Há séculos, o sentido político é deteriorado. O resultado é desastroso, nós. Diferentemente do ser político grego, virado para o outro e de frente consigo, nós disfarçamos o olhar para o umbigo e colocamos estrategicamente as mãos nos bolsos (de quem?). Vocês precisam de mim!
Tudo isso pode ser explicado numa só palavra, alienação. A maioria não sabe dizer o que faz um deputado, governador ou presidente. É a falta que nos faz? Não sei, mas entendo que ser político no Brasil virou profissão e que muitos sabem o quanto ganha um parlamentar. Antigamente, todos queriam ser médicos, advogados ou engenheiros quando crescessem. Hoje, o desejo maior é o de ser jogador de futebol e, para os pernas-de-pau, o Planalto. Meu filho, quando crescer, vai ser deputado! E ele é bom de administração? Não, que é isso! Ele é bom é de matemática.
A desmoralização é tamanha que fica claro já nas campanhas que respeitar o outro não faz parte de nenhum plano de governo. Carros de som em pleno engarrafamento, bandeiras tremuladas por mãos femininas (mulheres vestidas até o pescoço) ao meio-dia numa avenida movimentada, caixas de luz onde o marcador se esconde por trás de adesivos com imagens de candidatos e por fim alguns milhares de eu sei o que fazer.
O cumprimento do que for dito em campanha
Essa sentença é o extrato do vazio deixado pelo fim da coletividade. A afirmação do individuo como potência destitui tudo aquilo que acreditamos defender o primeiro pensamento e abre espaço para piadas de mau gosto, como a de um comediante candidato com o slogan ‘Vote em Tiririca, pior que está num fica’. O que me preocupa não é a candidatura – até por que faz parte do exercício democrático –, mas a possibilidade de ser eleito.
‘(…) Sem nos afastarmos do senso comum, é oportuno suspender o julgamento que poderíamos fazer de uma tal situação e desconfiar de nossos preconceitos até que, de balança na mão, se tenha examinado se há mais virtudes do que vícios entre os homens civilizados; ou se suas virtudes são mais proveitosas do que funestos seus vícios, ou se o progresso de seus conhecimentos constitui compensação suficiente dos males que se causam mutuamente à medida que se instruem sobre o bem que deveriam dispensar-se; ou se não estariam, na melhor das hipóteses, numa situação mais feliz não tendo nem mal a temer nem bem a esperar de ninguém, ao invés de ter-se submetido a uma dependência universal e obrigar-se a receber tudo daqueles que nada se obrigam a lhes dar’ (Rousseau).
É preciso mudar duas coisas para termos certeza de que os que querem estar lá realmente desejam trabalhar. Obrigar por lei que os servidores públicos utilizem somente o serviço público e cobrar o cumprimento sob pena de inelegibilidade do que for dito em campanha. Assim, vamos negar-lhes a possibilidade de ter alguma piada devidamente devolvida durante a campanha, como é hoje. Que tal?
******
Jornalista