AMAZÔNIA
Paulo Nassar
A Amazônia, a comunicação e o futuro compartilhado, 30/8
‘A ética e a responsabilidade social são compatíveis com a expansão dos negócios e o desenvolvimento da economia. É o que têm demonstrado, nos últimos anos, tanto o exemplo de empresas, que investem no desenvolvimento sustentável, cada vez em maior número, como também de produtos financeiros a exemplo dos chamados fundos sociais.
São sementes lançadas nos anos 70, nos Estados Unidos, com duplo objetivo: em parte, a busca do natural atrativo dos investimentos e, em parte, a determinação de investir em setores considerados politicamente corretos. No Brasil, é um fenômeno recente, tendo seu marco histórico no início deste século, mas que ganha força. Prova disso, é a nascente aliança entre o capital industrial e o capital financeiro para abraçar projetos ecologicamente corretos.
É o que internacionalmente tem se chamado de economia social e solidária. Ela se encaixa à perfeição ao grande debate que hoje ganha corpo no país naquilo que se relaciona, por exemplo, ao desenvolvimento sustentável da Amazônia. Por quê? Esse tipo de postura ainda é quase uma gota de água no oceano, se analisado em âmbito mundial. Na Amazônia, essa gota de água é muito menor, mas não deixa de ser, em hipótese alguma, uma esperança de forte potencial transformador.
Como desdobramento, Comunicação e o Jornalismo tornam-se de rara utilidade prática para construir um processo transformador. É o que se pode chamar de um tema de atualidade total. O jornalismo e comunicação são partes de uma mesma cadeia de vasos comunicantes: o jornalismo informa, a comunicação contribui para que a informação se transforme em consciência, em educação que transforma e faz evoluir a realidade.
O tema da relação do homem com a natureza é tão antigo quando a discussão da relação homem-homem. No centro, encontram-se o uso racional da ciência, o uso racional da técnica, a geração de riqueza e bem estar. Se olharmos para trás, a verdade é que a natureza sempre foi vista mais como inimiga do que como aliada.
O homem, além de administrá-la, buscou submetê-la e controlá-la. O próprio evangelho cristão não considerava animais e plantas como dignos do mesmo valor que se dá à vida humana. Os tempos eram outros. A vida do planeta não estava ameaçada. A relação homem-homem, fonte inspiradora de revoluções e continuados conflitos sociais, esta sim, era o motor da história. A realidade atual ampliou a perspectiva. As duas relações homem-natureza e homem-homem ocupam o centro das atenções. Motivos: a relação homem-natureza caminho para a predação, enquanto a relação homem-homem trilhou o rumo da crescente exclusão.
Nesse contexto, jornalismo-comunicação tornam-se os novos motores de uma nova história. São o epicentro de uma grande cruzada educadora que irá criar uma nova cultura industrial e das relações de produção. Uma nova cultura onde o ponto forte é a inclusão social, não mais a exclusão. Não serão, é bom que se ressalte, os jornalistas-comunicadores os construtores da história, mas os educadores, os novos apóstolos desses tempos de mudança que começa a escrever a história do futuro.
Cabe a eles aproximar instituições, privadas e pública, que abraçam a economia social e solidária. Cabe a eles realçar o que existe de positivo sendo feito e, assim, consolidar novos paradigmas. Sim, uma revolução pacífica, mas do tipo coperniana. O verdadeiro problema é a crise de um modelo produtivo e de consumo que se encontra fora do lugar.
Especificamente na Amazônia, esta crise ganha os traços firmes de um modelo que se perdeu, ainda nos idos dos barões da borracha, no labirinto uma visão pré-coperniana do mundo. Ou seja, uma visão onde a Amazônia era um universo isolado, independente por sua própria natureza e vocação.
O desafio do comunicador é mostrar que a Amazônia e o Brasil são um só. Que o destino da Amazônia e do Brasil são indissociáveis. Além de um patrimônio efetivo, a Amazônia é o grande diferencial competitivo brasileiro pelo caráter vasto e imensurável das suas riquezas naturais. Feito o ajuste do modelo, o caminho estará aberto para um novo ciclo de desenvolvimento sustentado.
A economia social e solidária, combinada com uma política efetiva de fiscalização, fará recuar as atitudes predadoras. Fará com que todos os atores sociais passem a ver, consciente ou inconscientemente, a natureza como uma aliada nas complexas relações homem-natureza, homem-homem. E, por este caminho, é que se encontrará também o fio do labirinto para corrigir as desigualdades econômicas e regionais. Por que não há duvidas: o que distingue os temas atuais é a interdependência.
Somos todos interdependentes. A interdependência, o compartilhamento, é o autêntico construtor desse novo ciclo da história que hoje ganha traços firmes no horizonte. Creio, a imprensa e os comunicadores da Amazônia deveriam sair, na frente, dar o exemplo. Construir rede de diálogo não apenas no Brasil, mas também no exterior.
Como a comunicação é a força unificadora dos tempos modernos e a interdependência os fios que estão a tecê-la, os resultados positivos logo se farão sentir uma vez que a região é um terreno aberto, e apropriado, para o investimento social, o capitalismo social.’
PEQUIM 08
Vera Gonçalves de Araújo
O melhor jornalista que não estava lá, 29/8
‘De Roma, Itália – Não sei como foi a cobertura das Olimpíadas no Brasil: aqui na Itália foi tudo bastante chato, uma mistura de ufanismo berlusconiano com elogios rasgados à organização chinesa, com pequenas pinceladas hipócritas que falavam do Tibete e dos direitos humanos. Como sempre, vimos, torcemos e vibramos com os esportes mais desconhecidos, com o áudio da TV bem baixo para não estragar tudo com o besteirol dos comentaristas.
Para saber como iam as coisas por trás do pano e debaixo do poncho chinês, a melhor fonte foram os blogues. O do Bob, é claro. E entre os italianos, comecei a seguir o blogue do Zoro, que contava casos engraçados como só numa Olimpíada na China podem acontecer.
Zoro – codinome do jornalista Diego Bianchi, velho conhecido dos internautas italianos – entrevistou juízes finlandeses de luta greco-romana, acompanhadores italianos da seleção venezuelana de softball, para não falar nos seus jantares – à base de porquinhos-da-índia com laranja e de carne de cachorro, que davam sempre em dores de barriga pequinesas.
O penúltimo post, então, foi uma delícia, porque ele ‘revelou’ – durante um jantar clandestino com um ex-dirigente político maoísta – todos os podres de Beijing 2008: piscinas construídas com materiais que se encolhiam em contato com a água, pistas de atletismo que estimulavam os pés dos atletas, doping a base de inhame (substância que os chineses estudaram cientificamente, criando a ‘boltulina’), complicadas negociatas da diplomacia mundial para repartir as medalhas entre as grandes potências, etc.
Devo dizer que comecei a desconfiar durante a leitura desse penúltimo post, porque mesmo conhecendo a capacidade de gozação do Zoro, ele exagerou. No final do texto, revelava que o jantar foi só um trote pregado pelo seu intérprete chinês, com a cumplicidade do avô, que fingiu ser um ex-dirigente maoísta só pelo gosto da pegadinha. Enquanto explicava o trote, Zoro disse que o intérprete quis festejar assim ‘o melhor jornalista que não estava lá’. Só lendo essa frase entendi que tudo fôra uma imensa gozação.
Porque Zoro nunca esteve na China. Escreveu suas correspondências durante as férias na praia de Cupra Marittima, com a mulher e a filha. Preparou suas matérias com notícias encontradas na internet, com a ajuda da Wikipedia e de alguns cúmplices – o cunhado médico, por exemplo. E lendo as correspondências – verdadeiras – dos grandes nomes do jornalismo italiano. O resultado é que as suas Olimpíadas foram muito mais divertidas e reais do que as da imprensa escrita, falada e berrada dos jornais e da TV na Itália.
Não quero dizer que os jornalistas são inúteis. Não é essa a moral da história das Olimpíadas de Zoro. Mas que tem muita gente inútil no jornalismo, disso não tenho dúvidas.
LINKS
O blogue ‘La Z di Zoro’: http://zoro.blog.excite.it’
ASTERISCO
A Bahia tem um jeito, 27/8
‘Imagine um jornal com as seguintes características:
– Chapa-branca;
– Feio, mal desenhado;
– Sem tradição em reportagens;
– Textos e fotos ruins;
– Redação desmotivada;
– Sem lideranças;
– E o pior: sem credibilidade.
Tamanho leque de predicados negativos só poderia significar 30 anos de pouco sucesso e uma avenida aberta para a concorrência. Até que no final do ano passado a diretoria da Rede Bahia resolveu que era preciso tomar uma decisão e fechar as torneiras de onde todos os anos jorravam para a sarjeta preciosos lucros acumulados com a TV Bahia: fechar o jornal Correio da Bahia ou relançá-lo.
Nesta quarta-feira, dia 27 de agosto de 2008, chegou às bancas o novo Correio*, o jornal mais moderno do Brasil. Dinamitou-se a velha estrutura viciada e ineficiente, implodiu-se a lógica das editorias tradicionais, redefiniu-se tudo a partir dos interesses do leitor. O resultado é um jornal ágil, leve, compacto, full-color, algo como o Brasil ainda não conheceu. E para quem ficou curioso basta entrar no site www.correio24horas.com.br para descobrir essas surpresas.
Muito se discute sobre o futuro dos jornais. Gasta-se horas e horas em congressos, escreve-se sobre as utopias, sobre o fim da mídia impressa, etc e tal. Mas a solução está em preciosidades como o jornal The New York Times: basta fazer jornalismo de qualidade.
A velocidade da informação faz com que as notícias cheguem ao público de várias formas mais rápidas que o jornal. Internet, TV, rádio, tudo funciona em tempo real. Jornal não, esse respeita um ciclo de 24 horas. E para chegar às mãos do leitor pelo menos seis horas depois do seu fechamento. Ou seja, o jornal chega cansado, velho. Portanto precisa trazer assuntos vibrantes, surpreendentes.
Para chegar às bancas e ainda cobrar por um exemplar é preciso oferecer algo novo, algo que valha a pena. Os jornais estão se reinventando. Essa reinvenção deve ser mais que um simples redesenho, um ajuste cosmético. Jornais como o Correio* são surpreendentes. Provocam, emocionam, fazem pensar.
O veredito será entre os leitores. Na Bahia se diz que ‘baiano não lê jornal’. A frase precisa ser atualizada. Baiano não lê jornal ruim. Mas o baiano lê sim. E escreve. João Ubaldo e Caetano Veloso que o digam.
A Bahia tem um jeito. E tem jornal de qualidade, para que se redescubra o prazer de ler jornal.’
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