Sunday, 17 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Quando a morte vende mais que cerveja…

A imprensa está há semanas falando sobre o mesmo tema. Michael Jackson. Não que queira ser mais um dos chatos a dizer que estamos dando muita atenção a este excêntrico ex-milionário falido e falecido, mas algumas outras coisas mereceriam ser comentadas também.

Honestamente, acredito que uma das informações mais importantes dos últimos anos não teve grande repercussão na mídia. Um feito que pode indicar a mudança político-econômica mais importante do mundo, desde a saída de Fidel Castro do comando de Cuba. Um comercial de cerveja.

Antes de começarem a desconfiar da minha inclinação etílica, devo afirmar que esse evento aparentemente irrelevante pode mudar o mundo muito mais que o velório/show do maior astro pop da história. Explico. A referida cerveja do comercial não continha nenhuma supermodelo semi-nua. Gisele Bündchen não era a garota propaganda e Juliana Paes, infelizmente, não fazia parte da peça publicitária. A peça era de péssima qualidade visual, possuía uma musiqueta irritante de fundo e um texto extremamente ‘duro’ para os nossos moldes. Não possuía bichinhos, jingles espetaculares, nada. O produto não será nenhum best seller, o preço não é tão acessível, a praça é restrita. Em suma, em termos de marketing, não atende aos 5 Ps. Mas o que tem de tão especial essa peça publicitária, então? E por que a imprensa deveria se importar com isso?

Esse, senhores e senhoras, foi o primeiro comercial de TV de uma cerveja norte-coreana. Um primeiro sinal capitalista em um dos países comunistas mais fechados do mundo. Um avanço na economia do país armamentista que mais assusta o mundo e, quem sabe, o início da sua abertura para o mercado mundial.

‘O orgulho de Pyongyang’

O comercial foi captado por uma TV da Coreia do Sul. Veiculado em uma das TVs estatais norte-coreanas, possuía quase três minutos de duração. Muito, para os nossos moldes, mas para um país onde tudo é controlado pelo governo, nada que influenciasse muito na programação. Aliás, anúncios como esses, sempre foram proibidos pelo governo do ‘homem de cabelos engraçados’.

A República Popular Democrática da Coreia faz fronteira a norte com a China e com a Rússia. Esses dois vizinhos, ex-comunistas, fazem parte do atual BRIC, sigla que designa o grupo dos quatro países emergentes do mundo, juntamente com o Brasil e a Índia. Talvez essa influência dos vizinhos maiores tenha ajudado nesse início do processo de abertura ao mercado capitalista. Será que finalmente o presidente da Comissão Nacional de Defesa e secretário-geral do Partido dos Trabalhadores da Coreia do Norte, Kim Jong-il, está mudando suas convicções ideológicas? Ou será somente mais uma jogada de marketing para exibir o seu país como manchete mundial, de forma gratuita, dessa vez sem mísseis?

De qualquer forma, não conseguiu seu intento. Escolheu a data errada para tentar ganhar publicidade grátis. Esse fato, que deveria significar algo para a comunidade mundial, foi ofuscado (assim como o casamento de Alexandre Pato [sic]) pelas infindáveis homenagens a Michael Jackson, que possivelmente nem tocava muito nas rádios norte-coreanas. Faltou espaço nos meios de comunicação para qualquer outro assunto, senão o circo armado pelos familiares do cantor e os sempre a postos espertalhões de plantão.

‘Taedong River Beer é o orgulho de Pyongyang’, mas Michael era o orgulho de milhões de fãs por todo o mundo. O comercial de cerveja da Coreia do Norte, que acredito ser uma das mais importantes demonstrações de mudanças no cenário político-econômico mundial dos últimos anos, não teve como competir com a força capitalista dos EUA, que usa e abusa do marketing há anos, com muita competência. Lá, até velório de artista vende mais que cerveja. Nessa guerra, a Coreia do Norte perdeu. E feio.

Os mísseis, caro Kim Jong-il, ainda são o produto mais conhecido da sua República Democrática.

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Estudante de Propaganda e Marketing da Faculdade 2 de Julho, Salvador, BA