TELEVISÃO
Aposte na inteligência, 23/6
‘O apresentador Otávio Mesquita se casou pela terceira vez e declarou: ‘Levei
48 anos para encontrar a mulher da minha vida e quero ficar com ela até
morrer’.
Gosto de pensar sobre esse tipo de declaração. Nas outras duas vezes, será
que Otávio teria sido sincero e dito: ‘veja bem; eu não faço a menor idéia se
você é a mulher da minha vida. Não tenho a menor idéia de quanto tempo quero
ficar com você mas, sei lá, acho que vale a pena casar e até ter filhos’?
Celebridades estiveram no local. Hebe, li, estava mal humorada e não quis
falar com jornalistas. E aí disseram que rola um boato de que ela iria para a
Record. Boato que, obviamente, a Record não confirma. O que não entendi: por que
a eventual possibilidade de mudança a deixaria de mau humor? Por que a Hebe não
poderia simplesmente estar em um mau dia? Por que a especulação deve sempre
superar a informação? Deixem a Hebe em paz.
Adriane Galisteu apareceu no casamento acompanhada por Alexandre Iódice e já
começaram a especular e a dizer que o rapaz seria seu novo namorado. Adriane
está vivendo um momento muito dela. Deixem a moça em paz!
E a mulher da vida de Otávio Mesquita, Melissa, pediu de presente de
casamento tickets para assistir a um show da Cher, em Las Vegas. E ganhou. O
casal embarca na próxima semana.
Babi Xavier está bem na novela Os Mutantes. Nos últimos anos foram muitas as
mudanças na carreira e, confesso que em alguns momentos senti dificuldade para
reconhecê-la, desde que sua boca, seus lábios, passaram por estranhas
mutações.
Bastante interessante a série ‘Em Terapia’, que vem sendo exibida na HBO. E
sob vários aspectos. O primeiro: quem seria capaz de apostar em uma série onde
nada além de um diálogo em uma sala acontece? A série, como revela seu nome,
mostra pacientes em sessões de terapia. Não será jamais um blockbuster, mas
certamente já tem fãs por aqui e pelo mundo.
‘Em Terapia’ é mais uma prova de que um bom texto que vira uma boa conversa,
uma conversa inteligente, com alguma profundidade, bem interpretada, sempre vai
interessar. Vender inteligência, mesmo que o mundo pareça conspirar contra essa
idéia, sempre será um bom negócio. E eu acho fantástico que pelo mundo continue
a existir muita gente disposta a ignorar o lucro fácil da vulgaridade e da
imbecilidade.
Antes que eu me esqueça, foi muito fofo ver, no Amaury Jr. Show, uma arara
andando de patins por 30 cm e depois andando com um mini-patinete por mais de 70
cm.
Márcio Alemão é publicitário, roteirista, colunista de gastronomia da revista
Carta Capital, síndico de seu prédio, pai, filho e esposo exemplar.’
CRÍTICA
Livro resgata polêmica de Primo Basílio, 23/6
‘Os tumultos críticos provocados por O Primo Basílio, de Eça de Queiroz,
voltam em edição pesquisada com minúcia em arquivos de jornais brasileiros.
Esmaecidas pelo predomínio das cores fortes de Machado de Assis ao desancar o
romance queirosiano, outras vozes literárias de 1878 foram recuperadas em O
Primo Basílio na imprensa brasileira do século XIX (Ed.Unesp), de José Leonardo
do Nascimento, doutor em História da Cultura pela Universidade de Paris e
livre-docente em História da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade
Estadual Paulista.
Vinte e quatro textos – colhidos em folhas como Gazeta de Notícias, Revista
Ilustrada, O Cruzeiro e Jornal do Commercio – compõem um mosaico do debate em
torno da obra de Eça de Queiroz. O ‘pobre homem de Póvoa do Varzim’ provocou
escândalo ao usar o ‘perfume de alcova’ na construção da personagem Luísa. De
acordo com o professor José Leonardo, a opinião de Machado praticamente suprimiu
da história os jornalistas que discordaram de sua crítica nos calores da
polêmica de Basílio.
– Mais de 120 anos depois, por que reproduzir esse debate? Algumas coisas
despertaram meu interesse. Por que Machado falava sozinho? Por que a
interlocução não era reconstituída? Era uma espécie de Machado dixit. O primeiro
passo foi reconstituir esse debate. Em 1878, Machado não era a unanimidade que
nós imaginamos. Tanto que Rafael Bordalo Pinheiro sempre falava do ‘trocadilho
talhado a machado’… – diz Nascimento.
Em artigo publicado em 16 de abril de 1878, sob o pseudônimo de Eleazar, o
romancista brasileiro considerou Luísa ‘antes um títere do que uma pessoa moral’
e envenenou as vinculações do autor com a escola realista/naturalista: ‘Com tais
preocupações de escola, não admira que a pena do autor chegue ao extremo de
correr o resposteiro conjugal; que nos talhe as suas mulheres pelos aspectos e
trejeitos da concupisência…’.
Arderia em Eça a indicação de plágio: Machado o acusa de ter emulado Émile
Zola em O crime do padre Amaro – um ‘carbono’ de Faute de l’abbé Mouret.
Afirmação, como se veria, injusta; e refutada pelo próprio Eça: ‘O crime do
padre Amaro foi escrito em 1871, lido a alguns amigos em 1872, e publicado em
1874. O livro do sr. Zola, La faute de l ‘abbé Mouret, foi escrito e publicado
em 1875’. José Leonardo analisa as ranhuras na relação entre os dois
escritores:
– A acusação de plágio vai atingir Eça em cheio. Tanto que ele fez uma ‘Nota
à 2a edição’ de O Crime do padre Amaro e se refere a uma ‘obtusidade córnea ou
má fé cínica’ de Machado. A partir daí, as relações ficaram difíceis. Esse
mal-estar ficou registrado na carta-obtuário escrita por Machado quando da morte
de Eça (em 1900). Ele praticamente retoma os argumentos da polêmica de O Primo
Basílio e transforma Eça naquilo que ele queria que ele fosse em 1878.
‘Página 320’
José Leonardo recompõe a troca de petardos ao tempo da publicação do livro. O
afinamento de idéias, a contraposição de argumentos e o tiroteio de ironias
envolvem Ramalho Ortigão, Carlos de Laet, Luiz de Andrade, Ângelo Agostini,
Amenófis Efendi (pseudônimo), Afonso Celso Júnior, etc. O Primo Basílio virou
‘coqueluche’ – não se admitia um brasileiro letrado, bípede e informado que
desconhecesse a polêmica de Eça de Queiroz, famoso então pelas páginas de As
Farpas, divididas com Ortigão. Suas ferroadas ajudaram a modernizar as
mentalidades portuguesa e brasileira. Para usar uma refinada frase de Machado no
necrológio de Eça, perdoava-se o ‘mal da dor pelo mel da língua’.
– O Primo Basílio atingiu a moralidade brasileira. Na perspectiva de Machado,
o livro é mais revolucionário do que diziam seus defensores. A crítica
machadiana pode ser entendida da seguinte forma: o romance de Eça é tão eficaz
que pode produzir um comportamento imoral. Os defensores do livro não atribuíam
esse poder de transformação moral.
A ‘página 320’, na qual havia o sexo oral, era evocada a todo instante. No
estudo analítico que antecede a coletânea de textos, Nascimento pondera: ‘As
críticas do escritor brasileiro foram, em geral, vistas por seus contemporâneos
como desasiadamente carregadas de pontos de vista apriorísticos e, por
conseguinte, guiadas por objetivos estéticos combativos e militantes. Filiado à
escola romântica, o crítico estaria naturalmente em oposição, segundo seus
interlocutores da época, às expressões literárias do realismo em língua
portuguesa’.
Os textos são ordenados cronologicamente, com apresentações dos autores e
polemistas – em alguns casos, caem as máscaras dos pseudônimos, recurso
utilizado à náusea pela imprensa carioca no século XIX e início do XX. Uma nota
adicional: o conjunto de críticas a Primo Basílio revela não somente que o
debate intectual luso-brasileiro era bem mais assíduo e apimentado; em outro
aspecto, a polêmica queirosiana rescende a uma coragem crítica castrada pela
imprensa brasileira contemporânea.
‘Havia uma grande liberdade de imprensa no Segundo Império. No debate, os
argumentos se tornam mais precisos. A elite brasileira alfabetizada lia jornal e
ia ao teatro, embora o número de pessoas alfabetizadas fosse pequeno. A imprensa
do século XIX impregnava mais a sociedade do que a atual’, diz José Leonardo.
Foi-se o mel da língua em troca do mal da dor.
Livro: ‘O Primo Basílio na Imprensa Brasileira do Século XIX – Estética e
História’ (312 págs.)
Autor: José Leonardo do Nascimento
Editora Unesp.’
CONTROLE
A máquina de fazer louco, 21/6
‘Em junho de 2008, em uma área comercial de Tóquio, o operário Tomohiro Kato,
esfaqueou e matou sete pessoas e feriu mais dez. O crime foi anunciado, em
detalhes, no blog do trabalhador. E, em seu diário eletrônico, ele tentou
explicar a sua loucura: ‘Eu valho menos que lixo, porque ele pelo menos é
reciclado’. Uma triste história, produzida no ambiente das mega-cidades, em que
potencialmente todos são mais um dentro de estruturas organizacionais produtoras
de insanidades.
O cinema – que se interessa por dramas como o relatado – tem, também,
produzido críticas contundentes aos modelos organizacionais, sejam eles
aplicados em empresas e instituições. Inicia a fila de cacetadas no que acontece
nas linhas de produção Tempos Modernos (EUA, 1936), obra-prima, que tem o
roteiro, a direção e a atuação principal de Charles Chaplin. Neste filme, o
processo de trabalho, fragmentado em tarefas e que transforma o homem em
máquina, é expresso nas seqüências em que o personagem de Chaplin é arrastado
por gigantescas engrenagens e, em outra, ele faz a sua refeição em uma máquina
de comer, protótipo visionário dos atuais restaurantes de comida fast-food. As
modernas doenças, mentais e físicas, causadas pelo trabalho repetitivo, também,
estão no filme, na cena em que o operário, enlouquecido, não consegue mais
distinguir porcas de botões, persegue uma mulher para apertar os botões de seu
vestido, satiricamente costurados na altura dos bicos dos seios.
O ambiente da maquinaria empresarial que tira as pessoas do sério é tema de
FormiguinhaZ ( EUA, 1998), dirigido por Eric Darnell e Tim Johnson, e, destaque
para a voz de Woody Allen, um desenho que critica organizações que não têm
espaço para as pessoas que não querem guerrear para conquistar ou manter uma
posição em sua hierarquia. A empresa, na metáfora passada no formigueiro, é
lugar de competição, luta e conflito permanentes. O salário, o bônus e os
reconhecimentos são troféus de uma guerra, que, de repente, sangra nas ruas e
vira manchete, como no caso do trabalhador japonês.
O controle corporativo, que, mais cedo ou mais tarde, transforma pessoa em
fera, é analisado em O Show de Truman (EUA, 1998). Neste filme, Truman Burbank,
protagonizado por Jim Carrey, é um individuo que desde o seu nascimento, sem que
ele saiba, vive com uma câmera de televisão, em tempo real, acompanhando a sua
vida, e, pior do que isso, transmitindo para todo o país. Até o dia em que
Burbank descobre que vive dentro de um cenário, onde a cidade e os papéis
sociais vividos ali são parte de um cenário. Nada ali é verdadeiro. O personagem
do reality show escapa do programa e foge para além das paredes cenográficas.
Em direção a outras organizações, onde homens e mulheres vivem outras
situações semelhantes. Lembrando semelhanças, ainda em Tóquio, em janeiro,
também de 2008, outro operário esfaqueou algumas pessoas num centro
comercial.
Paulo Nassar é professor da Escola de Comunicações e Artes, da Universidade
de São Paulo (ECA-USP). Diretor-presidente da Associação Brasileira de
Comunicação Empresarial (ABERJE). Autor de inúmeros livros, entre eles O que é
Comunicação Empresarial, A Comunicação da Pequena Empresa, e Tudo é
Comunicação.’
ENTREVISTA INTERROMPIDA
NY: João Gilberto é aplaudido de pé antes de show, 23/6
‘Com casa lotada e ingressos esgotados há duas semanas, João Gilberto estreou
na noite de 22 de junho, no Carnegie Hall, o show ‘50 Anos de Bossa Nova’,
comemorativo do movimento que internacionalizou a Música Popular Brasileira nos
anos 60 e transformou artistas como ele e Tom Jobim em verdadeiras legendas no
concorrido mercado de jazz americano. ‘É uma grande emoção retornar aqui’, disse
o cantor a Terra Magazine, uma hora depois de deixar o camarim da famosa casa de
espetáculos de Nova Iorque, onde fez uma única apresentação no JVC Jazz
Festival.
Mas o tom amável do músico logo foi substituído por um ar de gravidade no
rosto, seguido por uma mudez irredutível, e João Gilberto encerrou bruscamente a
entrevista. Ficou insatisfeito com a pergunta feita por um repórter da TV Record
sobre se ‘50 anos depois a Bossa Nova ainda pode ser considerada MPB’.
Do lado de fora da entrada da West Street 56, esquina com a Seventh Avenue,
reservada aos músicos e ao staff, alguns fãs que o aguardavam ficaram sem
entender a rapidez com que João deixou o local, sem ceder aos apelos por
autógrafos. A ambientalista nova-iorquina Allegra Levanne, que esperou por mais
de uma hora a saída do músico com o CD Getz/Gilberto nas mãos – clássico da
Bossa Nova que vendeu mais de um milhão de cópias em meados dos sixties – ficou
desolada:
‘Eu o acompanho há mais de 40 anos. Ele é muito popular nos Estados Unidos’,
disse ela, que trabalha como voluntária para combater a poluição em Nova Iorque.
‘Quero que você escreva que as lágrimas vieram aos olhos, mais uma vez, ao ouvir
nesta noite esse artista extraordinário’, acrescentou a ambientalista, que adora
‘Garota de Ipanema’.
Bossa Nova em cartaz
Manhattan amanheceu com céu parcialmente nublado e pancadas de chuva em manhã
quente do verão nova-iorquino. Cerca de 35 graus centígrados, com muita gente
caminhando e andando de bicicleta pelas ruas, no dia em que, mais uma vez, o
público reiventou o mito João Gilberto. Quase 50 anos depois da histórica
apresentação com o maestro Tom Jobim, Carlos Lyra e Sérgio Mendes (que fez show
dia 21), no mesmo local em que a Bossa Nova se projetou para o mundo, o Carnegie
Hall, João foi ovacionado pelas 2.800 pessoas que lotaram a famosa casa de
espetáculos, aplaudindo-o de pé, ao vê-lo subir ao palco e antes mesmo de tocar
ou dizer boa noite.
Com 15 minutos de atraso, o músico que chegou ao Carnegie Hall às 19h50
(horário de Nova Iorque), a 10 minutos do horário oficial do show, previsto para
começar às 20h, abriu o espetáculo com ‘Doralice’ e continuou a desfiar
clássicos como ‘Chega de Saudade’ (considerado marco inicial), ‘Wave’, ‘Bahia
com H’, ‘Samba do Avião’ na mais absoluta cumplicidade com o público, que esteve
todo o tempo vigilante ao mínimo barulho para não incomodar o artista. Por três
vezes João reclamou à produção do espetáculo de um ar frio sobre sua cabeça, que
‘está me deixando afônico’.
Nada que atrapalhasse o espetáculo (recital), nem impedisse o artista de
cantar durante uma hora e meia, com o tradicional banquinho e o violão. O
instrumento estava apoiado sobre a perna direita, enquanto a esquerda em
movimento contínuo, parecia fazer uma espécie de marcação rítmica da música,
enquanto João, concentrado como um monge, em um impecável terno azul marinho,
prosseguia seu canto, às vezes sussurrado, que atraiu admiradores como os
lendários jazzistas americanos Miles Davis e Stan Getz.
Nos Estados Unidos, ao lado de Tom Jobim, João Gilberto é um dos artistas
mais respeitados. A Bossa Nova que ele criou com a batida de seu violão,
fundindo elementos do samba e do jazz, é a musica brasileira mais tocada e pode
ser ouvida diariamente em rádios americanas, com a execução de várias de
composições do movimento, sem se restringir, como muitos imaginam, à badalada
Girl of Ipanema, que tem mais de 160 gravações e foi sucesso nas vozes de Sarah
Vaughan, Ella Fitzgerald e Frank Sinatra, entre outros.
A partir de agosto, o músico fará turnê pelo Brasil, com apresentações
previstas no Rio, São Paulo e Salvador, onde é grande a expectativa com o
retorno de João Gilberto aos palcos, depois de quase uma década de ausência.
Estão previstas ainda três apresentações no Japão, onde inclusive já gravou
disco.
O artista que pertence à categoria dos criadores e revolucionou a música
brasileira com um banquinho e um violão, talvez, no Brasil, só possa ser
igualado a outro baiano, como ele, o cineasta Glauber Rocha, que com ‘uma câmera
na mão e uma idéia na cabeça’ inventou o Cinema Novo.
Rosane Santana é jornalista e reside em Boston.’
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