Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Por que não te acalmas?

Em política, retórica e truculência não são novidades. Ao longo da história e em todos os lugares, são muitos os mestres consagrados. O século 20 está repleto de personagens que usam palavras e gestos para legitimar administrações e intenções. No Brasil, por exemplo, Juscelino Kubistchek andou no primeiro Fusca da Volkswagen. Anos depois, Itamar Franco ressuscitou o velho besouro. Jânio Quadros tinha na vassoura o símbolo e ferramenta de combate à corrupção. Fernando Collor de Mello, então jovem e pretensamente moderno, inaugurou a era das camisetas-slogans, em seus joggings dominicais, que a imprensa transformava em fatos.


No âmbito latino-americano, Fidel Castro nunca abandonou a retórica militar e o uniforme da campanha de Sierra Maestra. Che Guevara levou sua boina e suas frases lírico-militares para o território da mitologia. Podemos localizar exemplos de velhos políticos europeus e também contemporâneos, como Sarkozy e Berlusconi, dentre outros, que atacam verbal e fisicamente imigrantes pobres. Bush atacou retoricamente, durante a invasão do Iraque, as batatas e o vinho franceses, quando a ação da América do Norte foi condenada pela França.


Retórica e ação política, como siamesas, andam sempre juntas. E essas dimensões da política são novidade para os comunicadores empresariais brasileiros, as quais entraram para valer em suas agendas diárias. No contexto politizado em que vivemos, tudo eleva à enésima potência os aspectos éticos e estéticos da comunicação empresarial, a partir de filtros econômicos, étnicos, ideológicos e concorrenciais. Por isso, o comunicador de empresas deve, obrigatoriamente, ter em sua caixa de habilidades, além das técnicas, os saberes relacionais, intelectuais e políticos.


Operação limpeza


Os produtos e executivos das multinacionais brasileiras percebem que não disputam apenas espaço e resultados futebolísticos. Ao chegarem aos destinos lá fora, a briga se dá pelo espaço nas gôndolas de supermercados, onde os produtos brasileiros concorrem com os nacionais, muitas vezes com qualidade e preço melhores. Empresas como Gerdau, Natura, Petrobras, Vale e Votorantim podem, potencialmente e sem aviso prévio, ter de enfrentar, além do espaço no mercado, a retórica e a ação raivosa de personagens que as usam politicamente, para objetivos não identificados, em um primeiro momento, pelo senso comum. Um exemplo recente é um fato que ocorre às vésperas de uma eleição no Equador e envolve a Odebrecht, executora da Usina Hidrelétrica de San Francisco, responsável pela geração de 12% da energia elétrica do país.


O presidente do Equador, Rafael Correa, utiliza em seu arsenal retórico, para justificar sua ação contra a empresa brasileira, expressões como ‘emergência nacional’, ‘mobilização nacional, econômica e militar das Forças Armadas’, ‘confisco de todos os bens, móveis e imóveis’ e a ‘suspensão dos direitos constitucionais de representantes da empresa’. O discurso é bem-vindo entre os que acreditam em medidas fortes e instantâneas para a solução dos problemas dos países pobres, em que falta, não só comida, mas dinheiro para investir em infra-estrutura, um capital produtivo que gera empregos e impostos, mas é arisco às inseguranças políticas e jurídicas, como as criadas por Correa.


A linguagem de Rafael Correa com relação à Construtora Norberto Odebrecht é chave na porta e garantia de assento no panteão dos mitos políticos, contrários aos que vêm de fora – os estrangeiros, quase sempre identificados como exploradores. Uma retórica do persona non grata, que mascara os verdadeiros objetivos. No caso do Equador, a criação de um fato político, gerador de votos para o ideário de Correa, colhe força no senso comum que acredita em atletas das palavras, geralmente desmistificados nos capítulos finais da novela. Em breve, veremos como ele amaciará a investida antes de provocar mais estrago na imagem internacional de seu país e da América de nuestros hermanos.


Para o comunicador empresarial fica a tarefa, ao final da história, de remover os estilhaços das bombas de palavras da imagem e reputação das empresas em que trabalham.

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Jornalista, professor da ECA-USP e diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje)