Na votação do Supremo Tribunal Federal (STF), neste início de agosto, foi aprovado o exercício da atividade de músico sem necessidade de registro na Ordem dos Músicos do Brasil (OMB). O ministro Gilmar Mendes disse, conforme o site do Jornal de Gramado, da Serra gaúcha: “No voto que eu tinha preparado, invoco os princípios da liberdade de expressão falados na sempre polêmica questão da liberdade do exercício do jornalismo.” Mas não vou me ater à questão de quem vive de acordes.
Pela defesa do ministro Gilmar Mendes, favorável à falta de exigência do diploma para a atividade jornalística, pergunto: por que eu, licenciado em Letras e bacharel em Comunicação Social (assim como muitos colegas), não posso atuar na área jurídica? Afinal, não tenho a “liberdade de expressão” para entender a diferença entre certo e errado, do justo e do injusto, a ponto de me manifestar em um tribunal? Não há casos em que magistrados revertem uma sentença cujo resultado era outro esperado (ou óbvio)? “Vai da cabeça de cada juiz” – já ouvi não somente de um advogado. Então, “esse vai da cabeça” pode sugerir que eu e o ministro temos suficiente ciência de julgar ou condenar na esfera jurídica no mesmo entendimento profissional?
Não! Só usei o caso para mostrar que todo cidadão esclarecido tem uma informação a respeito dos fatos, mas não necessariamente tem autoridade para decidir sobre tal. É uma questão relacionada a profissionais que trabalham com justiça, nesse exemplo do tribunal, reconhecidos por fé pelo ofício para o qual se especializaram.
Com habilidades
Utilizei-o para me reportar à preocupação do ministro Gilmar Mendes no quesito “liberdade de expressão”, que parece ter ficado marcado na atuação dele por parecer haver algum orgulho pessoal nessa defesa – também – dos músicos sem registro.
Na verdade, existe confusão com o que o magistrado deveria entender como “responsabilidade social com a informação”. Tal noção é um propulsor da procedência ética pela qual os princípios do exercício profissional devem estar fundamentados. E, por favor: em nome da tal “liberdade de expressão”, permita-me entender assim a posição do ministro do STF.
Ao falar em “responsabilidade social”, deve-se compreendê-la como associada à prática da conduta de qualquer categoria de trabalhadores diplomados, como advogados, médicos e professores. Logicamente, alguém que escreve durante anos tem sua prática polida, assim como teria alguém que atuasse em tribunais. Afinal, uma pessoa com suas habilidades, aprende qualquer coisa por anos em prática sem estudo.
Enorme diferença
No entanto, o que difere trabalhadores assim dos verdadeiros profissionais diz respeito ao papel da universidade, criada há séculos como semeadouro para as reflexões científicas – e não como simples reduto de formação profissional, como muitos a transformaram hoje. Nela, está o cerne das questões acerca da sociedade em que a responsabilidade pela informação recai.
Assim como nas demais atividades diplomadas, o jornalismo merece seu lugar através de conselhos para reger a conduta e a atuação de seus profissionais. Afinal, para o exercício de ofício é preciso haver procedimento ético e – muito importante – entendimento científico não garantido por anos de uma prática sem qualquer cunho metodológico. É necessário, constantemente, lutar pela volta do diploma, de modo a levar a bandeira da enorme diferença entre “liberdade de expressão” e “responsabilidade social pela informação”.
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[Márcio Cavalli é bacharel em Comunicação Social, licenciado em Letras e editor-chefe do jornal Dinâmico]