Gosto do primeiro sábado do mês. É quando escrevo este artigo para o Correio Braziliense, reencontrando leitores e interlocutores, comentando ora os temas da agenda social, ora o meu tema preferido: as comunicações no contexto planetário e a situação delas no Brasil. Abordo hoje dois aspectos: os dois anos de implantação da TV Pública e a Conferência Nacional de Comunicação, que acontece entre os dias 14 e 17 próximos. A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) foi criada em outubro de 2007 e, logo depois, em 2 de dezembro, entrava no ar a TV Brasil, a nossa TV Pública que devia ter sido criada há 50 anos, como as da Europa. Mas preferimos copiar os EUA e nossa televisão já nasceu comercial e reinou sozinha pelas décadas seguintes. Claro que a TV comercial tem sido exitosa no Brasil, dentro de sua natureza. Mas a seu lado deve existir a TV Publica, da sociedade e não do governo, para oferecer o que a lógica programação-audiência-publicidade-lucro não permite à TV comercial. É isso que vem fazendo a TV Brasil. E quem assiste, gosta, constatou pesquisa do Instituto Datafolha: 80% dos que assistem aprovam a programação. Quem não assiste, joga pedras. Falemos dos portadores de deficiências – sensorial, física ou intelectual. São quase 20 milhões de brasileiros. Na TV Brasil temos o Jornal Visual, um noticiário exclusivo para os que não ouvem. Temos o Programa Especial, que discute com os próprios deficientes, famílias e especialistas as formas de convívio, as novidades médicas e o enfrentamento do preconceito. Temos o Assim Vivemos, belíssimos documentários sobre experiências de superação. O tema aparece em outros programas. Há alguns dias Papo de Mãe – programa em que Mariana Kotscho e Renata Manreza tratam da criação de filhos – discutiu com profundidade e propriedade o tema da síndrome de Down. Ainda estão chegando e-mails de pais agradecidos. O Brasil é mais Vamos a outros temas. Só na TV Brasil há um programa semanal de musica erudita. Um elitismo? Seria, se não houvesse na mesma grade uma vasta oferta de programas musicais, valorizando todos os gêneros populares. Samba na Gamboa, com Diogo Nogueira, é um sucesso que tem atraído os mais jovens, distanciados do gênero musical que melhor expressa nossa síntese cultural. Temos ainda o Segue o Som, a Bossa Sempre Nova, o Clube do Choro, gravado em Brasília, o Som na Rural, feito no Nordeste, entre outros títulos. Em todo o mundo, a TV Pública define como sua missão contribuir para a formação do cidadão. Mas o cidadão começa a ser formado na infância. Por isso a TV Brasil oferece seis horas diárias de programação infantil da melhor qualidade. Alguns programas internacionais (sim, valorizamos o nacional sem ignorar o que há de bom lá fora), que só passam na TV por assinatura, são oferecidas aos sem-cabo na TV Pública. Poko e Sua Turma e Barney, por exemplo. Mas há brasilidade também: O Menino Maluquinho e A Turma do Pererê, produções próprias, o Castelo Rá-Tim-Bum ou Vila Sésamo, da TV Cultura. Jornalismo todas as TVs oferecem, dizem os críticos. Onde está a diferença na TV Pública? Primeiro, pela inclusão, na pauta, de temas que não frequentam a agenda ditada pela mídia comercial. Depois, pela oferta de notícias em todos os estados do Brasil, enviadas pelas emissoras educativas e universitárias associadas. O Brasil não se resume aos escândalos políticos, às decisões político-governamentais de Brasília, ao noticiário econômico que emana sobretudo de São Paulo ou da indústria cultural que tem o Rio como capital. Os canais públicos devem expressar o Brasil vasto em profundo, no jornalismo e na programação cultural/educativa. Eu daria outros exemplos, mas o espaço do artigo acabou. A revolução chegou No dia 2/12, evocando os dois anos da TV Brasil, a EBC realizou seminário para dialogar com a sociedade sobre esses dois anos de implantação. Além da participação presencial, bastante representativa, foi grande a participação pela internet, a partir de outros estados. Críticos, apoiadores e mesmo curiosos puderam discutir a implantação do sistema público de comunicação (rádio, TV e web). Não há mistério. Ele é atributo das democracias e, por isso, foi previsto pelos constituintes de 1988. Críticos muito duros foram convidados e aparecer, surpresos pelo convite. Isso é novo, exige maturidade. Por fim, a conferência. O mundo, por várias razões, entre elas a revolução nas comunicações, não é o mesmo em que nascemos. Não é sequer o de 10 anos atrás. A regulação do sistema brasileiro de comunicações foi superada por essa revolução. Precisa ser passada a limpo pela Confecom, que começa no dia 14. Demonizá-la, como fazem alguns, é compactuar com a situação atual, divorciada da nova realidade.
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Presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC)