O editor do Consultor Jurídico em Brasília, Rodrigo Haidar, fala ao Observatório da Imprensa sobre o que considera o grande desafio do jornalista especializado na cobertura do julgamento do mensalão, a partir de quinta-feira (2/8). Ele diz que não se recorda de ter visto na Supremo Tribunal Federal um clima tão tenso como o de agora, que o levou a falar em “TPM, Tensão Pré-Mensalão”:
Rodrigo Haidar – É tentar fazer exatamente o que os veículos não especializados, digamos assim, estão fazendo. É tentar cobrir esse julgamento da forma mais técnica possível, sem se deixar levar pelo ânimo político do julgamento − eu nunca vi um clima como esse no Supremo. Por exemplo, não escrever que, no começo do julgamento, a defesa vai tentar uma “última manobra para protelar o andamento do mensalão”, que seria o desmembramento.
Não é correto dizer que a defesa vai tentar uma “última manobra” para protelar o julgamento. O que a defesa vai colocar é uma questão técnica, que é discutida em muitos processos, e vai colocar inclusive o Supremo diante de suas próprias decisões. Em 95% dos outros casos em que há réus com foro privilegiado e outros sem foro privilegiado, o Supremo desmembra o processo, e manda para a primeira instância todos aqueles que não têm foro por prerrogativa de função.
Estatuto do PCC
Pela primeira vez na imprensa, salvo engano, o Valor publica na edição de quarta-feira (1/8) notícia sobre um novo “estatuto” do PCC (Primeiro Comando da Capital), organização criminosa criada há 19 anos, cuja existência o governo paulista finge ignorar. O repórter Vandson Lima informa que o último de 18 artigos que compõem o documento trata de vinganças contra policiais acusados de agir contra integrantes da organização.
Recomendando “serenidade”, o artigo libera criminosos para individualmente condenar e executar policiais. Redigido em linguagem politizada, fala em “máquina opressora do Estado”. Num balanço dos 17 anos transcorridos desde a divulgação do primeiro documento com as regras do grupo, os autores se gabam de ter revolucionado o crime. E afirmam: “Nossa responsabilidade se torna cada vez maior, porque somos o exemplo a ser seguido”.
O repórter Bruno Paes Manso, do Estado de S. Paulo, vai defender no fim de agosto, na Universidade de São Paulo (USP), tese de doutorado sobre o aumento e a diminuição do número de homicídios em São Paulo entre 1980 e 2010. Ele falou ao Observatório da Imprensa:
Bruno Paes Manso − A partir de 1999 você tem uma mudança na postura do Estado em relação às políticas públicas, o que acabou criando uma transformação na cena do crime, com aumento de prisões. A quantidade de presos em São Paulo passa de 35 mil presos para 200 mil. Você tem uma mudança na cena criminal em São Paulo, porque junto com esse aumento de prisões tem uma Polícia Militar mais presente no flagrante, eles têm uma gestão mais eficiente para estar na hora certa no momento do crime, para mapear, para dar flagrante em arma etc. Você vê que tem uma política pública que transforma a cena do crime em São Paulo.
Essas trajetórias dos criminosos… eles passam a contar com o convívio na prisão em algum momento na sua trajetória no crime. A prisão passa a fazer parte do seu cálculo de carreira, e o bom convívio no crime também passa a fazer parte disso, porque dentro da prisão, com os celulares, com o aumento de contato dessa rede de criminosos, você passa a ser cobrado, você tem uma accountability, ironicamente. Você passa a ter um monitoramento que facilita esse controle no próprio universo do crime e, ao mesmo tempo, de um tipo de crime que é o homicídio, que não interessa para o criminoso, que era um autoextermínio, eles estavam se matando.
Então você tem uma mistura de política pública com um interesse próprio no universo criminal que leva a uma queda muito forte nos homicídios. O que acontece agora é que ao mesmo tempo você tem nesse universo os policias que continuam podendo matar sem grandes controles. Você não tem controle institucional para o homicídio praticado pelo policial. Você tem o controle da corregedoria, claro, mas esse controle só é efetivo quando esse policial erra, quando o policial é visto, quando tem uma testemunha. Com o PCC entrando no atacado de drogas, indo para as biqueiras, aumentando muito a venda de drogas nas periferias, você começa a ter uma promiscuidade muito maior, a polícia também passa a fazer parte das quadrilhas, e ao mesmo tempo eles são os caras que matam e que podem matar.