Situação de guerra é um momento peculiar para pensar a prática jornalística. A violência contra a jornalista da CBS Lara Logan, durante a cobertura da crise no Egito, mostrou as fragilidades a que os jornalistas estão expostos. Algumas nem chegam a conhecimento do público: hostilidade dos nativos, dificuldades para transpor fronteiras, falta de dinheiro e dificuldade de comunicação.
Além disso, nas guerras os jornalistas são reféns de um cenário muito instável: sua condição será mais ou menos vulnerável de acordo com as mudanças que se estabelecem de maneira abrupta no poder. A situação é ainda pior para os frilas que, além dos riscos que correm, gastam o próprio dinheiro para trabalhar sem a certeza de que suas produções serão compradas por alguma agência de informação.
Nenhum profissional é mais refém da direção em que sopra os ventos que o jornalista, seja ou não correspondente de guerra. O mundo árabe seguia em polvorosa enquanto, em Brasília, mais de 50 jornalistas foram obrigados a comemorar o dia que homenageia a profissão em casa. O motivo das demissões é obscuro, mas se pode especular que seja pela queda do lucro daqueles que são os mais tradicionais jornais da cidade.
E não seria verdade, também, que os jornalistas são reféns daquilo que se julga ser de interesse dos consumidores da notícia? Notícias internacionais ganham pouca atenção: carregam o carma de derrubar a audiência. Enquanto isso, só se fala em um certo maluco de Realengo.
Prática se aprende na prática
Ainda que os jornalistas e profissionais da Comunicação entendam a espetacularização da chacina na Escola Municipal Tasso da Silveira como um possível incentivo à violência, ainda que saibam que explorar a dor das vítimas e de seus familiares seja desumano, e possivelmente um obstáculo à superação do trauma, ainda assim, o fazem. E o fazem em nome do suposto interesse dos receptores da notícia, estabelecendo, na prática, uma relação de clientela. É como aquela marca que, contrariando o Estatuto da Criança e do Adolescente e as campanhas contra a erotização infantil, lança um sutiã com enchimento e sapatos com salto alto para crianças menores de 12 anos: pois sabe que a menina, na ânsia por um corpo igual ao da mãe, ao das suas bonecas e ao que ela vê na televisão, será impelida a comprar. Em ambos os casos temos um apelo ao consumo com total desconsideração de suas consequências.
O jornalista nessa história toda é só um refém: seja dos interesses da clientela, seja dos interesses do patrão. Sendo o último não só os donos do jornal, mas também os anunciantes. Os casos de não-veiculação de matérias que possam comprometer os anunciantes publicitários e os donos daquela mídia são comuns. Tem-se uma situação em que o jornalismo, profissão que costuma ser associada ao grau de liberdade que se tem em um país, fica tão livre quanto uma andorinha sem asas.
O mais desolador de tudo isso é que nós, jornalistas, seguimos reféns ao mesmo tempo em que nos está sendo tirada a possibilidade de pedir resgate. Quem mais poderia resgatar o jornalismo dessa situação, pensar a produção da informação atual e as possíveis soluções senão as faculdades de Jornalismo? Essas que, por vezes, são consideradas desnecessárias e que, infelizmente, muitas vezes o são, quando dedicam demasiado tempo ao ensino da técnica de produção jornalística em detrimento da análise do contexto social em que o jornalismo está inserido. O que dá justificativa aos que se opõem à formação acadêmica: ora, a prática se aprende na prática.
O jornalismo fica, então, limitado a um cenário de produção incessante de notícias que serão consumidas e terão o mesmo fim que muitos jornalistas: logo serão descartadas.
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Estudante de Jornalismo, Brasília, DF