Fórum de Davos, Fórum Social Mundial. Em ambos, muita coisa acontecendo, decisões sendo tomadas e, embora as conseqüências do primeiro sejam mais facilmente identificáveis, conteúdo e discussão é o que não faltou também no segundo.
Ainda assim, pouco se lê sobre o assunto na mídia em geral. Mas isso não seria surpresa, nem motivo de revolta, pois, voto vencido, vamos nos acostumando às regras do jogo da mídia comercial e suas definições do que é ou não pauta.
Mas alguns jornalistas, sempre superando seus próprios limites rumo ao abismo, insistem em renovar as forças de nossa indignação cansada.
Mas alguns jornalistas, sempre superando seus próprios limites rumo ao abismo, insistem em renovar as forças de nossa indignação cansada. Vejamos alguns trechos da seguinte matéria:
‘Participantes do Fórum planejam `outro mundo´, mas lucram com o atual’
(Rodrigo Bertolotto em UOL Notícias http://noticias.uol.com.br/politica/2009/01/27/ult5773u426.jhtm)
‘Mesmo com o objetivo declarado de `libertação do mundo do domínio do capital´, tem muita gente fazendo caixa com o Fórum Mundial Social, que começa nesta terça.'(…) ‘Como um grupo de uruguaias estudantes de sociologia que viajou de carona até o Pará. Elas estão vendendo saias que fizeram por R$ 35 e R$ 45’
E o grand finale:
‘(…) enquanto planejam um `outro mundo possível´ (lema do encontro), os participantes do Fórum vão lucrando no atual.’
É lícito ironizar alguém que critica o sistema econômico apenas pelo fato de a pessoa – que vive dentro dele, é bom lembrar – também precisar dinheiro para sobreviver? É digno comparar o capitalismo que se critica no FSM – aquele em que bilhões são apostados nas bolsas em jogatinas frenéticas que muitas vezes custam milhares de empregos, como estamos assistindo – com o ‘capitalismo’ de quem vende saias para pagar a viagem a Belém?
Esforço e respeito
Suas críticas ferozes limitam-se a mirar no irrisório. Para além dos eventos e reuniões, muitas coisas a serem explicadas acontecem em Belém que poderiam ser alvo de questionamento na mídia. Uma conhecida escreveu avisando que seu ônibus foi seqüestrado por homens armados, que levaram pertences dos passageiros. Corre, à boca pequena entre os locais, o burburinho de que integrantes da própria Polícia Militar do estado estariam envolvidos neste tipo de crime, cada vez mais comum.
E o uso do exército para ‘promover a segurança’ dos participantes? Para proteger o povo local é que não é, já que não é ele quem carrega displicentemente equipamentos fotográficos caros e laptops a tiracolo. Além de não estar resolvendo o problema que se propunha, a militarização é mais um fator de repressão aos pouco abastados de um estado que até bem pouco tempo colocava suas meninas ‘malcriadas’ em celas com criminosos para se revezarem nos estupros.
Pouco combina, além do mais, com o planejamento para um evento em que se deseja pensar outro mundo, mais justo. Mas este tipo de contradição não é explorada na mídia – surge apenas nas conversas entre participantes mais esclarecidos.
Voltando à matéria, faltou profissionalismo. Se as matérias sobre os conteúdos do FSM soam como maçantes, pouco afeitas a gerar muitos cliques, nem mesmo a desculpa comercial isenta a leviandade do repórter. Em apenas um texto, eu, que não estou em Belém nem no meio do jornalismo diário, já citei duas sugestões de pautas. Mas – para quem se recusa a acreditar que se trate de problemas de caráter do autor – faltou, no mínimo, mais esforço e respeito pelas fontes que de bom grado lhes concederam a entrevista.
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Jornalista e pesquisadora acadêmica na área de jornalismo alternativo