A partir da polêmica relacionada ao filme Turistas, que mostra jovens dos EUA passando apuros no Rio de Janeiro, a presidente da Embratur, Jeanini Pires, afirmou que a autarquia iria aferir a repercussão do longa na mídia estrangeira, buscando promover editoriais e reportagens positivas.
A preocupação com a imagem do país está diretamente relacionada aos recursos que os turistas trazem ao Brasil. Segundo dados oficiais, até outubro de 2006, mesmo com a redução do número de vôos relacionada à crise da Varig, os viajantes estrangeiros deixaram 3,54 bilhões de dólares no país, cifra 12,5% maior que o registrado nos dez primeiros meses de 2005.
Num mundo em que as informações circulam com cada vez mais velocidade, talvez valha a pena às organizações de vigilância da mídia brasileira, como as integrantes da Rede Nacional de Observatórios da Imprensa (Renoi), pegar carona nas palavras de Jeanini Pires e acompanhar a imagem do Brasil e, por que não, dos brasileiros nas instituições de comunicação do exterior.
O Brasil de Ronaldinhos
Na Espanha, por exemplo, os futebolistas são a principal referência e produto de divulgação tupiniquim. O ídolo Ronaldinho Gaúcho chega a disputar, em condições de igualdade, o título de desportista mais admirado com o endógeno automobilista Fernando Alonso.
Para além do esporte, o Brasil também está presente em reportagens e entrevistas com personalidades da nossa vida cultural.
No prestigiado jornal de referência El País, de 8 de novembro a 8 de dezembro de 2006, foram publicadas 123 referências relacionadas ao Brasil, com temas tão diversificados como os novos rumos do governo Lula da Silva, as divergências e convergências com Hugo Chávez, o sucesso dos shows de Chico Buarque em Lisboa e Porto, o quinto aniversário do relatório da Goldman Sachs que cunhou a expressão BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) e a crise do controle aéreo no país.
Também salta aos olhos a publicação no período da entrevista que o escritor e comentarista audiovisual Arnaldo Jabor deu ao jornal.
Na edição de 24 de novembro, um pouco do estereótipo carioca na apresentação do escritor feita pelo jornalista Juan Cruz:
‘Tiene 66 años, nació en Río, y se le nota que nació en Río. Risueño, exuberante, parece el compañero ideal para una temporada de risas y de reflexiones al atardecer en una playa, como aquellas de las que hablaba su compatriota Vinicius de Moraes’.
A reportagem tinha como gancho a publicação na Espanha de Amor es prosa, sexo es poesia pela Aguilar, uma das editoras do Grupo Prisa, proprietário do El Pais e, como muitos outros grupos empresariais espanhóis, com cada vez mais investimentos na América Latina.
Estudar o olhar estrangeiro
Uma pista para análises do conteúdo veiculado pela imprensa internacional pode ser dada por Olhar estrangeiro, documentário de Lúcia Murat, recém-estreado nas salas de cinema e baseado no livro O Brasil dos Gringos, Imagem e Cinema, de Tunico Amâncio.
Em 1996, Murat havia dirigido Doces Poderes com presença de Marisa Orth e Antônio Fagundes, um filme sobre os bastidores da relação entre mídia e poder em Brasília, essencial para os estudiosos das influências ente jornalismo e política.
Para fazer Olhares Estrangeiros, a diretora colheu depoimentos sobre o Brasil de cineastas e atores em festivais no país e no exterior. Além disso, utilizou trechos de filmes como Feitiço no Rio e Amazônia em Chamas.
Assistir ao documentário pode demonstrar que muitos dos equívocos do filme Turistas (um personagem falando espanhol e o Rio de Janeiro ao lado de uma grande selva) definem o estereótipo nacional faz tempo. O roteiro do filme também pode servir de guia para mapear o trabalho dos correspondentes no Brasil ou dos ‘brasilianistas’ nos seus países de origem.
Valeria a pena estudar o olhar estrangeiro lançado sobre a realidade nacional cotidianamente pela mídia estrangeira, traçando comparativos e analisando estereótipos comuns. As pesquisas poderiam buscar responder questões como quais são os critérios de noticiabilidade que a imprensa estrangeira usa para definir o quê e quem é notícia no Brasil?
Os estudos também poderiam responder perguntas como: o que se publica sobre o Brasil? Quem fala em nome do país? Como os conteúdos e os entrevistados são apresentados? Qual o conteúdo produzido? Em que as reportagens são similares ao publicado na mídia brasileira?
Estas investigações poderiam ser uma maneira contínua de colaborar com a prevenção de outras produções jornalísticas ou audiovisuais equivocadas, focadas apenas nos estereótipos do ‘país do futebol e do Carnaval’.
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Jornalista, doutorando em Comunicação na UnB