Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Qual o sentido da crítica?

‘É difícil conseguir que uma pessoa compreenda alguma coisa quando o salário dela depende de não compreender isso.’ (Upton Sinclair)

Geralmente, adotar uma postura crítica custa caro a quem se propõe a esta prática, pois muitos não assimilam nem aceitam ser questionados e promovem aos que criticam ações que vão desde ameaça até o cerceamento da palavra, como ocorre no rádio e em vários meios de comunicação de nosso país. Desse modo, exercer a crítica torna-se perigoso em todos os sentidos, com consequências graves para a vida pessoal e profissional. Falar é perigoso e falar contra qualquer tipo de problema neste país é um processo de perdas que serão graves e difíceis de serem recuperadas.

Nas experiências que tivemos em meio à luta e ao sentido crítico-reflexivo que nos passam em nossas formações, temos visto que é duro adotar a postura crítica, pois os que são criticados geralmente são aliados do poder e têm nas mãos todo o tipo de força para calar a voz dos que ousam pensar diferente. A situação hoje não é mais de tortura física nem ameaça de exílio, mas ousar pode custar perdas no ambiente de trabalho, dificuldade de ascensão profissional e, sobretudo, críticas, pilhérias e ridicularização de seus pensamentos e posturas.

Desse modo, chegam até nós perguntas como: ‘O que tu ganhas com isso? Por que és tão brigão ? De que adianta, se a vida é assim mesmo? Pensas que vais mudar o mundo?’ Nesse sentido, criticar, discutir e debater chega até a cada cidadão que pensa e que tem a força da indignação e do questionar ativa e forte e acaba destruindo sonhos, ideias e pensamentos.

‘Manda quem pode, obedece quem tem juízo’

A atitude crítica que nos é cobrada na escola é simplesmente rechaçada em todos os ambientes onde o poder e o dinheiro são a mola-mestra do processo de relações que hoje permeia nossa vida e nosso mundo. A crítica não é bem vinda, porém este tipo de atitude é antidemocrática e descabida, pois como podemos melhorar se não aceitamos nenhum tipo de questionamento a nossas posturas e possíveis deficiências?

Trazendo estas reflexões para os meios de comunicação, temos visto que cada vez mais se aprofunda a ideia de que lutar vale pouco a pena, pois poucos aceitam um pensamento destoante da mediocridade e passividade que reina em mundo dominado por interesses e jogos de conveniências que permeiam nossas relações. Vivemos infelizmente um mundo onde a comunicação não existe para o povo, pois maioria dos nossos meios de comunicação é dominada por políticos e religiosos que fazem destes meios instrumentos de perpetuação de seus interesses e visões não permitindo outro modo de pensar e agir.

Recentemente, em Fortaleza, a atual prefeita disse que estava em greve com um jornal de grande circulação na cidade. Bastou isso para nesse mesmo jornal serem diminuídas as críticas à administração da cidade, o que prova o velho ditado ‘manda quem pode, obedece quem tem juízo’. E a vida é assim: os que têm o sentido da crítica aguçado não têm direito a opinar, a questionar, a criticar, pois como diz a música, ‘tá tudo dominado’, e não é por acaso que temos coligações com número intermináveis de partidos apoiadores e um Poder Legislativo que diz amém aos que estão no poder e camaleonicamente mudarão quando um outro grupo estiver lá. Não foi por acaso que neste jornal os artigos que criticavam a administração da cidade foram cerceados pelo núcleo de opinião do jornal.

Mudança ainda é difícil

Criticar é nesse caso um exercício de terapia ocupacional, pois quem critica geralmente é um desocupado que passa o tempo todo maldizendo da vida e falando mal de todo mundo. Claro que estas afirmações são ditas pelos que estão no poder e não têm o poder da humildade de reconhecer seus erros e tentar consertar.

Hoje em dia, quase todas empresas têm ouvidores, que seriam pessoas responsáveis em acolher as reclamações do usuários e propor uma solução. A prática tem demonstrado que isso não funciona, pois a maioria dos ouvidores não tem poder algum de mudança ou de transformação da política da empresa. Ainda predomina na maioria das empresas o poder de quem paga e a submissão de quem é pago. Infelizmente, estes setores são apenas muro de lamentações sem sentido algum ou serventia alguma.

Nossos meios de comunicação jamais irão mudar se nosso povo não mudar, se não aprender a dizer o que pensa, se boicotar revistas, jornais, emissoras de rádio e televisão que não estejam de acordo com o interesse popular. Mas a mudança ainda é difícil com um povo repleto de incultura e completamente dominado pela chamada luta pelo pão nosso de cada dia. Aos que criticam, resta apenas serem alcunhados de revoltados, rebeldes sem causa e resmungões, pois nada vai mudar. Aposto que nenhum comentário será feito a este artigo, pois ninguém quer criticar, ninguém quer mudar e dormiremos sempre em berço esplêndido…

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Vice-presidente da Associação de Ouvintes de Rádio do Ceará, Fortaleza, CE