Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Terra Magazine

COMUNICAÇÃO CORPORATIVA
Paulo Nassar

Comunicação contra a inflação, 19/7

‘‘A inflação ganhou um fôlego extra nestes últimos meses e se pulveriza por vários setores’.

‘Em abril, presidente afirmou que alta dos alimentos era ‘inflação boa’. Em maio, altas já levaram Lula a dizer que faria ‘qualquer coisa’ para conter preços’.

‘Memória inflacionária ainda assusta o Brasil’.

‘Inflação não pode escapar do controle, diz BNDES’.

Raro o dia, nos últimos meses, que manchetes como estas não ocupam as primeiras páginas dos jornais ou não ocupam lugar de destaque nas páginas econômicas. É um tema que se adensa, que volta ao centro das atenções após mais de uma longa década de hibernação e que, sem dúvida, tende a provocar reações em cadeia. Quem não se lembra das remarcações antecipadas de preços? Quem não recorda que o Brasil chegou a ostentar os mais elevados índices de inflação do planeta ao longo das décadas de 80 e inicio dos anos 90 do século passado?

Tudo isso aconteceu numa época em que a Internet ainda não tinha entrado em cena. E que o seu prodigioso alcance não era sequer imaginado. Hoje, existem 1,4 bilhão de internautas sobre uma população mundial de 6,5 bilhões de pessoas em números aproximados. No Brasil, são mais de 40 milhões de pessoas com acesso à rede (Ibope/NetRatings, 1º semestre de 2008) e a tendência é que este número cresça. Num ambiente em que a inflação venha a ser notícia constante e com grande destaque, espetaculoso ou não, é como jogar gasolina num palheiro e riscar o fósforo. A reação em cadeia será imediata.

Contudo, o governo parece se comportar, se o tema é a comunicação, como se a inflação pertencesse a um país e a realidade brasileira fosse monopólio de outro país. Não me refiro aos aspectos econômicos. A cada notícia de revigoramento do dragão inflacionário, o Banco Central recorre ao remédio de sempre: alta de juros. Ocorre que na sociedade mediática esse remédio não funciona se não vier acompanhado de uma efetiva terapia no âmbito da comunicação.

É imperativo que a sociedade não apenas seja informada, mas seja convencida de que a estabilidade da moeda pode ser mantida, que cada cidadão, no particular, e todos no conjunto podem – e devem – somar forças para que o cenário atual de estabilidade seja preservado.

Essa posição só tende a se agravar num momento em que a Internet impera soberana. É preciso substituir velhos remédios por novos remédios. É preciso reduzir, e reduzir sensivelmente, as incertezas. Esse o objetivo prioritário de uma estratégia de comunicação pública bem sucedida. Daí, duas sugestões práticas.

A primeira é que o Governo lance campanhas de esclarecimento à sociedade quanto ao que fazer para conter a inflação nos limites do que vinha sendo planejado. A segunda é que busque dialogar com o empresariado e a mídia, em especial a mídia, para que o tema seja tratado na justa medida, não com a medida da irracionalidade ou do espetáculo.

É um desafio não só do governo federal, mas dos governos estaduais, órgãos públicos e sindicatos. A diferença entre notícia e comunicação é que a notícia informa, a comunicação é voltada para a mudança de comportamento. Juntas, contribuem para que a sociedade evolua do patamar da opinião pública, mutante por natureza, para o saber público, que se alicerça na força da razão. Comunicação não é panacéia. Precisa vir acompanhada de ações concretas para mudar a realidade concreta.

Porém, é um dos caminhos seguros para o êxito na moderna sociedade democrática. No Brasil, a mídia é muito ativa, desfruta de vasta credibilidade e, como ocorre em todo o mundo, sente forte sedução pela notícia negativa. Fenômeno aqui agravado pela desconfiança que o Estado inspira e por uma cultura, sempre negligenciada, de pessimismo quanto a um amanhã radioso que nunca chega. Campanhas antiinflacionárias, associadas a um processo de diálogo aberto com a sociedade, tenderiam a ser um antídoto vigoroso contra a desconfiança e o pessimismo.

Tornaria visível o que foi conquistado em mais de uma década de estabilidade, a começar pela retomada do crescimento econômico, além de deixar claro todos somos responsáveis, nas atitudes práticas, pela manutenção da posição alcançada. Isto porque não parece existir meio termo: o Brasil será o país da inflação ou o país da estabilidade. A última alternativa tem demonstrado ser prioridade. Como a comunicação, um recurso singular de diferenciação.

Paulo Nassar é professor da Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (ABERJE). Autor de inúmeros livros, entre eles O que é Comunicação Empresarial, A Comunicação da Pequena Empresa, e Tudo é Comunicação.’

 

 

OPERAÇÃO SATIAGRAHA
Vitor Hugo Soares

‘Para que? Pra nada!’, 19/07

‘Prestem atenção no poema ‘Gaúcho’, do pernambucano Ascenso Ferreira, tantas vezes declamado, e mais merecedor de citação que nunca nesta babel sem tamanho gerada em diferentes setores – Justiça, polícia, política, imprensa…, pela Operação Satiagraha e suas inumeráveis ramificações : ‘Riscando os cavalos!/ Tinindo as esporas!/ Través das cochilhas!/ Saí dos meus pagos em louca arrancada!/ Para que? / Pra nada!’.

Agora respondam: é ou não a definição mais completa do ministro da Justiça, Tarso Genro, de uns dias para cá? Mais exatamente, desde que Daniel Dantas, ainda nas dependências da Polícia Federal, ameaçou ‘detonar tudo’ se não saísse logo de lá. Prometeu até dar nomes, endereços e contar motivos de tanta gente incluída nas anotações dos livros escondidos em um fundo falso de parede, descoberto na batida dos ‘federais’ no apartamento do banqueiro, no Leblon, para estresse e fortes palpitações de tantos.

A obra do poeta nascido em Palmares ostenta, por merecimento, duradoura presença na literatura e no coração dos leitores. Em alguns momentos da vida do País, no entanto, como nos ‘episódios dantescos’ (a expressão é do jornalista Bob Fernandes) em curso, os versos e a prosa de Ascenso são cruciais. Fustigam, ajudam a entender fatos e personagens na babel de uma realidade cada vez mais estranha e complicada. Ganham relevância corrosiva e bem humorada muito próxima à dos escritos satíricos de Gregório de Mattos, o ‘Boca de Brasa’, na Bahia do Século XVII.

Menos de três horas depois das declarações de Dantas, cheias de veneno misturado com nitroglicerina se tornarem públicas, no turbilhão da semana passada, o dono do Grupo Opportunity era liberado por decisão ‘de cima’ na sua segunda e breve passagem pelas celas da Polícia Federal, em São Paulo, autorizada, ‘de baixo’, pela Justiça paulista. No rastro, fraturas expostas ‘de todo tamanho e qualidade’, como dizem os baianos. Outras, ainda ocultas. Mas, daí para cá, a fumaça que já era intensa virou fumaceiro mais turvo que o causado pelos incêndios em áreas do cerrado do Planalto Central, em tempos de seca como agora.

Ficou impraticável distinguir com nitidez uma Ema de uma Paca, mesmo quando se olha a menos de um metro de distância. Só uma coisa parece nítida no meio das brumas: no curtíssimo espaço de uma semana, ninguém mudou tanto e tão drasticamente quanto ministro da Justiça, principalmente depois do retorno do presidente Lula da viagem ao Vietnã e adjacências asiáticas.

Quem tiver dúvidas, basta comparar o que fazia e, principalmente, o que falava o ministro Tarso Genro antes disso, na defesa incisiva da legalidade e correção no trabalho dos agentes da PF envolvidos na Operação Satiagraha, crivados de críticas por ‘espetacularização’ e ‘excesso de algemas’, denúncias que assumiram o primeiro plano no barulho do noticiário e dos debates acirrados que se seguiram. Decibéis elevados de acusações, a ponto de jogar para plano secundário a essência de fatos e de personagens que vieram à tona no maior escândalo administrativo e financeiro da história recente.

‘De vinho a água’ é pouco para comparar o novo jeito de agir e falar do ministro da Justiça em seus movimentos dos últimos dias. Mais exatamente, pós-reunião da terça-feira no Palácio do Planalto com o presidente Lula, à qual Genro esteve presente ao lado do presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes – com o qual o ministro da Justiça travava até então ferina e feroz batalha verbal, com estilhaços voando para todo lado.

Praticamente todas as baterias – a começar pela artilharia pesada do ministro Genro e de alguns de seus chefiados de mais alto coturno na Polícia Federal -, parecem deixar de lado alvos prioritários: fatos e personagens da Operação Satiagraha no recente ‘mergulho aos intestinos do País’ (a expressão também é de Bob) e a detenção de figurões como Dantas, Nahas e Pitta, entre outros. Desviam-se agora, rápida e ferozmente, na direção do planejador e executor da Operação Satiagraha, delegado Protógenes Queiroz. Sobras de chumbo grosso parecem reservadas também para o juiz paulista Fausto De Sanctis.

Tudo como de praxe. Por enquanto, espanto mesmo só com ‘a certeza de Daniel Dantas ao se declarar ‘tranqüilo’ quanto ao Supremo Tribunal Federal, do qual nada temeria’, como registra Carlos Heitor Cony em texto exemplar sobre o caso, publicada na Folha. Retornemos então a Ascenso Ferreira, desta vez na prosa de ‘Tradição e outras histórias’, para terminar.

‘Terraço da Casa-Grande, fartura espetaculosa dos coronéis:

– Ó Zé-estribeiro! Ó Zé-estribeiro!

– Inhôôr!

– Quantos litros de leite deu a vaca Cumbuca?

– 25, seu Curuné!

– E a vaca malhada?

– 27, seu Curuné

– E a vaca Pedrês?

– 35, seu Curuné!

– Sóó? Diabo! Os meninos hoje não tem o que mamar.’

Grande Ascenso!’

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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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