Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Rosa Costa

‘Por cerca de duas horas, na tarde de ontem, a TV Senado exibiu bons momentos da vida política brasileira. A partir do alardeado discurso do senador Almeida Lima (PDT-SE), que prometia revelações sobre as ligações do ministro José Dirceu com o chamado caso Waldomiro, o canal exibiu uma sucessão de respostas e comentários – de Ideli Salvatti (PT-SP), Renan Calheiros (PMDB-AL) e Heloísa Helena (sem partido-AL) – que culminaram com uma irônica leitura, pelo senador Jefferson Péres (PDT-AM), do indignado protesto feito por Dirceu, em 2002, contra as manobras do governo Fernando Henrique para impedir a instalação de uma CPI.

Foi a repetição de um fato que já se tornou hábito: a TV Senado se transformou numa arma poderosa da oposição. Diante do fraco desempenho dos senadores da base governista, um telespectador desavisado que sintonizar o canal no horário das sessões poderá achar que está diante da TV da Oposição.

Há quem acredite que, apesar da audiência modesta, esses discursos poderão ter um peso maior que em outros anos nas eleições municipais de outubro.

Talvez seja por isso que a prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT), tenha se transformado num alvo predileto dos oposicionistas. Como ela não conseguiu se aproximar do PMDB, sua defesa fica restrita a eventuais declarações do ex-marido, senador Eduardo Suplicy (PT-SP), e do líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP).

Politizados – A audiência do canal, segundo o presidente do Instituto de Estudos da Televisão (IESTevê), jornalista Nelson Hoineff, é constituída por pessoas politizadas e formadoras de opinião. Um ponto favorável ao político que aparece no canal, diz Hoineff, é que a emissora ‘é bem feita, bem programada e foge do estereótipo das demais tevês públicas’.

Se, no segundo semestre, o canal também ficar disponível pela tevê aberta, como está planejado, alcançará um público bem maior. ‘A TV Senado é hoje o nosso melhor palanque’, assegura o senador Álvaro Dias (PSDB-PR). ‘Quando estou no interior e as pessoas dizem que me viram discursando, sei logo que foi pela TV Senado’, complementa o senador Demóstenes Torres (PFL-GO). A diretora do canal, Marilena Chiarelli, lembra que a TV é sintonizada em 76 cidades via cabo, segundo dados da Associação Brasileira de Tevês por Assinatura.’



Paulo Henrique Ferreira

‘Lula-lá na visão de quem provoca o riso’, copyright O Globo, 5/03/04

‘O Salão Carioca de Humor recebeu para o debate ‘Humor em tempos de Lula’, na noite de quarta-feira, no teatro da Casa de Cultura Laura Alvim, estrelas brasileiras do desenho de humor. Na mesa, os chargistas Aroeira, do jornal ‘O Dia’, Angeli, da ‘Folha de S. Paulo’, Paulo Caruso, da ‘Isto É’ e do ‘Diário de S. Paulo’, e o premiado gaúcho Santiago.

Entre o anarquismo de Angeli – que reclamou do pouco tempo reservado ao debate – e a exaltação esquerdista de Santiago, o bate-papo tratou da relação da charge com o poder e a forma com que os chargistas abordaram a chegada de Lula a Brasília.

– Charge em grandes jornais é inviável, porque são comprometidos com diversos interesses – atacou Santiago. – Não dá para ser humorista sem ser de esquerda.

Já Aroeira afirmou que o alvo do chargista é o poder e que a idéia central do trabalho é ridicularizá-lo.

– Não sou pago para ser justo nem politicamente correto – decretou.

Lula na Presidência apimentou o debate entre os participantes da mesa. Caruso lembrou que a maneira de conduzir o poder é sempre a mesma e que Lula mantém esse jogo. Santiago disse vai criticar o presidente sempre que ele se afastar da esquerda. Já Angeli não teve dificuldade em retratar a transição do PT de oposição para situação, afirmando que, em política, tudo é um grande teatro e que, a partir desta visão, é possível produzir charges bastante engraçadas.’



Gilberto Dimenstein

‘Você, caro leitor, faz parte do Clube dos 20%’, copyright Folha de S. Paulo, 7/03/04

‘Um exemplo da ignorância do brasileiro foi divulgado na semana passada e dá ensejo a uma aula de educação a partir de um caso de corrupção.

Há mais de duas semanas, quase não se fala de outra coisa na mídia que não seja o caso Waldomiro Diniz. É rigorosamente impossível abrir um jornal ou uma revista, ligar o rádio ou a televisão, ou mesmo acessar a internet sem esbarrar nas denúncias de falcatruas que envolvem o governo Lula.

Pesquisa Datafolha, publicada na quarta-feira, informou que, apesar de todo esse estardalhaço, apenas 21% dos brasileiros sabem quem é Waldomiro Diniz. Dos entrevistados, 53% nem sequer tinham ouvido falar do ex-assessor do ministro José Dirceu.

Essas percentagens indicam extraordinária semelhança com o nível de educação do brasileiro -e mostram o tremendo desafio que é a qualificação do eleitor.

Um dos mais sérios estudos sobre o analfabetismo funcional -condição em que se encontra quem não entende o que lê- é o realizado pelo Instituto Paulo Montenegro em parceria com a Ação Educativa.

Não é coincidência o fato de que, segundo o estudo, realizado com base em pesquisas feitas em todo o país, apenas 25% dos brasileiros com mais de 15 anos dominam plenamente a leitura e a escrita. Acrescente-se a isso mais um dado para entender por que tão poucos demonstram habilidade de ler e entender, condições primárias da cidadania: 20% dos brasileiros concluíram o ensino médio -quase a mesma percentagem dos que sabem quem é Waldomiro. Esse é o seleto clube dos cidadãos informados.

De acordo com a pesquisa do Instituto Paulo Montenegro, 8% dos brasileiros não sabem ler, são os analfabetos totais; 30%, os tais analfabetos funcionais, lêem, mas não entendem o conteúdo dos textos, incapazes que são de interpretar algo um pouco mais complexo do que um bilhete; 37% conseguem identificar informação numa notícia curta, mas não vão muito além disso.

Voltemos, agora, ao levantamento do Datafolha, segundo o qual 53% não ouviram falar de Waldomiro Diniz. Dos 44% que ouviram, apenas 21% souberam dizer quem é ele. Tais divisões parecem seguir as mesmas divisões dos graus de entendimento de leitura, que variam do total analfabetismo à dificuldade de compreensão de uma notícia curta.

Se esse grau de desinformação ocorre em relação a um escândalo tão explorado pela mídia, imagine o que se dá com fatos que, embora sejam vitais para o cidadão, recebem menos destaque.

Acaba sobrando mais espaço para o pensamento mágico, para a dissociação entre as relações de causa e efeito, além da dificuldade de o cidadão entender processos políticos, sociais e econômicos e associá-los à sua vida. Quantas pessoas, mesmo entre aquelas do Clube dos 20% -os informados-, sabem o que têm a ver superávit primário, FMI ou investimento com suas necessidades cotidianas -esse foi, entretanto, o tema internacional que mais mobilizou, na semana passada, o presidente Lula.

Quantos brasileiros sabem que o PT, ao recusar a abertura de uma CPI, se comporta como o PSDB e o PFL se comportavam no passado, quando estavam instalados no poder -e que o PSDB, de José Serra, e o PFL, de Jorge Bornhausen, agora na oposição, agem como o PT agia?

Como explicar que Paulo Maluf, depois de tantas denúncias e de pistas concretas de vultosas contas secretas no exterior, ainda esteja em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto para a Prefeitura de São Paulo?

Virão agora as eleições municipais e nós, da mídia, integrantes do clube dos 21%, vamos ficar reclamando dos candidatos, exigindo racionalidade e combatendo o pensamento mágico de quem acredita em ilusões.

Vamos mostrar que o somatório das promessas excede várias vezes o Orçamento; vamos mostrar também que um ou outro compromisso não está na órbita de responsabilidade de um prefeito, por exemplo.

Vamos falar quase exclusivamente para o Clube dos 20%, apresentando números, estatísticas, enquanto a maioria vai se encantar com os delírios embalados pelo marketing. Isso pela simples e óbvia razão de que, com baixa escolaridade, a democracia será sempre uma simulação de representatividade.

PS – Começaram a chegar, na semana passada, documentos que vão mostrar, pelo menos para o Clube dos 20%, como se gasta mal o dinheiro social no Brasil. Estão unificando o cadastro de beneficiários de programas de transferência de renda com base em dados federais, estaduais e municipais. Estão descobrindo em São Paulo, por exemplo, famílias que ganham mais de R$ 800 mensais apenas com bolsas e vivem próximas de famílias, igualmente pobres, que ganham muito menos ou não ganham nada.’



Julia Duailibi e José Alberto Bombig

‘Petistas fazem ataques a oposição e mídia’, copyright Folha de S. Paulo, 6/03/04

‘Em documento oficial divulgado ontem, o PT acusou a oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a mídia de fazerem uma ‘campanha sistemática’ contra o partido no caso que envolve o ex-assessor da Presidência Waldomiro Diniz.

‘A partir de um fato condenável sob todos os aspectos, ocorrido em 2002 -o caso Waldomiro Diniz-, o PT, o companheiro José Dirceu [ministro da Casa Civil], dirigentes do partido e o governo Lula tornaram-se alvos de uma campanha sistemática, orquestrada por setores da oposição e da mídia, visando desconstruir o capital ético e político do PT e enfraquecer o governo’, diz o texto.

Waldomiro foi flagrado, em gravação de 2002, pedindo propina e dinheiro para campanhas eleitorais a um empresário de jogos. Na época, ele presidia a Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro). Benedita da Silva (PT) governava o Rio de Janeiro.

A nota, intitulada ‘Em defesa do patrimônio ético do PT’, tem seis itens. Em seu último ponto, o texto ‘conclama’ os militantes do partido a defenderem seu ‘patrimônio ético e político’.

‘Os dirigentes, militantes e simpatizantes do partido devem ter noção das dificuldades e das resistências que o governo Lula, o PT e seus aliados enfrentarão para mudar o Brasil’, diz o documento.

A reunião realizada ontem na sede nacional do partido, no centro de São Paulo, foi convocada em substituição ao ato que o PT chegou a convocar em desagravo a Dirceu. No entanto, após pressão do governo, a manifestação, que seria nacional, foi cancelada.

No encontro, discutiu-se, além do caso Waldomiro, a reunião do PT, programada para maio, que tratará exclusivamente das eleições municipais deste ano.

Segundo o texto, ‘o principal objetivo desses setores da oposição ao atacarem o governo e o PT é encontrar atalhos fáceis para o êxito eleitoral nas próximas eleições. Na verdade, o que estamos presenciando é a precipitação da disputa eleitoral de 2004’.

Para o presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, os efeitos do escândalo deverão ser residuais e não afetarão o partido nas eleições deste ano: ‘As dificuldades deste momento serão superadas. Sou otimista e acredito que o povo brasileiro vá saber separar o joio do trigo’.

O presidente do PT, José Genoino, reafirmou sua posição de apoio a Dirceu e, novamente, atribuiu à oposição a crise política.

‘O companheiro Zé Dirceu é um orgulho deste partido. Temos de ter a consciência de que estamos em um ano eleitoral. O que a oposição quer é uma batalha política’, disse Genoino.

‘Nós aprovamos uma nota que mostra nossa união em torno do governo e do ministro José Dirceu’, disse o deputado Nelson Pellegrino (BA), pré-candidato a prefeito de Salvador.

Feridas

Apesar do discurso afirmativo de apoio ao ministro, muitos petistas que participaram da reunião admitiram que o partido sai ‘arranhado’ e ‘machucado’ do episódio. ‘Nós podemos sair arranhados da crise, sim, mas vamos sair da crise, do ponto de vista de confiança da população, até melhor se tomarmos as atitudes em que eu tenho confiança em que nós iremos adotar’, disse o governador do Acre, Jorge Viana.

Ainda no documento, o PT recomenda aos filiados ‘cuidado na escolha de assessores’ e diz que o episódio Waldomiro deve valorizar o ‘rigor ético do partido’.

‘Esse caso foi uma tentativa de envolver o ministro, mas o desenrolar dos fatos mostrou que ele não tem nada a ver com essa história’, disse Pellegrino.’