Para defender o governo Serra, a Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo não se limitam a selecionar pautas e fatos noticiosos. Até mesmo o espaço dos editoriais foi invadido pela lógica de defender o governo paulista.
Os professores paulistas da rede básica pública de ensino ganharam, no domingo (14/6), elogios em um editorial do jornal O Estado de S.Paulo, fato extremamente raro. Mas o que eles fizeram para receber tais elogios? Resolveram não atender à convocação do sindicato da categoria, a Apeoesp, e não aderir à greve proposta pela entidade agora, às vésperas do encerramento do semestre letivo.
Além de elogiar a atitude da categoria, sobrou para a direção do sindicato: ‘Como sempre agindo sem pensar nos alunos, a entidade propôs paralisar as atividades escolares no final do semestre letivo, em pleno período de provas.’
Como fiel escudeiro da administração estadual, o jornal vê na ação do sindicato uma tentativa de se contrapor ás melhoras do setor que ainda estão por vir. É inacreditável, mas é verdade. Veja o que diz o editorial do Estadão [grifos meus, aqui e adiante]:
‘Desta vez, a greve seria uma forma de protesto contra as reformas que o secretário de Educação de São Paulo, Paulo Renato Souza, pretende realizar para melhorar a qualidade do ensino da rede estadual…’
‘Tentar criar fatos políticos’
O melhor ficou mesmo para o final. O Estadão enxerga na greve que não houve uma tentativa desestabilizar o governo Serra, já que ele acaba de se tornar um dos aspirantes à sucessão presidencial, o que comunga com as últimas declarações do governador:
‘O outro motivo que levou a Apeoesp a se opor aos planos de reforma do magistério público é de caráter inequivocamente político-partidário. A entidade, que é conhecida por sua vinculação com o PT, opõe-se sistematicamente às políticas educacionais implementadas nas três gestões de governadores eleitos pelo PSDB – Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra. Muitas greves foram deflagradas pela Apeoesp em tempo de campanha eleitoral, com o objetivo de criar dificuldades para candidatos `tucanos´ à Prefeitura e ao governo estadual.
… Recentemente, desde que o governador José Serra passou a ser um dos aspirantes do PSDB à sucessão do presidente Lula, no pleito de 2010, a Apeoesp passou a criticá-lo e a tentar criar fatos políticos que o prejudiquem eleitoralmente.’
Uma competição acirrada
Mas justiça seja feita: o Estadão não inova em tratar das greves dos professores em seus editoriais. A Folha de S.Paulo já faz isso há tempos, tendo como pauta o combate direto aos professores da rede básica de ensino paulista.
A agressividade com que a Folha trata os professores e defende o governo Serra já levou até mesmo o atual ombudsman, o brando Carlos Eduardo Lins da Silva, a criticar o jornal, em sua coluna, com o sugestivo título de ‘Aos mestres, sem carinho’, do dia 6 de julho de 2008, e a registrar o seguinte:
‘A Folha tem tratado os professores do ensino público que ficaram em greve em São Paulo por três semanas sem nenhuma boa vontade. Posicionou-se em editorial contra a paralisação, publicou colunas agressivas contra eles e, no noticiário, tratou do assunto mais como empecilho adicional e desnecessário ao caótico trânsito da cidade do que como problema sério de políticas públicas’.
A reação do ombudsman, tão incomum ao seu estilo, foi provocada por alguns primores dos editorialistas da Folha, que vale a pena ser destacados:
‘…a Apeoesp (sindicato dos professores) não hesita em prejudicar os alunos com uma nova greve, como a declarada na sexta-feira. ..’
Os grevistas pretextam mais uma vez defender as condições de trabalho e a qualidade do ensino. Na prática, usam o estorvo impingido aos pais e estudantes como ferramenta de pressão sobre o governo do Estado para alcançar metas corporativistas estreitas.’
Como se vê, a competição entre quem protege mais José Serra é acirrada. Se já é difícil ser professor no Brasil, por certo é muito pior em São Paulo.
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Professor, São Paulo, SP