro de verbas públicas ou a abertura dos cofres de maneira incomum em ano de eleição. Também está tudo na internet.
POR REGIÃO
Para permitir o acompanhamento do panorama nacional, o Portal do Estadão traz a lista de todos os candidatos aos governos estaduais, além de resultados de pesquisas e notícias diárias, divididas por região.
Definidos os candidatos a deputado estadual e federal, senador, governador e presidente, os eleitores mais exigentes podem ainda vasculhar a página do próprio candidato, verificando as suas propostas, idéias e coligação partidária.
A partir de 2007, de seu micro, o internauta poderá cobrar o cumprimento das promessas. Aí, porém, o e-mail pode ficar sem resposta, avisa a vice-coordenadora-geral do movimento Voto Consciente, Rosângela Torrezan Giembinsky, que conhece bem as dificuldades de cobrar o Legislativo, pois acompanha há 19 anos o trabalho da Assembléia paulista e dos vereadores de São Paulo. ‘A gente sabe que não é assim tão simples.’”
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Imprensa é ‘cabotina e alquimista’, acusa PT
“O boletim de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, enviado ontem por e-mail e intitulado ‘Força do povo, fraqueza da mídia’, classifica a imprensa como ‘cabotina’, ‘elitista’ e ‘alquimista’ (uma referência ao adversário de Lula, o tucano Geraldo Alckmin – e não à alquimia, ciência que transformava metais comuns em ouro).
O PT alega que, para parte da imprensa, ‘a população confiaria nos meios de comunicação, ao mesmo tempo que desconfiaria dos políticos, governos e partidos’. ‘Nos próximos dias, esta imprensa alquimista fará de tudo para nos derrotar. Para eles, não está em questão apenas o resultado eleitoral. Está em jogo sua hegemonia sobre a população brasileira.’
O ataque segue: ‘Jornais que hoje posam de democráticos e de liberais estiveram ao lado dos golpistas em 1964, apoiaram a ditadura militar, encobriram os desaparecimentos e as torturas.’ Para o PT, parte da imprensa não aceita que ‘o povo seja capaz de pensar’ sem depender dos ‘auto-proclamados formadores de opinião’.”
Dora Kramer
Alegação de insanidade
“Dizer que dossiê é obra de loucos ou burros é tentar tornar seus autores inimputáveis
Até agora, o roteiro da reação governista ao escândalo do dossiê Vedoin não falhou, seguiu à risca os antecessores: a escalação de culpados no segundo time, as manifestações de indignação e de repúdio, os apelos à apuração rigorosa e punição exemplar ‘doa a quem doer’.
Não faltou nem o argumento-chave do advogado criminalista – o governo dispõe de um dos melhores do mercado dando expediente no Ministério da Justiça. Neste caso, a defesa é concentrada na alegação de insanidade dos réus.
Mentecaptos rematados, Freud Godoy, Gedimar Passos, Expedito Veloso, Valdebran Padilha, Hamilton Lacerda, Oswaldo Bargas, Jorge Lorenzetti e Ricardo Berzoini, armaram plano à revelia dos chefes – a saber, o presidente Luiz Inácio da Silva e o senador Aloizio Mercadante – para ajudá-los e, burros que dói, terminaram criando uma complicação sem tamanho.
Mas, como são estúpidos e tudo é fruto de presença reduzida de massa encefálica nas desorientadas cabeças, tome-se emprestado ao programa humorístico de televisão o título de Organizações Tabajara e teremos, no máximo, um grupo de idiotas que não sabem o que fazem.
A ‘tese’ de que tudo o que se passou seria fruto de delírio e incompetência dos acusados serve à conveniência dos acusadores. É atitude pouco séria e menos ainda digna de credibilidade.
Dizer que são estultos e insanos absolve a todos de antemão e os exime de responsabilidade. Tanto os mandantes quanto os executores, pois, já que nenhum deles sabia exatamente da conseqüência de seus atos, há uma chance de que não sejam por eles culpados criminalmente.
Sendo assim, as coisas ficam reduzidas a uma brincadeira de mau gosto quando, na realidade, é tudo fruto de um plano bem engendrado, cujo defeito foi ter dado errado.
PT e governo querem trocar de papel com seus acusadores, pretendendo que são vítimas de acusações injustas. Primeiro, condenam com veemência o dossiê, depois acusam a oposição de fazer uso eleitoral da operação – esquecendo-se da ação em si.
Não demora apontarão os veículos de comunicação que noticiam os fatos como integrantes de um movimento de conspiração, coisa que já fazem de forma transversa, mas, em breve, farão de maneira direta.
Em seguida, e este será o movimento vindouro, se a eleição for para o segundo turno vão gritar que o processo eleitoral está sob suspeição, pois, se contrariarem as pesquisas, na ótica oficial haverá suspeita de fraude.
Mas, como crer em fraude, se o processo eletrônico, resguardado ademais pela fiscalização dos partidos, é tido como dos mais seguros no âmbito internacional?
Não importarão as condições objetivas frente às conveniências subjetivas de imaginar que tudo é possível, se houver a mínima possibilidade de fazer crer ao eleitorado que um eventual resultado adverso é fruto da ação nefasta dos oposicionistas e não conseqüência dos atos inconseqüentes dos governistas.
Pista nacional
Na visão dos integrantes da CPI dos Sanguessugas, muito mais útil para os esclarecimentos sobre a origem do dinheiro que pagaria o dossiê Vedoin será a perseguição dos reais sacados em bancos brasileiros que a tentativa de seguir a trajetória da entrada ilegal dos dólares apreendidos com os petistas Valdebran e Gedimar.
Por ilegal, a trajetória dos dólares é mais difícil de desvendar, enquanto o caminho dos reais só depende dos gerentes dos bancos e do uso adequado dos instrumentos de fiscalização do Banco Central.
Confiança bancária
Os documentos que chegaram à CPI só serão examinados após as eleições, a fim de não dar espaço ao governo para invocar motivação eleitoral.
Ao mesmo tempo, parlamentares de oposição manifestam receio de que suas contas salário do Banco do Brasil estejam sendo monitoradas por adversários cujos cargos se devam ao aparelhamento petista da máquina do Estado.
Lembram que no início do ano um funcionário comissionado, conhecido como ‘mixirica’, foi demitido depois que deputados e senadores de oposição suspeitaram que estivessem sendo vigiados e pediram providências ao chefe do Gabinete Institucional de Segurança, general Jorge Félix.
Se não houver segurança de sigilo, os parlamentares cogitam deixar de ser clientes do Banco do Brasil.
Crédito
Lula e o ministro Márcio Thomaz Bastos tomam para si o crédito pelo repúdio ao dossiê Cayman – uma montagem de acusações contra tucanos, patrocinada pela turma de Fernando Collor em 1998 – como instrumento de campanha.
Quem teve a iniciativa de avisar ao PSDB, mais especificamente a José Serra, da armação, foi Marta Suplicy, depois de ter sido procurada por familiares de Paulo Maluf, apelando ao uso do material contra o então candidato ao governo de São Paulo Mário Covas.
Marta rejeitou liminarmente, mas Thomaz Bastos se interessou pelo conteúdo do material antes de repudiá-lo em face da suspeita de fraude.”
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Na TV, aplauso a Annan vira ovação a discurso de Lula
“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não foi aplaudido de pé após discursar na abertura da 61ª Assembléia-Geral das Nações Unidas no último dia 19, em Nova York, ao contrário do que mostrou sua propaganda eleitoral de quinta-feira, na TV. As entusiasmadas palmas exibidas no programa do presidente não foram para ele, mas, sim, para o secretário-geral da ONU, Kofi Annan.
Na propaganda levada ao ar, fica evidente que se trata de uma montagem de edição. Os aplausos dos representantes de 192 países foram dirigidos a Annan, que fez um emocionado discurso de despedida, pois deixa o cargo em dezembro. Annan falou antes de Lula. O presidente foi ovacionado oito horas mais tarde e em outro local: num jantar reservado no Hotel Marriott, ao receber o prêmio de ‘Estadista Mundial’ do Ano de 2006 que lhe foi concedido pela Appeal of Conscience Foundation (Fundação Apelo da Consciência).
No plenário da ONU, Lula elevou o tom das cobranças aos países ricos, especialmente aos Estados Unidos, criticando a ‘falta de determinação política’ das grandes potências para derrotar o terrorismo e a fome. Na edição que o horário gratuito mostrou, o presidente aparece falando apenas do que fez no Brasil, do Bolsa-Família e do aumento do salário mínimo.
Com 15 minutos cronometrados, o pronunciamento de Lula não causou empolgação aparente. A secretária de Estado norte-americano, Condoleezza Rice, chegou atrasada, quando ele praticamente terminava sua fala. Condoleezza sentou-se na primeira fileira, à espera do discurso do presidente George W. Bush, orador que sucedeu Lula.
Bastante abatido naquele dia, Lula recusou logo depois – pela primeira vez, desde 2003, – o convite de Annan para participar do almoço com chefes de Estado e de governo, na própria sede da ONU.”
Daniel Piza
O plano quase perfeito
“Todo mundo lançou mão do trocadilho ‘Freud explica’ ao saber que um dos envolvidos na compra & oferta de suposto dossiê contra José Serra era nada menos que o assistente pessoal do presidente Lula, Freud Godoy. O que faltou examinar é como Sigmund Freud explicaria. O ‘como’, afinal, é tudo, na frase do personagem de Clive Owen no filme O Plano Perfeito, de Spike Lee. Bem, me parece claro que o mecanismo em questão é a projeção, o ato de uma pessoa atribuir a outra aquilo que se origina nela mesma. Exemplo que vem muito a calhar: um sujeito que diz que ‘ninguém é 100% honesto’ não está fazendo uma análise objetiva da humanidade, por mais plausível que seja; está tentando justificar sua própria desonestidade ao projetá-la nos outros.
É essa reação curiosa que vemos nos petistas e seus simpatizantes toda vez que um deles é flagrado em delito. Se crimes foram praticados, conforme provas documentais e testemunhais, é porque são ‘praxe’ no sistema político brasileiro; daí a frase ‘A culpa é do sistema’, por sinal um velho bordão do esquerdismo. Foi assim no caso do caixa 2, que Lula reconheceu existir em seu partido antes mesmo que a Justiça apontasse a contravenção ou a Polícia Federal a flagrasse. (No entanto, na hora de proteger seus amigos no varejo, ele sempre diz que é preciso esperar a sentença oficial – uma contradição que deliciaria Freud, o legítimo.) Foi assim no momento em que os extratos do BMG e Rural demonstraram o benefício a vários políticos do PT e partidos aliados por meio de um empresário vencedor em licitações.
E foi assim agora, depois que uma série de petistas perdeu seus cargos partidários e/ou oficiais – inclusive um ex-ministro, Ricardo Berzoini – por causa da articulação de uma denúncia contra o PSDB, provável vencedor nas eleições estaduais de São Paulo. Os defensores dizem que é ‘falso moralismo’ atacar o PT e o governo porque, afinal, produzir dossiês, dedurar movimentações ilegais de dinheiro e fazer tráfico de influência são atitudes corriqueiras numa política dominada por ACMs e Sarneys – que os tucanos também praticam; que, aliás, políticos em toda parte praticam. Ou seja: os petistas que tanto criticavam a falta de ética quando era oposição faziam, em termos freudianos, uma projeção de si mesmos.
Esse recurso narcisista não consegue ocultar alguns fatos. Primeiro, que num país de Judiciário lento e clientelista pode ser difícil comparar corrupções (quem roubou mais, quem começou, etc.), mas não dá para negar que nem no governo Collor tanta baixaria foi comprovada de modos tão consistentes. Alguns ingênuos podem dizer que é porque hoje a corrupção está sendo mais investigada. Então pergunto: isso é motivo para deixar de puni-la? E não é assim, com respeito às provas, que se procedem julgamentos? Por muito menos, Nixon teve de renunciar à Presidência dos EUA. Sim, corrupção existe em todo lugar; o que muda de endereço é a impunidade.
Há, aí, um paralelismo ao qual o dr. Sigmund daria importância enorme, fã que era dos lapsos e fetiches: muitos dos crimes que estão sendo cometidos neste governo são aqueles que foram ou teriam sido cometidos no governo FHC. Se no governo anterior houve compra de votos para reeleição, neste houve o mensalão. Se houve ‘privataria’, agora houve o aparelhamento das estatais e fundos de pensão por sindicalistas e ONGs – o ‘estatelionato’. Se altos funcionários tucanos foram pegos em diálogos ou favores suspeitos, o Palácio do Planalto lulista se tornou um dominó de demissões incontornáveis, sala a sala. Se tivemos um tal dossiê Cayman, temos hoje os dólares ‘offshore’ de Duda Mendonça. E assim por diante. Os fantasmas que assombravam os petistas ganharam carne e osso – sua própria carne e seu próprio osso.
Outro fato ignorado pelos que anistiam o PT é o de que ele foi eleito para acabar com isso. Por que, ao assumir, não apurou todos esses escândalos que lhe fizeram gritar ‘Fora FHC!’ tantas vezes? Queremos, sim, saber como Serra não detectou a ação da máfia sanguessuga em sua gestão no Ministério da Saúde, ou se dela se valeu, assim como Barjas Negri. Queremos saber isso, porém, não apenas porque ficou evidente a extensão dela na gestão de Humberto Costa. Além disso, como se tem mostrado nas mais diversas prefeituras, o PT não ‘aprendeu a roubar’ ou ‘precisou meter as mãos na merda’ a partir de 2003.
A corrupção que se vê consegue ser ainda mais sistemática e descarada do que a que nem sempre se via. Mas, para a maioria da população, que também faz projeção freudiana em Lula – aquele que ‘chegou lá’, mas nunca sabe de nada até que precise ‘afastar’ o traidor – ou por ele alivia a culpa social, isso não importa muito, pois ‘todos roubam’. Lula foi eleito porque seria bem diferente. Se reeleito, será por ser quase igual.
UMA LÁGRIMA
Para Sven Nykvist, fotógrafo de cinema, sueco, morto aos 84 anos. Ele nasceu no ano modernista de 1922 e ajudou a levar para o cinema as sombras e descontinuidades dessa estética. Com Bergman, podia fazer o jogo de focos de Persona ou o banho de cores de Gritos e Sussurros. Com Woody Allen, criou o granulado que Crimes e Pecados pedia. O sinal de sua grandeza é que, sem sua fotografia, os filmes perderiam boa parte do sentido.
DE LA MUSIQUE
Muitas mensagens sobre o declínio da MPB. Há um lamento geral dos admiradores. Alguns observam que há talentos como Guinga e André Mehmari, sobre os quais tenho escrito aqui, mas é importante notar que, ao contrário de Chico, Caetano e companhia, eles não conseguem o feito de chegar ao público amplo e ao sofisticado ao mesmo tempo; não são muito ouvidos nas rádios ou assobiados nas ruas. Outros notam que hoje há diversos gêneros disputando espaço e que em outras artes, como a literatura e o cinema, tampouco temos nova geração equivalente. É verdade até certo ponto. Eu queria ver um compositor que mesclasse acesso emocional e refinamento formal como Milton Hatoum na ficção ou Fernando Meirelles no cinema. Um leitor disse que comparar com grandes nomes é um peso desnecessário. Não; é assim que a cultura se produz, na relação exigente entre gerações.
Sobre o CD de Bob Dylan, Modern Times: se o criador de Hurricane tampouco está à altura de seus melhores anos, há nas novas canções uma releitura interessante de sua origem no folk, no country e no r&b. Spirit on the Water, que virou videoclipe com Scarlet Johansson, e Ain’t Talking trazem uma pegada rítmica, de canto-falado, que agrada já na primeira audição. Mas é Workingman’s Blues # 2 a grande faixa do disco. O que era protesto vigoroso ganhou um toque melancólico, mas sabemos de que lado Dylan está: ‘Ou você se esconde atrás ou luta ao máximo na linha de frente’, diz o refrão. E fica.
CADERNOS DO CINEMA (1)
Em O Diabo Veste Prada, de David Frankel, é possível ver o artifício que Hollywood domina tão bem de fazer a um universo específico uma crítica e um elogio ao mesmo tempo. O filme tenta fazer uma mistura de Bonequinha de Luxo com Sex and the City e não consegue por não ter a graça do primeiro nem o veneno do segundo. Mas diverte pela sátira leve que faz ao narcisismo do mundinho fashion, contando em especial com a atuação de Meryl Streep (uma editora de moda arrogante, como Anne Wintour, e que não precisa gritar para ser desagradável), e pela qualidade das roupas – desfiladas por Anne Hathaway, que embora não tenha o cosmopolitismo de Audrey Hepburn nos seduz por sua beleza e elegância. Estilista bom não faz roupa só para mulher-cabide.
CADERNOS DO CINEMA (2)
O argumento de O Maior Amor do Mundo, de Cacá Diegues, já embute todos os seus problemas. Para fazer valer sua tese, é preciso que o protagonista (José Wilker) seja um astrofísico ateu, radicado nos EUA e sexualmente inexperiente; é preciso que ele esteja em busca da mãe biológica numa favela de sujeira cenográfica e seja ajudado por um menino de boa índole metido no narcotráfico; é preciso que ele descubra a felicidade ao transar com uma negra belíssima (Taís Araújo); e é preciso que desça ao inferno ao som de Tristão e Isolda e com cenas de realismo mágico para se redimir e renascer. Eis, assim, a tese: brasileiros não são travados, racistas e racionalistas, mas espontâneos, tolerantes e apaixonados. Se o país tem problemas graves, também tem qualidades únicas. E tome clichês.
POR QUE NÃO ME UFANO
O Clube dos Polianas, que acha que o Brasil já atingiu a maturidade democrática, também defende a tese de que hoje a economia não depende da política, protegida pela arquitetura de suposta racionalidade técnica. É como se o crescimento medíocre do PIB nada tivesse a ver com a política econômica dos últimos 12 anos, baseada em juros altos e impostos crescentes. É como se os gastos ‘sociais’ e a falta de investimentos em infra-estrutura e inovação não fossem cobrar, cedo ou tarde, seu preço alto.
AFORISMOS SEM JUÍZO
Ele não conseguia ganhar as garotas, não era bom no futebol e não sabia fazer contas. Virou escritor.”
CICARELLI NA WEB
Stella Senra
A modelo, o papa e o lugar público
“As imagens são, ao mesmo tempo, o lugar da verdade e da mentira, da realidade e da ficção, da objetivação e da encenação. Por isto a simulação, tanto no sentido corriqueiro do termo (fingir o que não se é), quanto na sua acepção militar (fingir o que poderá vir a ser ou que será) nelas se funda e delas procura tirar o maior partido. Curiosamente quando as técnicas de captação, de distribuição e de acesso à imagem se tornam instantâneas (isto é, quando todos podem tudo captar e tudo ver o tempo todo) mais cresce a dúvida sobre o que é visto; e, por conseqüência, maior passa a ser a margem da simulação.
É em razão desta visibilidade excessiva e do caráter cada vez mais ambíguo das imagens que se torna difícil distinguir a captação furtiva da imagem dos indivíduos, da escolha que eles fazem de se oferecer ao olhar da câmera. Muitas vezes é quase impossível determinar quem decide – o fotógrafo ou o modelo -, fazendo que seus gestos praticamente se sobreponham, com grande proveito, aliás, para o sistema midiático mundial e para a rede: afinal eles detêm um público cativo de espectadores e freqüentadores e contam com seus imaginários desenhados pela sociedade de consumo… de imagens. Ocorre que a instauração dessa visibilidade absoluta, da qual, no entanto, se duvida o tempo todo, abre campo para a transformação da simulação em estratégia, cujo uso político ou em proveito próprio não pára de se ampliar.
O escândalo recente em torno das fotos do idílio da modelo Cicarelli tem origem no caráter dito ‘chocante’ das imagens; mas toda a polêmica gira em torno da mesma questão: as fotos teriam sido ‘roubadas’, ou a responsabilidade por elas caberia unicamente ao esperto paparazzi? Parece, no entanto, que a pergunta mais pertinente não deveria dizer respeito a esta dúvida, mas, antes, ao uso da simulação como estratégia. Vamos por pontos: se a imagem só existe quando vista; se o objetivo do mundo do espetáculo é abarcar o maior número possível de imagens; e se é o fato de ‘estar na imagem’ que assegura o pertencimento a ele, o episódio em questão se situa no plano da simulação como estratégia de visibilidade. Ora, a partir do momento em que se torna irrelevante saber se as imagens resultam de uma ‘pose’ ou de uma ‘captura’ no sentido fotográfico do termo, o que passa a interessar é justamente ‘não’ saber, para que a polêmica prossiga, fazendo com que as imagens permaneçam on line o maior tempo possível em proveito de todos.
Ao analisar a decadência do espaço público, Paul Virilio afirma que a imagem se tornou o único ‘lugar público’ na nossa sociedade, redimensionamento ao qual podemos acrescentar um dado significativo: no Brasil a televisão desenvolveu um dos mais eficazes instrumentos para tornar pública a vida privada – as novelas. Talvez esse perverso achado da TV explique a facilidade com que a imagem enquanto lugar público seja, ao mesmo tempo, entre nós, o próprio lugar da privacidade, numa promiscuidade que contribui para tornar também indiscerníveis, o campo da política e o da intimidade.
No mesmo momento em que as imagens de Cicarelli criavam polêmica, as críticas do Papa Bento XVI às ‘contradições’ do islamismo se tornavam um fenômeno de mídia. Pela estatura de seu autor, pelo peso de suas palavras e pelo seu poder de intervenção no contexto político do Oriente Médio e da geopolítica global, as declarações do Papa não podem ser comparadas aos truques de uma modelo e de seu fotógrafo para aceder ao mundo do espetáculo. Mas os dois gestos aparentemente tão distantes um do outro não se limitam a coincidir no tempo; eles são também moldados segundo a mesma matriz, que envolve, embora com objetivos diferentes, a simulação como estratégia de intervenção.
Por sua própria natureza, o cristianismo está na origem do culto das imagens. O antecessor de Bento XVIII, João Paulo II, foi um hábil manipulador da mídia e soube, como ninguém, pô-la a serviço da conquista de um novo estatuto para a Igreja no mundo globalizado. Seu sucessor é um intelectual, um homem do pensamento (não por acaso suas afirmações agora questionadas faziam parte de uma palestra intitulada ‘Fé, Razão e Universidade’), um guardião da doutrina – um homem do verbo, portanto, que discute seus temas com filósofos como Jügen Habermas.
É por isto que, se não faz sentido especular sobre a origem das imagens da modelo, o fenômeno midiático despertado pelas afirmações do Papa deve ser, por sua vez, examinado. Em primeiro lugar porque o efeito que ele desencadeou no mundo muçulmano se aprofunda e se prolonga justamente na medida em que as explicações dadas pelo Papa não convenceram. Com efeito, as declarações de Bento XVI não parecem derivar de um ‘mal-entendido’, como ele próprio o classificou; ao contrário – e este é o segundo ponto – sua repercussão parece ter sido ‘buscada’ escondendo, portanto, um gesto político digno de atenção.
Um papa não apenas sabe perfeitamente o que diz, o que pode e o que deve dizer, mas tem a medida exata do alcance, ou do ‘poder de fogo’ (para ficar num vocabulário militar) de suas palavras. Por isto, desde que Bento XVI fez seu discurso no dia 12 de setembro na Alemanha, os jornalistas e analistas políticos não páram de especular sobre o que se esconderia ‘por trás’ de suas palavras, na tentativa de decifrar o sentido desse ‘acontecimento’ aparentemente ‘programado’ como uma intervenção nas relações entre o Ocidente e o mundo muçulmano.
Apesar das explicações posteriores dadas por Bento XVI, suas palavras têm sentido nitidamente político. Era de se esperar que suscitassem reação imediata no mundo muçulmano – o que de fato aconteceu – e que trouxessem um novo elemento de perturbação a um cenário político já bastante carregado; por isto é lícito atribuí-las à simulação como estratégia, agora no sentido militar do termo. Evidentemente perto destas declarações, as imagens da modelo na praia só muito indiretamente tocam a política (na medida em que a imagem como lugar público é o lugar da privacidade), podendo ser atribuídas à simulação no seu primeiro sentido.
Podemos dizer, assim, que ao assumir a simulação como estratégia, tanto o gesto do Papa quanto o da modelo acabaram delimitando um novo terreno do exercício político que clama por ser investigado: um terreno no qual a imagem e a palavra podem afirmar o que não é para apostar no que será.
*Stella Senra é doutora em ciências da informação pela Universidade de Paris 2 e autora de O Último Jornalista
(Estação Liberdade)
Namoro na rede
Um vídeo de apenas 4 minutos com cenas quentes do namoro da modelo e apresentadora da MTV Daniela Cicarelli e do executivo do mercado financeiro Tato Malzoni, gravado numa praia da Espanha, foi visto por milhares de internautas e virou o assunto do dia.”
INTERNET
Ethevaldo Siqueira
Boas lições do WiMax no sertão nordestino
“Descobri esta semana um dos casos mais interessantes de inclusão digital do Brasil via tecnologia WiMax. O projeto, ainda em sua fase inicial, leva banda larga, internet e telefone de voz sobre IP (VoIP) a oito pequenas cidades do Rio Grande do Norte, por custos jamais sonhados.
Imagine, leitor, o significado desse salto tecnológico. As cidades que acabam de ser interligadas pela maior rede de WiMax são: Currais Novos, Lagoa Nova, Bodó, Cerro Corá, Tenente Laurentino, São Vicente, Frorânea e Jardim do Seridó. O projeto é de responsabilidade da Voice Global, em parceria com a cooperativa Ascoob e a provedora de acesso Starconect.
A infra-estrutura implantada permite hoje que 500 usuários de telefone móvel IP Wi-Fi se beneficiem dos serviços em localidades onde não há operadoras de celulares. Esses telefones IP sem fio se comportam como se fossem celulares. O usuário anda pelas ruas e faz suas ligações com a tecnologia VoIP, a preços próximos de zero.
Cláudio Carvalho, diretor comercial da Voice Global, esclarece que o acesso é feito via rede Wi-Fi que, por sua vez, se conecta a outras localidades por meio de links WiMax, que funcionam como se fossem cabos virtuais (sem fio) para levar a rede Wi-Fi a distâncias de até 50 quilômetros, numa rede que vai até 300 km. Ninguém acessa uma estrutura WiMax, mas, sim, a rede Wi-Fi, como rede sem fio de banda larga. Essa é a mais freqüente confusão entre WiMax e Wi-Fi.
Carvalho explica: ‘Colocamos alguns números telefônicos de São Paulo em teste no Nordeste, por essa rede WiMax. Você liga daqui de São Paulo para lá, fala com telefone do sertão e só paga o valor de uma ligação local.’
Entre as cidades já conectadas, o custo das ligações pode ser efetivamente zero. As operadoras locais nessas cidades só cobram R$ 8 de assinatura básica, pois os custos operacionais com a telefonia IP são muito baixos. E o investimento inicial não supera os US$ 75 por assinante ou linha, em comparação com mais de US$ 500 da telefonia fixa convencional.
Revendendo minutos de outras operadoras e utilizando VoIP, Cláudio Carvalho comprova que a margem de lucro das grandes operadoras de telefonia fixa pode chegar até 1.000%. ‘O preço de custo por minuto dessas concessionárias é de pouco mais de 1 centavo e elas cobram mais de 15 centavos do usuário.’
Para Gibran Dantas, diretor da Starconect, foi a experiência e a infra-estrutura da Voice Global que possibilitaram a realização de testes e a implementação do projeto. As prefeituras e bibliotecas dessas cidades já estão testando o acesso banda larga em pleno sertão brasileiro, e até cibercafés foram criados.
A próxima etapa do projeto da Voice Global será a implantação da IPTV, ou seja, da televisão com protocolo IP sobre a rede WiMax. Os equipamentos já estão sendo liberados na alfândega e os primeiros testes serão feitos em poucas semanas. Num terminal, haverá as três saídas: para Internet, para o telefone VoIP e para a IPTV.
EXPANSÃO
Outros 92 municípios estão na lista para receber investimentos em redes WiMax. A Voice Global testa agora um software de e-learning que será empregado em programa de capacitação à distância de 200 professores da rede de ensino municipal, com treinamento online, em cooperação com a Universidade de São Paulo e a Associação Brasileira de Educação à Distância (Abed), utilizando a rede WiMax.
A experiência da Voice Global mostra uma alternativa realmente econômica e factível para a universalização da telefonia fixa, via VoIP, bem como para a inclusão digital num país tão vasto e, ao mesmo tempo, de renda per capita tão baixa quanto o Brasil.
Com investimentos e custos operacionais tão baixos, a utilização do WiMax pode assegurar não apenas a economia e rentabilidade de pequenas operadoras locais, quanto levar a telefonia às menores cidades e ao campo. Isto tudo sem considerar o uso do Fundo de Universalização das Telecomunicações (Fust), que, desde 2000, acumulou mais de R$ 4 bilhões, sem qualquer investimento em sua finalidade básica.
A EMPRESA
Fundada em 1999 nos Estados Unidos com o objetivo principal de explorar as novas possibilidades de voz sobre IP, a Voice Global acumula longa experiência na área, não apenas implantando infra-estruturas de telefonia IP para outras empresas, quanto operando essas redes.
No início, recorda Carvalho, havia muita desconfiança e incerteza com relação à VoIP, até por parte da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Do lado das grandes operadoras, a reação era de quase hostilidade à telefonia VoIP.
Diante das dificuldades iniciais para obter a licença como operadora de telefonia IP, a Voice Global montou uma infra-estrutura de telefonia IP e alugou-a a outras pequenas operadoras, durante quatro anos. Hoje, com sua licença de operadora, a Voice Global aposta no futuro da telefonia VoIP e na própria tecnologia WiMax, que, na avaliação de Cláudio Carvalho, é uma das soluções mais econômicas e adequadas à universalização do acesso de alta velocidade à Internet, da telefonia e da televisão IP.”
TELEVISÃO
Keila Jimenez
TV é hábito. Aliás, era
“Diga adeus à fidelidade do telespectador. Há um novo jeito de ver TV, em que você escolhe o que quer ver, a que horas quer ver ou rever. Se perdeu, não tem problema, pode assistir quando quiser. Não estamos falando da tão sonhada TV digital, em que o dono do controle remoto vira uma espécie de programador das atrações. E sim da TV na internet. Em tempos em que um dos campeões de acessos on line é um portal de vídeos, o famoso YouTube, TVs abertas e pagas correm para rechear seus sites com vídeos de séries, jornalismo, gols da rodada, imagens históricas e melhores momentos de seus programas.
É a TV dos sonhos de Silvio Santos – conhecido por sua inquietude com a grade de programação do SBT, alterando horários sem dar satisfação ao público. O novo recurso vai detonando a força que até então move o veículo, a do hábito. Na TV que se vê na internet, hábito não é nada, o verbo da vez é ‘baixar’, quando quiser.
De olho nesse mercado promissor, a MTV armou um esquema especial para a exibição virtual de seu mais importante evento televisivo, o Vídeo Music Brasil (VMB), premiação de videoclipes, que neste ano ocorre na próxima quinta-feira, às 22 horas.
No site do canal, o www.mtv.com.br, o internauta poderá acompanhar o que rola em tempo real nos bastidores do evento, com imagens captadas por seis câmeras espalhadas por camarins, tapete vermelho e atrás do palco – além da transmissão do VMB, é claro. Já no MTV Overdrive, canal em banda larga da TV musical, o espectador poderá baixar quando quiser entrevistas com vencedores da premiação, reportagens sobre o evento, making of dos videoclipes indicados, bastidores da produção, cobertura da festa, entre outras imagens.
A nova tecnologia, que por sinal estreou no início de setembro, reúne pérolas da programação da emissora: episódios das animações Fudêncio e Mega Liga de VJs, cenas dos famosos acústicos do canal, entrevistas, os melhores momentos de programas como Rock Gol, Gordo Freak Show, Hermes e Renato e do Beija Sapo, de Daniella Cicarelli, o líder de acessos do site. Ah, e um acervo gigante de videoclipes, é claro.
‘Mal estreamos e já somos o segundo overdrive mais acessado das MTVs de todo o mundo, perdendo só para a americana. O mais engraçado é que o nosso carro-chefe de acessos são os vídeos ligados aos programas, não os videoclipes, como é em todo o mundo’, conta a diretora de Internet e Móbile da MTV, Sandra Jimenez. ‘Esse é um novo jeito de se ver TV, e cada vez mais vamos criar conteúdos para alimentar essa demanda. O que acontece com os vídeos da programação na internet é que o centro deixa de ser a MTV, como é na TV, para ser a audiência. São eles que escolhem o que querem ver, quando querem ver. O domínio do conteúdo muda de mãos.’
Rapidinha
Para o diretor de Programação da emissora, Zico Góes, é fato que a TV está correndo para não perder o bonde dos espectadores da internet, mas não basta só disponibilizar sua programação on line, diz . ‘Não acho que as pessoas vão deixar de ver TV para assistir a programas na internet. O que está se criando é um novo hábito de ver conteúdo de TV’, fala Góes.
‘Nossa experiência mostra que vídeos longos não fazem muito sucesso na internet, o espectador quer ver coisas mais curtas, editadas, até porque o cara que assiste algo na internet tem pressa e fome de mais informações. Ele não vai sentar lá e ver um programa inteiro de 1 hora como faz na TV’, continua. ‘A internet não substitui o modo de se ver TV, complementa.’
A tese de Zico se mostra real nas iniciativas de outras emissoras.
A Globo, que aposta em vídeos desde 2003 com o lançamento do Globo Media Center (GMC), tem entre os seus campeões de acessos trechos de novelas, edições do Big Brother e os gols da rodada dos campeonatos de futebol. A demanda pelos vídeos obrigou a rede a investir no produto.
O site da emissora (www.globo.com)disponibiliza 500 novos vídeos por dia, mantendo um acervo de 150 mil vídeos disponíveis aos usuários. Diferentemente do site da MTV, nem todos os vídeos do Globo.com são de acesso livre, pois há uma assinatura para o serviço, com 50 mil assinantes exclusivos atualmente.
Os vídeos mais curtinhos, como os de trechos de novelas, são campeões de audiência. Entre eles estão: a primeira cena romântica dos personagens de Cleo Pires e Edson Celulari em América e a pancadaria entre Maria Clara (Malu Mader) e Laura, a cachorra (Cláudia Abreu) em Celebridade. Os sucessos do momento em acessos são a cena de strip-tease de Ellen (Taís Araújo) em Cobras & Lagartos e a estréia de Grazielli Massafera em Páginas da Vida. O site também disponibiliza vídeos de programas da Globosat.
A mais nova aposta da rede nessa direção é o portal de notícias G1 (www.g1.com.br), que estreou na semana passada. Além de notícias escritas, o portal reúne vídeos com o conteúdo do jornalismo da TV Globo e GloboNews. A novidade quer estar em pleno vapor durante a cobertura das eleições.
Na TV paga, o caminho para os vídeos beira a clandestinidade. Apesar de a rede americana ABC e da Disney anunciarem que disponibilizarão na internet (www.abc.go.com) gratuitamente, em 2007, episódios de séries como Lost, Desperate Housewives e Comander in Chief, muita gente já assiste pelo computador a sua série favorita. Os caminhos para baixar os episódios de séries de sucesso como 24 horas, da Fox, passam por sites complexos de instalações de programas como o www. bittorrent.com e o www.legendaz.com.br, usado para legendar os episódios.
Justus demitido
Caminhando em passos mais modestos vêm a Record e a Rede TV!. A Record, que teve a primeira experiência do gênero em 2004, quando liberou o acesso aos vídeos jornalísticos em seu site (www.rederecord.com.br), colhe agora os frutos dessa procura. O interesse pelos vídeos aumentou muito o volume de visitas ao site, o que obrigou a rede a criar uma nova home.
O hit do momento são as demissões de O Aprendiz 3, com mais de 1 milhão de acessos. A cena campeã é a que um candidato, Peter Collins, demite o patrão, Justus. O site do canal chegou a ficar congestionado por causa da demanda.
Em breve, a home da Record disponibilizará vídeos de Eduardo Guedes ensinando suas receitas no Hoje em Dia, trechos da série Monk, e, em dezembro, voltam ao ar os vídeos jornalísticos. Mas quem espera ver cenas de novelas da emissora na internet, pode esquecer. A rede teme que isso atrapalhe a venda de folhetins para o mercado internacional.
Na RedeTV!, o primeiro passo para a transmissão de vídeos on line será dado em novembro. A emissora disponibilizará em seu site (www.redetv.com.br), inicialmente, os programas TV Fama e Leitura Dinâmica. Com o tempo, o canal pretende rechear a home com seu acervo jornalístico. O plano é liberar todo o conteúdo da emissora on line em 2007, criando um arquivo de programação desde 1999, que poderá ser acessado pelo internauta gratuitamente. É a chance de rever o histórico encontro de Silvio e Vesgo com o Silvio Santos original, e a dupla correndo atrás de Cicarelli, e seus seis dedos no quadro Sandálias da Humildade, no Pânico na TV!
Por falar em Cicarelli, ela é quem protagoniza um dos vídeos mais acessados na internet na semana passada. Não, não é nenhum programa de TV e sim a musa em um amasso quente com o namorado, que desbancou vídeos recordistas de acesso do YouTube (www.youtube.com), como o do depoimento polêmico de uma senhora sobre orgasmo exibido em Páginas da Vida e o de cachorrinho fazendo xixi em Ana Maria Braga em pleno Mais Você. Mas a novela da vida real de Cicarelli é outra história”
Leila Reis
Estúdio vira ringue
“Está faltando pouco mais de uma semana para a vida voltar ao normal na TV. Isto quer dizer que a programação deixa de ser entrecortada pelo horário eleitoral obrigatório e os intervalos inflacionados pela propaganda política – que inclui de depoimentos à Páginas da Vida, à vociferação de nanicos ameaçando passar óleo de peroba na cara-de-pau de políticos, relembrando a sua paternidade sobre trens-bala e até cavalgando avestruzes. Isso quer dizer que a novela vai começar mais cedo e o noticiário da noite, mais tarde.
Não deixa de ser um alívio, porque a falta de criatividade na campanha da TV dá a sensação de que o horário eleitoral de 2006 é interminável. E tem uma razão adicional. Os fatos gerados pela disputa eleitoral – denúncias, operações como a sanguessuga, transações envolvendo dossiês caros etc. – esvaziaram a campanha e tornaram o noticiário mais quente.
Essa conjuntura contribuiu para que se acentuasse uma tendência já detectada nas últimas eleições presidenciais: a do jornalismo militante. Já há quatro anos, as emissoras haviam abandonado o papel de retransmissora da campanha que ocorre nas ruas para abraçar a causa de ajudar o eleitor a escolher bem. É dessa atitude que nasceu o movimento que este ano foi batizado como Caravana JN. Nas outras eleições, a reportagem do Jornal Nacional já varreu o País para mostrar os problemas que o novo presidente teria de enfrentar, sem, no entanto, a ajuda de ônibus, barcos e da inspiração poética (meio ginasiana) de Pedro Bial.
Foi lá, naquela época, que âncoras, repórteres e apresentadores dos noticiários da Globo assumiram uma postura mais ofensiva no tratamento da política e dos políticos. Não há dúvidas de que foi um avanço, afinal a Globo vinha de um modelo calcado em cima de uma pretensa imparcialidade. Herança dos tempos da ditadura militar e da hegemonia da emissora nos anos 70/80 (quando detinha 80% da audiência), não importa, o fato é que o jornalismo era acometido por uma passividade irritante.
O problema é que, nesta campanha, houve a radicalização da postura e o que se tem visto é um jornalismo altamente beligerante. E não se trata de ideologia, pois os apresentadores e colunistas de todas faixas (Bom Dia Brasil, Jornal Nacional, Jornal da Globo) têm tratado democraticamente com o mesmo fel candidatos da oposição, situação, de esquerda, de centro e de direita. Não basta tirar informação do entrevistado, deve-se confrontá-lo.
Como que convencidos pelo lugar-comum do momento (de que a política é suja e todos os políticos desonestos), Bonner, Fátima, Renato Machado, Miriam Leitão, Alexandre Garcia, William Waack e outras estrelas do primeiro escalão assumem a tarefa de ‘desmascarar’ os aspirantes ao poder de maneira agressiva, quase desrespeitosa. Geraldo Alckmin, Lula, Heloísa Helena, Christovam Buarque e os outros têm sentido na pele os efeitos desses maus modos. A sensação é de que ao vestir esse pseudoquixotismo, esse jornalismo pensa se alinhar com a vontade do telespectador/eleitor.
Aí pode estar o grande engano da cartilha atual. O efeito pode resultar o contrário do que a emissora tem explicitado em seu discurso: contribuir para que o brasileiro escolha seu melhor representante. A iniciativa de desqualificar os candidatos joga todos na vala comum. Isso reforça a descrença e não a consciência cívica no telespectador.”
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