O hábito de escrever revela a necessidade do autor de dar a sua contribuição à comunidade, pondo à disposição dos demais suas experiências e pensamentos, sugerindo considerações críticas sobre os fatos ou propondo ações pertinentes. Quer sejam composições profissionais ou redações espontâneas, todas elas têm essa mesma raiz.
Aqueles que querem se manifestar por escrito sempre encontram um caminho até o seu público. Quando eu tinha 14 anos (em 1943), alguns colegas de estudo e eu resolvemos editar os nossos trabalhos de classe e criamos uma publicação interna do Ginásio Anchieta, de Pederneiras, SP. Chamava-se O Anchieta. Era datilografado por nós e rodado num mimeógrafo. Depois disso, colaborei com jornais do interior, das cidades onde morei e das mais próximas. Os artigos eram manuscritos ou datilografados, e entregues aos jornais pessoalmente ou pelo correio. Seus redatores tinham o costume de ler o original ‘penteando’ o texto, isto é, fazendo pequenas correções ou alterando a pontuação sem necessidade. Eu não gostava disso, mas só podia ver as modificações quando lia o jornal. Só em Lençóis Paulista, o tipógrafo que fazia a chapa para imprimir, compondo tipo por tipo manualmente, apresentava uma ‘prova’ para o autor corrigir, antes de rodar o jornal, O Eco.
Quando fui para o Rio de Janeiro, em 1960, parei um pouco com as crônicas e comecei a escrever sobre contabilidade e administração. Sabia que a literatura da minha profissão era maçante. Ninguém compra um livro de contabilidade para leitura, senão para consultar eventualmente pontos de seu interesse. O mesmo se poderia dizer sobre os livros de criminologia. Só os estudantes da matéria os compram e digerem por obrigação de seus cursos.
Verdadeiras revoluções interiores
Contudo, ao ler um conto policial, nos distraímos e concentramos no enredo, curiosos de ver como o detetive decifra os mistérios do crime. É como receber uma aula do próprio Sherlock Holmes prazerosamente. Então pensei: por que não podemos fazer o mesmo com contabilidade e administração? Redigir textos úteis, sem pretensões técnicas ou didáticas, de fácil leitura, pondo os assuntos de forma um pouco mais atraente e tolerável ao leitor? Fiz alguns ensaios desse tipo: artigos como, por exemplo, ‘Olhos para não ver’ e ‘Cara & Coroa’, publicados no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte.
Aliás, quaisquer considerações decorrentes da experiência ou da inspiração servem para escrever. Os temas profissionais, situações de ensino ou trabalho, permitem repassar aos outros as coisas que aprendemos. Todos os escritos destinam-se a tornar úteis aos demais as nossas idéias, se houver interesse, ou a propor o indispensável debate que fortalece e aperfeiçoa o conhecimento. Ainda quando destinados apenas a entretenimento, eles podem ter alguma relevância.
Humoristas e autores que utilizam o senso de humor, a poesia e as crônicas, constituem a fina flor da comunicação escrita, falada ou dramatizada porque atingem, através da emoção, os recantos mais escondidos da mente e da consciência, produzindo verdadeiras revoluções interiores em cada um de nós. Infelizmente, não sei fazer essas coisas, que tanto admiro.
Vantagens da informática
Com o advento da internet, os jornais passaram a rejeitar trabalhos manuscritos ou datilografados, que teriam que digitar. Passaram a exigir a remessa dos originais por correio eletrônico. Além de trazer a vantagem do computador sobre a velha máquina de escrever, o sistema ainda reduziu quase totalmente a interferência dos jornalistas nas composições. Como há, agora, ainda mais colaboradores escrevendo, eles não têm tempo para ‘pentear’ os artigos. Acabaram as surpresas do autor ao ler o texto impresso! Vieram também os jornais eletrônicos, mais cômodos, embora eu prefira os de papel.
Outra vantagem da informática é a facilidade com que podemos guardar cópias dos trabalhos escritos. Basta abrir uma ‘pasta’ nova no computador e ir juntando nela tudo o que escrevemos. Antes, era necessário colecionar os recortes dos jornais, colocando-os em algum lugar acessível, como uma gaveta, por exemplo. Como o passar do tempo, eles se estragavam ou se perdiam, exigindo certo trabalho de conservação dos arquivos para o qual não tenho nenhuma inclinação.
Diz-se, acertadamente, que três mudanças correspondem a um incêndio! Ora, imaginem o que pode restar depois de cinco mudanças…
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Contador e administrador aposentado, Valinhos, SP