Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Quando o moço da TV mandar

Na questão da nacionalização de recursos naturais na Bolívia, a imprensa brasileira de grande circulação quer fazer acreditar que o cidadão comum não se importa em ser enganado a nível nacional, mas não suporta quando a ‘injustiça’ vem de fora. Um telejornal sentencia na noite desta quarta-feira (2/5): ‘Foi bom para Evo Morales, mas para os brasileiros…’ Além da interpretação medíocre e patética acerca do cenário político e social boliviano, há uma questão de fundo – nacional – que deveria nos preocupar mais seriamente.

Quando o mercado internacional se mostra ‘nervoso’ – tal como um brutamontes descontrolado –, a Petrobras volta e meia aumenta o preço do produto final, o que atinge principalmente cidadãos e empresas brasileiras de médio e pequeno porte.

Quando o mercado internacional está tranqüilo e a Petrobrás vai bem, anunciando um lucro de causar inveja a grandes petrolíferas pelo mundo afora, este ganho não é repassado. Talvez tenha a ver com a composição acionária da ‘estatal’ brasileira – onde a administração é majoritariamente estatal, mas não os lucros.

Pensamento, mobilização

Mas por que, então, a imprensa brasileira raramente pressiona o governo a baixar o preço da gasolina? Pela influência dos credores na sociedade ‘midiatizada’ (herança da indústria das relações públicas norte-americanas do início do século 20), é certo, mas não só por isso. Tem também a ver com a forma como nos organizamos hoje em dia – basicamente em torno do dinheiro e tão somente dele.

É simples: a notícia sobre o ‘nervosismo’ do mercado internacional não surge por causa do mercado internacional, necessariamente. É mais pelo fato de o preço aumentar. Não se fala da estrutura, e sim dos centavos a menos, multiplicado por milhões de brasileiros. Chamam isso de ‘fiscalização do poder’. O mercado internacional tranqüilo não é, portanto, notícia. Nenhum preço é alterado no andar debaixo, pelo menos não aos olhos do cidadão ‘Homer’, aquele do Jornal Nacional.

O motor de uma sociedade com forte identidade política e organizada na base é o pensamento, a crítica, a mobilização. Em um país onde o maior impulsionador de grande parte da população é o dinheiro – com destaque para aqueles que mobilizam mais dinheiro, ou seja, a elite financeira e parte da classe média –, não dá muito para pensar alto. Há risco de ser chamado de ‘utópico’ ou ‘esquerdista’. Resta, então, ficar indignado quando o moço da TV mandar.

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Jornalista