Coisa boba e sem importância? Na Folha de S.Paulo (19/04/2010), em reportagem com o pertinente título ‘Comunicação falha fragiliza legado de papa’, vemos: ‘Em sondagem do instituto Pew, de 2008 para cá saltou de 20% a 44% a parcela de americanos para a qual o papa conduz mal a crise da pedofilia no clero.’ Ora, ao deparar com a última expressão, pensei: a crise da pedofilia se dá pelo fato de a grande imprensa estar dando visibilidade às denúncias de aliciamento de menores por padres, ou será pela pedofilia estar em baixa nos círculos clericais? Bom, numa reportagem onde se dá ênfase às dificuldades comunicativas de Bento 16, talvez fosse mais proveitoso atentar para o suposto exemplo de sua linguagem tecnicamente correta.
O pop-star e o professor? Ainda na reportagem citada acima, e também na entrevista: ‘John Allen Jr.: Pedofilia ofusca virtudes do papa, diz especialista’, vemos uma comparação entre João Paulo II e Bento 16. Enquanto o primeiro havia sido ator e sabia calcular o efeito de sua imagem e declarações, o segundo é um professor, preocupado mais em sua linguagem estar correta, ou homem de gabinete e forjado para escrever livros, esta última em ‘Homem de gabinete, Bento 16 reage com morosidade a ataques‘ também na Folha de S.Paulo. Por ocasião dos cinco anos do pontificado de Bento 16, a Folha de S.Paulo parece querer lustrar imagem deste, jogando o foco dos problemas do Vaticano na sua má comunicação e na imagem ruim do papa. Aulas de artes cênicas e marketing ajudariam?
A difusão do citrato de sildenafila
Adendo: talvez se Bento 16 abrisse mão de sua cerrada cabeleira grisalha, adotando um visual ‘careca’, se livrasse da atribuição de pouco midiático. O pontífice se assemelharia ao personagem Fester Addams, conhecido no Brasil como Tio Chico. Se Wojtila foi ator, Ratzinger poderia bem se parecer com personagem de humor negro, para o bem da Igreja, que teria a cultura pop como aliada, e não rival.
A Igreja vai proteger as crianças! Esta frase foi pronunciada por Bento 16 em sua visita à ilha de Malta, como vimos em ‘Papa Bento XVI chora ao conversar com vítimas de abusos em Malta‘, O Globo (19/04/2010). O entrevistado da Folha, John Allen Jr., afirma que a história de Bento 16 é a melhor que o Vaticano tem para contar no que se refere ao combate à pedofilia. Não é de se duvidar, mas se a proteção da Igreja for semelhante aos exemplos destacados em ‘Igreja transferiu suspeito de abuso ao Brasil‘, também da Folha de S.Paulo, 16/04/2010, é melhor os fiéis continuarem se preocupando. Na reportagem, vemos 30 casos de padres acusados de pedofilia que foram mandados para outros países, dois para o Brasil, um deles para trabalhar com crianças dos caiapós no Pará. Esta é a proteção da Igreja?
‘Eu acredito’, declarou Lawrence Grech, que agora pode dizer à sua filha, depois do encontro de Bento 16 com vítimas de padres pedófilos em Malta, que também foi noticiado em ‘Papa chora em encontro com vítimas de abuso‘, Folha de S.Paulo (19/04/2010). A reunião foi longe da imprensa, mas pelo que as vítimas declararam posteriormente teve grande valor terápico. A julgar por Grech, Bento 16 conseguiu até recuperar um ex-prosélito para a Igreja. Considerando o saldo positivo do encontro, o Vaticano não deveria descartar a hipótese de novas reuniões do papa com mais vítimas, quem sabe em grupos de 10 a 15. Esperemos também que o novamente fiel Lawrence Grech não descuide de sua pequena filha em presença de padres, já que ele conhece na carne as possíveis consequências.
No Brasil, para finalizar, em Arapiraca, o presidente da CPI que investiga casos de pedofilia, senador cantor Magno Malta, pediu a prisão do monsenhor Luiz Marques Barbosa, de 82 anos, conforme noticiado em ‘Sacerdote é preso por pedofilia em Alagoas‘ (O Estado de S. Paulo, 19/04/2010). Com essa idade, talvez o monsenhor não representasse risco para coroinhas incautos, não fosse a grande difusão do citrato de sildenafila, mas é melhor prevenir que remediar.
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Professor de História, Ponta Grossa, PR