Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Quem tem o controle

A questão do jornalismo neutro chega à área esportiva da profissão e deixa os espectadores sem saber qual será o futuro dessa modalidade. No fim de semana passado tivemos uma rodada de clássicos no futebol brasileiro. Jogo transmitido, Fluminense e Botafogo.

Um jogo desanimado, com muitas faltas e pouco futebol. Como o jornalista vai fazer para que seu espectador se interesse por um jogo assim? Acaba aí a questão do jornalismo neutro. Muitas vezes de forma compreensível, como nesta do referido jogo.

E o jornalista esportivo? Como ele dirá a seu ouvinte que o jogo está fraco, duro de ser assistido ou desanimado? Seria o mesmo que ele recomendar que o telespectador mude de canal, procure coisa mais interessante ou inteligente. Como passar ao ouvinte que o jogo transmitido na outra rádio está mais animado? Será que o título de sua matéria poderia ser ‘Mais um jogo fraco?’ Quem se interessará em ler uma matéria como esta?

Morrendo de rir

É nessa hora que o público coloca a flexibilidade do jornalista à prova. Ele vai ter que dizer que o jogo não está lá essas coisas, mas influencia nos pontos daquele do outro canal, e que por isso é melhor você assistir para saber como vai ficar o seu time. Esse foi o caso de Fluminense e Botafogo: o jogo foi fraco, mas os times estão na ponta da tabela brigando pela liderança.

O jornalismo, nesse caso, não deixaria de ser neutro, mas e quando o profissional prefere apelar ao exagero? O jogador chuta a bola quase na lateral e ele diz pelo rádio que a bola passou raspando no gol. E na TV é pior. Altera a voz e a velocidade da locução para passar ao público uma emoção que não existe. Mérito do locutor, quando consegue, é claro.

E quando termina o jogo, o que perguntar aos jogadores de um jogo apático e sem graça nenhuma? Já vi colegas chegarem a um jogador que acabara de perder por 4 a 0 e perguntar: ‘E aí fulano, o que achou do jogo?’ A resposta não poderia ser outra: ‘O que você acha?’ Outra vez, depois de outra goleada, o repórter: ‘E aí beltrano, você está triste com o placar?’ E o jogador: ‘Não, imagina… estou morrendo de rir… rá, rá, rá…’.

O controle nas mãos

Que os jornalistas esportivos não escolhem o que será transmitido, isso é fato, mas ter flexibilidade para dar emoção a algo sem graça torna-se cada vez mais uma obrigação. É como ter que cobrir uma matéria sobre a idade das amebas e fazer isso virar manchete.

O papel do jornalista esportivo é e sempre foi informar ao espectador, o que jamais pode ser confundido com enganação. Onde ficam os direitos do consumidor? Quando um locutor de rádio passa uma coisa que na realidade não está acontecendo, de certa forma, está desrespeitando seu público e, conseqüentemente, seus direitos.

Informar é bem diferente de enganar. Deduzir que uma coisa leva à outra é o mesmo que dizer que o jornalismo investigativo não precisa ser neutro.

As rodadas do campeonato continuam, o jornalista não escolhe o que será transmitido, mas o espectador ainda tem o controle (remoto) em mãos.

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Estudante de Jornalismo