Wednesday, 25 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Quadrinhos com temas muçulmanos censurados

Em sua coluna de domingo [16/9/07], a ombudsman do Washington Post, Deborah Howell, responde a uma questão que intrigou muitos leitores: por que os quadrinhos ‘Opus’ (que tem como principal personagem um pingüim), com temas muçulmanos, não apareceram nas edições impressas do dia 26/8 e 2/9? Os desenhos, criados por Berkeley Breathed, chegaram a ser divulgados no sítio do diário e em outros jornais.

A maior parte das reclamações recebidas por Deborah era referente à edição do dia 26/8. O quadrinho mostrava o pingüim Opus com outra personagem, Lola Granola, usando uma burca e declarando que se tornou muçulmana radical. Seu namorado, o pingüim superpatriota Steve Dallas, fica horrorizado.

Evitando ofensas – e problemas

O editor-executivo Leonard Downie decidiu não publicar a tira na edição impressa porque achou que a representação de uma mulher usando burca poderia ser ofensiva. Ele pediu a opinião de outros editores; um deles chegou a falar com um membro da equipe que é muçulmano, e todos concluíram que o quadrinho poderia ser ‘problemático’.

Não foi o primeiro cartum a ser ‘eliminado’ do Post. A tira ‘The Boondocks’, com um personagem negro, deixou de ser impressa diversas vezes. Um outro desenho, ‘B.C’ considerado anti-semita, também não é mais publicado. ‘Mantemos fora do jornal o que achamos inapropriado’, diz Downie. Cerca de 100 leitores não concordaram com o editor-executivo e acusaram o Post de ter medo dos muçulmanos.

A tira anterior à de 2/9 mostrava Steve convidando Lola Granola para ir à praia de biquíni. Ela, na tira que não foi publicada, veste um ‘burquini’. Trata-se de uma roupa de banho adequada às normas do Islã, desenhada e vendida por Ahiida Ltd., uma empresa de Sidney. A proprietária da loja, a estilista Aheda Zanetti, disse ter amado os quadrinhos. Como seu sítio foi divulgado, ela recebeu diversos e-mails com críticas ao ‘burquini’. Os motivos que fizeram com que a tira não fosse publicada são obscuros. Na opinião de Downie, não haveria motivos para não publicar o quadrinho. Já outros editores consideraram que o leitor que não viu a tira anterior poderia não entender o desenho.

Politicamente correto

Ibrahim Hooper, porta-voz do Conselho de Relações Americanas e Islâmicas, grupo de defesa de direitos civis, não considerou os quadrinhos ofensivos a muçulmanos ou ao Islã. ‘Vejo coisas piores todos os dias na rede’, disse. Akbar Ahmed, presidente de estudos islâmicos da Universidade Americana, concorda. Segundo ele, há uma forte tradição muçulmana de sátira e autodepreciação. ‘Acho que há um perigo de nos tornarmos tão politicamente corretos que terminamos por censurar o trabalho de cartunistas. Os muçulmanos deveriam ser sensíveis ao fato de que, na cultura ocidental, há a tradição saudável de não levar as coisas tão a sério’, opina. Para Deborah, os editores exageraram ao optar por não publicar as tiras. ‘Quadrinhos devem ser divertidos e polêmicos’, conclui.