Como o jornalismo impresso repercutiu a estréia da microssérie A pedra do reino? Qual a contribuição da imprensa e da TV na rejeição do público a modelos narrativos diferenciados? Mais uma vez houve conflito entre opinião, gosto e consumo na cobertura? Todas essas questões vêm a calhar em face do apagão que se abateu sobre a mídia e a inteligentsia brasileira após a estréia da série. Para a Globo, era de se esperar o curto-circuito. Mas fica difícil entender por que a imprensa e os intelectuais não conseguiram (ou não quiseram) problematizar o impacto do novo trabalho de Luiz Fernando Carvalho.
Impacto, é bom lembrar, não é adjetivo. Portanto, não se está falando apenas do sucesso ou fracasso da série, mas do fenômeno em si, de seus desdobramentos e implicações.
No domingo (10/6), dois dias antes da estréia, quase todos os jornalões do país dedicaram páginas e mais páginas para A pedra… Na maioria dos textos, a discussão privilegiava os aspectos estéticos e quase sempre resvalava para o elogio rasgado. Um ou outro crítico mencionou a ‘ruptura do padrão televisivo’, mas o ponto de vista auto-referente apenas alertou para a dificuldade de se encarar o programa. Ninguém se dignou a investigar por que o distinto público teria tanta dificuldade.
Veio a estréia e a rejeição acachapante da audiência fez o ibope despencar para míseros 11 pontos. Os jornalistas ficaram atônitos. Alguns focaram na preocupação da Globo com a perda da liderança, outros resolveram atacar o hermetismo da série, mas ninguém, mais uma vez, pensou em ouvir o público para entender, de fato, as suas motivações.
Vale a pena apurar
É costume jornalístico explicar um fenômeno com base nos ‘pré-conceitos’ do próprio jornalista. Em parte isso acontece por causa da preguiça de ir a campo. Em parte porque se despreza a fonte em benefício das teses do jornal.
Aí, a coisa avança para o terreno da especulação leviana e ninguém consegue entender o que está acontecendo. Algo semelhante se deu em 2006, quando a grande imprensa julgou Lula como acabado para a disputa presidencial. Veio a eleição e, até hoje, nenhum jornal explicou por que o petista recebeu mais de 60 milhões de votos.
Eu tenho uma opinião pessoal sobre A pedra do reino, mas ela só diz respeito a mim. Em tempo: acho Luiz Fernando Carvalho um diretor talentoso. Às vezes, ele se comporta como uma prima donna, mas jamais passa em branco. Detesto cátedra, odeio intelectualóides, não idolatro experimentalistas, mas admiro à beça a pretensão criativa do cara. Acho mais digno pecar pela pretensão do que pela mediocridade.
Mas isso pouco importa. Como produto cultural, A pedra do reino deve ser compreendido – e estudado – a partir da visão da maioria, dos que consomem a obra. Já basta de elucubrações acadêmicas. Eu quero saber o que fez o grande público rejeitar acintosamente a microssérie. Estaria lobotomizado pela estética das novelas? Teria repertório precário? Ou simplesmente não suportou o estilo barroco-fantástico da narrativa? Alguém nos jornais, por favor, tome a iniciativa de apurar. Quando a maior rede de TV do país amarga o terceiro lugar no horário nobre durante toda uma semana, temos à mão um fato que transborda noticiabilidade.
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Relações Públicas, Salvador, BA