O real chega aos 15 anos sobrevalorizado no meio de uma enorme crise internacional, sem ameaça de crise cambial e sem maiores desajustes nos preços. Só isso bastaria para justificar alguma atenção ao aniversário. Dois dos maiores jornais, O Globo e O Estado de S.Paulo, aproveitaram o último domingo de junho para lembrar o plano de estabilização lançado em 1º de julho de 1994.
O Globo dedicou três páginas ao assunto e mais uma a um balanço dos 10 anos das metas de inflação. O Estado limitou o material a uma página, atribuindo menos espaço à história do Plano Real e destacando, na abertura da matéria, a persistência da indexação – tema tratado, coincidentemente, no relatório trimestral de inflação divulgado na sexta-feira (26/6) pelo Banco Central (BC).
Dois pontos acentuados nos dois jornais merecem atenção. Um deles é o desconhecimento da inflação elevada pela nova geração. Quem era criança em 1994 já não tem noção da corrida maluca entre preços e salários. Mas a memória da inflação não se extinguiu completamente. Não será eliminada enquanto se mantiver a indexação.
A advertência aparece, no Globo, numa entrevista do diretor de Política Econômica do BC, Mário Mesquita, e, no Estado, numa declaração do professor Heron do Carmo, da USP, responsável, durante muitos anos, pela elaboração do índice de preços ao consumidor da Fipe, a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas.
Aumento nominal
Extinguir a indexação não é uma tarefa simples. Envolve uma revisão dos contratos de concessão de serviços de utilidade pública e uma renegociação, portanto, com as operadoras. Também será preciso encontrar fórmulas satisfatórias para os novos contratos, com suficiente segurança para as concessionárias e sem o risco de um componente realimentador da inflação.
Já não se fala em aumentos de preços como os de antes do Plano Real. Os surtos ocorridos nos últimos anos 10 anos ou pouco mais têm sido muito menos desastrosos, porque as políticas de estabilização se tornaram muito mais eficientes depois do pacote de reformas dos anos 1990.
Mas os surtos não deixaram de ocorrer e poderiam ter causado problemas sérios, se os controles fossem relaxados. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sabe disso. Sua reeleição se explica em boa parte, como foi indicado pelas pesquisas, à valorização real dos salários.
Nenhum aumento nominal teria produzido essa valorização, se os preços continuassem a subir com vigor. Isso explica por que o presidente, apesar das pressões de muitos companheiros, tem evitado interferir na política monetária. Explica também a permanência de Henrique Meirelles na presidência do BC, desde o começo do primeiro mandato.
À distância
Meirelles tem sido uma peça fundamental da política de Lula. Isso deveria ser suficiente para justificar maior atenção aos projetos pessoais do presidente do BC e ao futuro da política monetária. O Valor saiu na frente, com uma boa matéria sobre o plano de Meirelles de concorrer ao governo de Goiás, em 2010. Segundo a reportagem, ele deverá deixar o governo em março do ano que vem – e isso já foi acertado com o presidente Lula.
A Folha de S.Paulo deu o repique no domingo (28/6), com um bom material sobre os planos de outros diretores de também sair do BC. Deverá haver, portanto, uma ampla mudança no Comitê de Política Monetária, o Copom, responsável pela política de juros e pela realização da política antiinflacionária.
Pelo menos até o dia 28, último domingo de junho, a maioria dos jornais ficou longe do assunto.
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Jornalista