Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Privacidade, interesse público e pesquisas

Com o objetivo claro de criar embaraços ao candidato oponente ao projeto político-eleitoral de O Globo, no Rio de Janeiro, em matéria com chamada na 1ª página, o veículo, que se afirma como ‘muito além do papel de um jornal’, divulgou trecho de uma conversa telefônica do deputado Fernando Gabeira com comentários desairosos sobre a vereadora mais votada na cidade.

Ouvir e reproduzir diálogos telefônicos privados é fazer bom jornalismo? Conversas de pessoas públicas, por telefone, no elevador, no restaurante, são sempre de interesse público?

Em resposta a Gabeira, que considerou o ocorrido como uma invasão de privacidade, O Globo afirmou, em mini-editorial, que ‘não é privada a conversa de um homem público sobre temas de interesse da sociedade’. Claro, certamente o jornal jamais vai reconhecer que sua cobertura eleitoral tem sido, desde sempre, facciosa.

O Globo, e outros veículos que também publicaram o comentário, estão profundamente equivocados. Afinal, onde está o interesse público em saber que juízo de valor Gabeira faz de uma vereadora ‘distrital’, que capta os seus votos através de centros sociais? Nenhum, é claro.

Disputa ‘acirrada’

Segundo o Código de Ética do Jornalismo, aprovado pela Federação Nacional dos Jornalistas, é dever do jornalista ‘respeitar o direito à privacidade do cidadão’. Da mesma forma, o Código de Ética do Jornalismo da Sociedade dos Jornalistas Profissionais dos Estados Unidos destaca que é dever do jornalista ‘evitar espionagem ou outros métodos sub-reptícios de coletar informações’.

Este episódio do Globo vem juntar-se a outros, ao longo da campanha, que resultaram em questionamentos de diversos candidatos sobre a imparcialidade do jornal. Inclusive, discute-se hoje, no Rio de Janeiro, a existência de um possível conluio O Globo/Ibope, comparável ao episódio Proconsult, quando da eleição de Leonel Brizola, em 1982.

Contrariamente a outros institutos de pesquisa, o Ibope manteve, até a véspera das eleições, que haveria uma disputa acirrada entre o senador Marcelo Crivella e o deputado Fernando Gabeira quanto a quem iria para o 2º turno. Contratada e divulgada amplamente pelos veículos de comunicação das Organizações Globo.

A famosa margem de erro

Como até as pedras portuguesas da Avenida Atlântica sabem, a elevada rejeição de Crivella o tornaria o adversário ideal para o candidato do Globo. Pela pesquisa no dia 4/10, Crivella teria 21% e Gabeira, 19%; mesmo na boca-de-urna, o Ibope apurou 23% para Gabeira e 20% para Crivella. O resultado das urnas, no entanto, desmentiu inteiramente as pesquisas feitas pelo Ibope, com Gabeira obtendo 25,61%, e Crivella apenas 19,06%.

Naturalmente, logo o Ibope tratou de alardear um pretenso elevado percentual de acertos, inclusive quanto às eleições no Rio de Janeiro. Os erros, denunciados por diversos candidatos ao longo da campanha, segundo o Instituto estavam dentro da famosa margem de erro.

Pelo visto, O Globo e o Ibope vão muito além do papel de um jornal e de um instituto de pesquisa.

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Jornalista