Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Trocadilhos e metáforas a caminho do pódio

Mal começou o Pan-Americano 2007 e já podemos ver que a transmissão ou cobertura do evento, vez por outra pisa na bola – com o perdão do trocadilho.

A propósito, é justamente o trocadilho um dos fortes candidatos à estrela do jornalismo nesse Pan, dando continuidade a uma tendência que já vem de outras Copas do Mundo, Olimpíadas e congêneres.

E, nesta modalidade, ninguém deverá conseguir tomar a medalha de ouro do repórter Régis Rösing, da TV Globo. Há muito, Rösing abdicou do texto jornalístico em suas matérias, preferindo sempre criar situações que favoreçam a exibição de seu duvidoso talento para o humor e a poesia – com o perdão, agora, dos verdadeiros humoristas e poetas.

Em suas reportagens, cuidadosamente editadas em uma obsessiva busca por imagens que lhe permitam explorar o duplo sentido de palavras ou expressões, a informação tornou-se um componente supérfluo. Não há dúvida que seu texto é todo costurado em função das imagens captadas do fato, e selecionadas de modo a permitir alguma articulação dialógica entre o que se vê e o que se fala (ou se ouve, do ponto de vista do espectador), sempre com o seu desejo de fazer rir se sobrepondo ao objetivo de informar. Deve ser por isso que suas entradas ao vivo são mais raras (afinal, é difícil fazer humor ao vivo, poucos têm talento para tal). E, quando entra ao vivo, Rösing faz questão de estampar aquele sorriso-padrão de quem está se achando engraçado, mas, na verdade, não passa de um engraçadinho.

Não que humor e jornalismo esportivo na tevê sejam incompatíveis, mas é que a equipe do Rockgol da MTV já está completa. Também o pessoal do Casseta & Planeta e do Pânico na TV, em suas ocasionais incursões pelo universo do esporte, revelam competência bem maior. Em suma, de uma forma ou de outra, o Repórter Vesgo consegue ser mais repórter, que o Régis Rösing, humorista.

Metáforas e premonições

Com a mesma determinação com que busca o trocadilho, Rösing não perde ainda a oportunidade de criar uma metáfora, exercitando também sua pretensa veia poética. Mais uma vez, o resultado passa longe de um Armando Nogueira – só pra citar um dos grandes mestres desse ofício. E não chega aos pés nem de um Pedro Bial, que sempre resolve retornar à poesia, quando dos grandes eventos esportivos.

O grande valor de Rösing é que ele, como brasileiro que é, não desiste nunca. Mesmo sem obter o almejado sucesso nas carreiras de comediante e de poeta, Rösing passou a se dedicar com afinco uma nova carreira: a de vidente.

Em toda reportagem sua sobre qualquer competição esportiva, é inevitável que ele grave um stand up ou passagem diante de um lance ou jogada que esteja acontecendo naquele justo momento, ao fundo, geralmente descrevendo o próprio lance ou antecipando o resultado final da contenda. Não há nenhum mistério nesse pseudo-exercício adivinhatório: ele grava várias tentativas ao longo de uma partida ou competição e aproveita apenas a que der certo. Ele deve pensar, com certeza, que o espectador é idiota e acredita piamente em seus infalíveis ‘poderes premonitórios’. Não bastasse termos que assistir a essa recorrente patacoada, o diabo é que a coisa prospera: outros repórteres já estão adotando também o modelito, Brasil afora, em suas coberturas de partidas de futebol.

Nem tudo está perdido, todavia. A Globo ao menos trouxe de volta da Inglaterra o excelente Marcos Uchôa. Dono de um texto claro, informativo e completo Uchôa, quando se mete a fazer piada, não se serve da notícia pra fazê-lo; ao contrário, usa do humor para ilustrar melhor ou enriquecer a informação.

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Jornalista e escritor, de Belo Horizonte