Só se sabe que chega longe, quando se chega lá. E a imprensa futebolística – longe de ser esportiva –, que cobre o dia-a-dia do esporte mais popular do país, passou dos limites. A linha que separa o profissionalismo e o amadorismo apaixonado foi cruzada. Há tempo as discussões dos botecos foram transferidas para os meios de comunicação.
A abordagem, o tom e a postura de muitos jornalistas estão cada vez mais próximos da paixão dos torcedores mais fanáticos e ferrenhos. Ética, postura e informação com credibilidade – que deveriam ser o norte de qualquer profissional que se preze – não são mais a prioridade. Especulações estapafúrdias, falta de apuração e desrespeito para com atletas, técnicos e dirigentes estão se tornando práticas corriqueiras na mídia do futebol. O público não tem mais o direito de avaliar por si a informação que recebe, pois os jornalistas tomaram para si todas as interpretações possíveis dos fatos.
Informar não é relevante
A ética foi chutada para escanteio. É uma triste realidade, mas analisando o quadro atual percebe-se que a imprensa futebolística conseguiu chegar ao extremismo da paixão. A informação não é mais sagrada. Sagrada é a polêmica. Sagrada é a opinião pela opinião. A coletiva de Dunga, realizada terça-feira, foi um bom exemplo. Em um certo momento da sabatina, dois repórteres – que eticamente terão seus nomes preservados – realizaram duas agressivas constatações:
‘Graças a Deus que você não era o técnico da Copa de 58 porque se fosse não convocaria o Pelé’.
‘O Neymar e o Ganso são melhores que oito ou nove jogadores que você convocou’.
Além de relegar a principal razão de uma coletiva, que é o questionamento, ficou evidente que, na primeira constatação, o jornalista não teve o mínimo embaraço de deixar claro o desrespeito para com o técnico e sua trajetória. Afinal, por alguma razão, Dunga é técnico da seleção há três anos. Já na segunda – fora a avaliação pessoal das virtudes e defeitos de cada jogador – ficou escancarada a indiferença com os ‘oito ou nove’ que vão, inevitavelmente, disputar a Copa da África.
Os comentários feitos caberiam em um espaço de opinião, jamais em uma coletiva de um técnico de seleção brasileira – ou de qualquer outra fonte. A falta de ética – evidenciada no tom das indagações – deixou claro que a intenção dos jornalistas não era informar ou questionar, e sim, polemizar e constranger Dunga. O que, de fato, foi feito.
É comum na cultura do jornalismo de futebol sempre clamar pelos que não estão em campo. É do jogo. Mas na coletiva do técnico da seleção não foram só perguntados os porquês desse ou daquele atleta estar no elenco ou fora dele. Perguntar não bastou. E parece que não basta para a imprensa futebolística. Informar não é mais tão relevante. As polêmicas e o tom apaixonado são mais que necessários para abastecer os também apaixonados torcedores. O bom jornalismo que se dane.
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Jornalista, Porto Alegre, RS