‘Do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros:‘O jornalista deve tratar com respeito todas as pessoas mencionadas na informação que divulgar’.
Da Carta de Princípios do O Povo:‘Todo cidadão tem direito a um tratamento leal e imparcial, independentemente da posição do O Povo em relação a ele’.
Que há exagero de colunistas nos jornais – fenômeno agravado com a proliferação dos blogs na internet, com opinião para todos os gostos – ninguém há de negar. Se isso é positivo ou negativo, há controvérsias; de minha parte, acho que ‘tudo o que é demais, passa’. No O Povo mesmo, colunistas contam-se às dezenas, situação repetida em jornais de todo o Brasil, diga-se. Também é necessário que cada periódico, em qualquer rincão desse imenso país, tenha pelo menos alguns colunistas ‘de grife’, isto é, os chancelados pela ‘grande’ imprensa de São Paulo ou Rio de Janeiro; se, de quebra, ele também aparece na tela da Globo dando seus pitacos, melhor – assim, qualquer disparate é candidato a ganhar ares de verdade oficial, com direito a ser repetido nas rodinhas de conversa.
Mas parece que a empáfia de alguns está levando a extremos inaceitáveis o conteúdo (se assim se pode chamar o que escrevem) de algumas colunas. Da opinião banal – e por isso muitas vezes inofensiva – passa-se ao despautério, ao xingamento, à ofensa, ao ultraje gratuito. Vejam o que escreve Arnaldo Jabor em ‘As pérolas pescadas no excremento’ (pág. 11, edição de 14/3): ‘Ando com vontade de vomitar diante de fatos como daquelas vagabundas do MST destruindo 20 anos de pesquisas da Aracruz, com o suíno barbudo do Stédile dizendo que são heroínas, ele, criado pelos bispos ignorantes da Pastoral da Terra (aliás, ninguém vai prender esse cara?)’. E assim prossegue Jabor, distribuindo ‘bosta’ e ‘merda’ pelos parágrafos, recitando lições de moral e arrotando verdades em sua característica verborragia.
Arnaldo Jabor – que se regozija pelo fato de alguns políticos chamados de ‘bolchevistas’ terem sido ‘expulsos’ do governo – deveria saber que desqualificar adversários ou inimigos, nomeando-os como animais considerados ‘impuros’, é prática arraigada nos movimentos esquerdistas, tão condenados por ele. ‘Porcos capitalistas’, ‘gusanos’ (vermes) foram epítetos que comunistas já deram a seus inimigos. A direita truculenta não fica atrás: nos Estados Unidos os imigrantes da América Latina são tratados como ‘cucarachas’ (baratas). Os muçulmanos integristas não deixam por menos: para eles, o ocidente é habitado por súcias de ‘cães infiéis’.
Como se vê, companhias não faltam para esse tipo de linguagem desabrida. Epígonos de Paulo Francis, tais colunistas herdaram do jornalista apenas a virulência, mas não o brilho e muito menos o talento para escrever.
Não existe um pingo de jornalismo nem de compostura neste tipo de comportamento: não devem ser chamadas de ‘vagabundas’ as mulheres pobres do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e nem a milionária proprietária da Daslu, acusada de fraude em importações, formação de quadrilha e falsidade ideológica; é impróprio chamar de ‘suíno’ tanto João Pedro Stédile, líder de um movimento social, quanto Marcos Valério, apontado como coordenador de um esquema ilegal que movimentou milhões de reais entre políticos e empresários. Em se falando de jornalismo, isso vale mesmo se todos eles forem condenados pela Justiça – e por menos que gostemos deles.
Se uma coluna desse tipo aspira ao humorismo, o cômico é incompetente para fazer rir; se for uma crônica, perdeu-se a noção da sutileza, própria desses escritos (enfim, a brutalidade parece contaminar tudo nos tempos de hoje); se for indignação pessoal, o colunista que mande uma carta para seus desafetos, poupando os leitores da escatologia. Agora, se isso for considerado jornalismo, sinceramente, chegou-se ao fundo do poço.
Para ler as colunas
É nas colunas, em grau maior, que se revelam alguns dos pecados do jornalismo: a) falta de verificação (publica-se primeiro e pergunta-se depois); b) o opinionismo substituindo a análise; c) aceitam-se recados cifrados transitando para lá e para cá; d) usa-se o espaço para defender interesses próprios ou de amigos; f) transformam-se em campo fértil de ‘plantações’ (assuntos lançados como balão de ensaio para se colher reações ou para prejudicar propositalmente alguém), entre outros vícios.
Portanto, ao ler uma coluna, pergunte: a quem interessa essa nota? Quem teria dado a informação? O assunto foi apurado ou apenas se reproduziu uma declaração, lavando-se as mãos sobre a veracidade do que é publicado?
Preste atenção: às vezes as colunas publicam uma versão hoje e outra contrária amanhã, sem mais explicações, fica o dito pelo não dito.
Desconfie: quando o colunista tratar de um assunto, mesmo que aparentemente banal, mantendo a fonte ‘em off’, isto é sem revelar quem lhe passou a informação. (Por que a fonte não pode aparecer? Quem pode ter interesse na divulgação do assunto?); se ele freqüentemente cita (normalmente de forma elogiosa) um mesmo personagem, seja político, empresário ou outro integrante do círculo de poder.
Ligue o sinal de alerta: se o colunista tem o hábito pôr apelidos jocosos ou depreciativos naqueles que ele quer desancar; se costuma inventar personagens que funcionem como alterego (jornalista não é ficcionista), ou às vezes, como mão-de-gato de pessoas que preferem ficar na sombra e dos quais o colunista, por motivos nem sempre confessáveis, atua como porta-voz terceirizado.
Verifique se o colunista só se faz de valente com os setores mais frágeis da sociedade ou com políticos caídos em desgraça ou dos quais discorda ideologicamente. (O político, indistintamente, transformou-se em uma espécie de ‘Geni’, na qual todos adoram atirar pedras. Alguns colunistas, para agradar o distinto público, não se pejam em atirar a primeira.)
Obviamente, isso não é um libelo generalizante contra as colunas. Existem as qualificadas, que se submetem ao método jornalístico, preocupam-se em oferecer informações corretas e análises consistentes. Espero estar contribuindo para ajudar a separar umas das outras.’