Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Obama esnobou o jornalismo-chique

O companheiro Obama parece imitar o boxeador Muhammad Ali: voa como uma borboleta e pica como uma abelha. Num lance surpreendente, ele decidiu bispar uma tradicional (e ridícula) cerimônia do andar de cima de Washington, o jantar anual do Gridiron, um clube de jornalistas fundado em 1885. Desde Grover Cleveland (1893-1897), nenhum presidente teve tamanho peito no primeiro ano de seu mandato.


O jantar e o Gridiron Club são um anacronismo de uma cidade obcecada pelo alpinismo social e político. Começando pelo evento: pede-se aos convidados o uso de casaca, o que se diz ali não pode ser passado adiante, mas ali nada se diz de relevante, pois a ideia é juntar pinguins para contar piadas e fazer imitações. (O desempenho de George Bush no ano passado foi parar no YouTube.) O clube tem 65 membros, um número razoável para a época em que foi fundado, jurássico num tempo em que Washington tem 105 pessoas trabalhando na sucursal da TV árabe Al Jazeera. A rede CBS tem 129. Até bem pouco tempo o Gridiron não convidava jornalistas que trabalhavam em rádio ou televisão.


Obama disse que não iria ao jantar porque pretende passar um feriadão escolar com as filhas, em Chicago. Depois viu-se que ele não sairia de Camp David, que fica a 20 minutos de helicóptero da capital. O companheiro que rebarbou a festa chegou à Casa Branca amparado pelo fenômeno dos meios eletrônicos que multiplicaram o alcance de publicações vistas como ‘nanicas’. A revista de esquerda ‘Mother Jones’ tem hoje sete repórteres em Washington, equipe do mesmo tamanho que a da revista ‘Time’. A ‘National Review’, de direita, tem 150 mil exemplares de circulação quinzenal e 1 milhão de acessos diários na internet.


Ausência marcada


O ocaso do jantar do Gridiron assemelha-se ao crepúsculo do circuito das senhoras que comandavam a vida social de Washington, chamadas pelo presidente Ronald Reagan de ‘The Georgetown Ladies’ Social Club’. O tempo levou Katherine Graham, a dona do ‘Washington Post’; a milionária Pamela Harriman, que ajudou a inventar Bill Clinton; e jornalistas como Joseph Alsop. (No noite de sua posse, com a desculpa de que não achava uísque na Casa Branca, John Kennedy apareceu de madrugada na casa de Alsop. É verdade que o anfitrião recebera um plantel de garotas de Las Vegas, escolhidas por Frank Sinatra, mas o convidado ficou até as quatro da manhã na dieta líquida.) O poder desse grupo foi percebido pelo secretário de Estado Henry Kissinger, nos anos 70: ‘As mãos que misturam os martinis em Georgetown guiam o destino do mundo ocidental’.


Desde Richard Nixon todos os presidentes chegam a Washington dizendo que pretendem mudar a forma de fazer política na cidade. Nenhum deles teve êxito, mas Obama mostrou um novo estilo. Antes de bispar o jantar do Gridiron o companheiro associou sua agenda a diversas iniciativas da comunidade negra da capital americana. (Metade dos habitantes do Distrito de Columbia descende de escravos, como Michelle Obama.) O Gridiron recebeu o primeiro sócio negro em 1973. Mulher, só em 1975.


Assim como John Kennedy percebeu a importância da televisão e tirou partido do novo meio, Obama joga seu jogo comunicando-se com o mundo anárquico e socialmente nivelado da internet. Ano que vem talvez ele vá ao jantar do Gridiron, pois já marcou a ausência.