Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

TV digital chega ao Brasil com críticas na bagagem

Leia abaixo a seleção de quarta-feira para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Quarta-feira, 28 de novembro de 2007


TV DIGITAL
Camila Rodrigues


Bonitinha…cara, burra e capenga


‘Finalmente a TV digital chega ao Brasil. As transmissões oficiais das emissoras abertas começam na noite do próximo domingo, apenas na Grande São Paulo. A promessa é de imagens melhores que as da analógica: o sinal pega ou não pega, sem o meio-termo de chuviscos e fantasmas.


Segundo normas do Fórum do SBTVD (Sistema Brasileiro de TV Digital), todas as emissoras abertas oferecerão sua programação, na íntegra, em formato digital a partir do próximo dia 2.


A maior parte dos programas será exibida em SD, que significa definição padrão, melhor que a atual, mas inferior à alta definição (HD ou full HD).


O formato HD é melhor que o de DVD, e é possível perceber bastante diferença em relação ao formato analógico até em televisões de tubo. O full HD só poderá ser assistido em TVs de alta resolução, que custam mais de R$ 3.000.


Para usufruir desse benefício, entretanto, será preciso ter uma antena UHF e adquirir um conversor, que custará entre R$ 499 e R$ 1.099; o governo esperava que eles fossem oferecidos por cerca de R$ 250.


Grande parte dos assinantes de TV paga vai precisar de duas caixinhas: a usada atualmente e o conversor para a TV digital aberta. Até agora, só a Net tem conversor híbrido.


Vantagens alardeadas da TV digital também não estarão acessíveis por enquanto. A escolha entre diversos programas simultâneos em um mesmo canal ainda não é viável, e a interatividade ainda está longe de se tornar realidade.


Como o sistema Ginga, responsável por essa funcionalidade, está ainda em fase de testes, é bem provável que o conversor adquirido hoje fique obsoleto em apenas um ano, quando o software que tirará a burrice da caixinha deve ficar pronto.


As emissoras dizem que estão se preparando para oferecer programas interativos, mas há ainda outra questão a solucionar: não foi definido qual será o canal por onde o telespectador mandará suas respostas -se a rede telefônica comum ou a banda larga.


É claro que essa tecnologia vai amadurecer; afinal, está apenas começando o que deve ser a principal mudança da televisão desde o lançamento, no Brasil, dos aparelhos coloridos na década de 1970. Por isso, se você ainda não quiser ou puder se adaptar, pode ficar tranqüilo: o sinal analógico estará disponível até julho de 2016.’


 


Novelas, futebol e telejornal serão exibidos em alta definição


‘Novelas de algumas emissoras abertas serão transmitidas em HD (alta definição).


A Rede Globo disponibilizará a novela ‘Duas Caras’; a Bandeirantes, a ‘Dance Dance Dance’; a Rede TV, a série ‘Donas de Casa Desesperadas’; e a MTV, a série ‘Casal Neura’.


Ainda estarão em alta definição os jogos de futebol da Rede Globo, os programas esportivos da TV Gazeta e o ‘Jornal da Band’.


‘A partir de janeiro, estaremos com toda a programação das 18h à 1h em alta definição’, anuncia Frederico Nogueira, diretor geral da TV Bandeirantes.


Silvio Alimari, superintendente da Gazeta, é mais otimista: ‘A gente espera que, até a metade do ano que vem, toda a programação esteja sendo transmitida em alta resolução’.


A Globo e a Rede Record confirmaram a exibição de filmes em alta definição, e a Gazeta transmitirá o programa do cantor Ronnie Von no mesmo formato.


O SBT e a TV Cultura não informaram se disponibilizarão esse tipo de conteúdo.


O número dos canais digitais muda, mas o consumidor não precisa se preocupar. Consta na especificação do Fórum SBTVD que o conversor deve entender o consumidor e redirecionar o canal VHF para o UHF; por exemplo, ao apertar o 5 em São Paulo, o conversor tem de redirecionar para o 18.


Além disso, em regiões em que o sinal é fraco, ele captará o sinal que estiver disponível, ou seja, se o digital não alcançar a antena, ele redirecionará para o analógico.


Investimentos


As emissoras tiveram de realizar mudanças para o início das transmissões digitais. Além de passarem a transmitir também em UHF, foi necessário realizar mudar a maneira de as emissoras produzirem e filmarem seus programas.


Nogueira, da Bandeirantes, afirma que a emissora está se capacitando para interatividade e que, só neste ano, foram investidos R$ 45 milhões em transmissão e geração de programas em alta definição.


Carlos Fini, gerente de tecnologia da TV Globo, informou por e-mail que a emissora está investindo em aplicações interativas.


A TV Cultura (Fundação Padre Anchieta) investiu US$ 5,5 milhões em equipamentos de gravação, captação e exibição de programas em SD e em HD e R$ 3 milhões no transmissor digital.


Os investimentos da TV Gazeta totalizaram US$ 20 milhões, e os da Rede Record, R$ 30 milhões. As outras emissoras não divulgaram os valores investidos.’


 


TVs com conversores chegam às lojas


‘Muitos dos consumidores que compraram televisores de LCD e plasma desde a Copa do Mundo, no ano passado, acreditaram que elas estariam pronta para a TV digital.


Segundo a Eletros (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos), foram vendidas 350 mil aparelhos de LCD e de plasma em 2006. No primeiro semestre deste ano, o mercado de televisores de LCD cresceu 271% em relação ao ano anterior, mostra estudo do IT Data.


Os primeiros televisores que podem ser considerados prontos para TV digital foram anunciados na semana passada pela Philips e pela Samsung e chegam às lojas nesta semana, ao custo de até R$ 15 mil.


A LG também disse que irá fornecer esse tipo de televisor no primeiro semestre do ano que vem e custará entre R$ 8.999 e R$ 11.499.


Os modelos de tela fina lançados antes disso oferecem melhor definição do que a das TVs analógicas, mas nem sempre são de alta resolução e, provavelmente, não têm conversor digital embutido -assim, usuários terão de comprar um conversor à parte.


Para entender melhor: a resolução é mais alta quanto maior é o número de linhas.


As TVs de tubo e de tela fina com resolução padrão exibem 480 linhas horizontais; as de CRT, de LCD e de plasma de alta definição apresentam pelo menos 720 linhas.


Mas para conseguir a melhor qualidade na exibição dos programas transmitidos digitalmente pela TV brasileira, será necessário que ela seja um modelo de 1.080 linhas, chamada de 1.080i.


Há ainda as TVs Full HD ou de 1.080p (veja box abaixo), mas essa configuração não fará muita diferença a não ser que tenha um tocador de Blu-Ray ou HD DVD. Isso porque as emissoras transmitirão os programas de alta definição em 1.080i. Estão disponíveis modelos da LG, Sony, Panasonic, Philips, Samsung e Toshiba (ver galeria a seguir).


A diferença entre 1.080i e 1.080p, tecnicamente, é que a imagem da primeira é desenhada por linhas interlaçadas e a segunda, por linhas progressivas. A olho nu, é difícil notar qualquer diferença.


Os televisores com conversor embutido apresentados até agora custam, no mínimo, R$ 7.999. É um investimento crítico já que, assim como os set-top box, eles ainda não vêm instalados nem são compatíveis com o sistema Ginga, que permitirá a tão esperada interatividade.


Além disso, os fabricantes informam que, quando o sistema for lançado comercialmente (ver página F4), não será possível instalá-lo em equipamentos de versões anteriores.’


 


Como funciona?


‘O QUE É TV DIGITAL?


É uma nova tecnologia de transmissão que oferece melhor qualidade de imagem, permite acessar TV por dispositivos portáteis, como celular ou notebook, e, no futuro, interagir com os programas


O QUE MUDA EM 2 DE DEZEMBRO?


Inicialmente, somente a imagem e o som, ambos equivalentes aos de um DVD. Caso o sinal esteja fraco, a imagem ou não vai aparecer ou ficará travada


O QUE VEM A SER ESSA INTERATIVIDADE?


O consumidor poderá, no futuro, acessar um guia de programação ou a tabela do Campeonato Brasileiro e participar de enquetes. Fala-se sobre a venda de produtos pela TV, mas os recursos ainda não são realidade


O QUE É PRECISO PARA TER A TV DIGITAL?


Conversor (conhecido também como set-top box ou caixinha) e antena UHF


CONSIGO ASSISTIR PELA TV DE TUBO?


Sim, desde que tenha um conversor. Se ele não for de alta resolução, a imagem será como a de um DVD (que é melhor do que a analógica)


A TV DE PLASMA E LCD QUE EU COMPREI JÁ ESTÁ PRONTA PARA USAR?


Provavelmente não. Somente nesta semana começam a chegar ao mercado os primeiros televisores com conversores embutidos, que custam a partir de R$ 7.999


TODA TV DIGITAL É DE ALTA DEFINIÇÃO?


Não. A transmissão poderá ser digital com definição-padrão, que é semelhante à de um DVD


QUANTAS TVS EU POSSO LIGAR NO CONVERSOR?


Cada conversor suporta apenas um televisor


EU POSSO TRAZER CONVERSOR DO EXTERIOR?


Não, porque a tecnologia utilizada pelas redes de TV aberta é originalmente brasileira


EU SOU ASSINANTE DE TV PAGA. TEREI DE COMPRAR O CONVERSOR?


Depende. A NET afirma que suas caixinhas são compatíveis com o sinal de TV aberta; a Sky e a TVA devem lançar seus produtos compatíveis no ano que vem


A TV QUE ASSINO É DIGITAL. NÃO É A MESMA COISA?


As TVs por assinatura hoje transmitem digitalmente a programação das emissoras, mas não em alta definição


NÃO SOU DE SÃO PAULO. COMO EU SEI QUANDO A TV VAI CHEGAR ONDE MORO?


O Fórum do SBTVD (Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre) tem um cronograma em www.forumsbtvd.org.br/cronograma.php


EU NÃO QUERO GASTAR AGORA. ATÉ QUANDO TEREMOS A TV ANALÓGICA?


Até julho de 2016′


 


Interatividade deixa conversor mais caro


‘Os conversores para TV digital, que custarão até R$ 1.099, poderão ficar ainda mais caros quando forem compatíveis com o sistema Ginga, que será um dos responsáveis pela interatividade na TV digital. A opinião é do diretor de tecnologia da Philips, Walter Duran. ‘Para rodar o programa, tem que aumentar a capacidade de processamento e memória’, afirma.


O executivo conta também que o preço tende a cair quando os produtos começarem a ser produzidos no Brasil. O primeiro lote da Philips foi importado da China.


O Ginga é o sistema que permitirá escolher por qual câmera assistir a um jogo de futebol, acessar informações sobre notícias e comprar produtos que apareçam em novelas.


Para cada televisão, será necessário um conversor, que está mais caro do que o inicialmente projetado. O governo estimava que cada unidade custaria cerca de R$ 250. Mas hoje o modelo mais barato, da Positivo, custa R$ 499 e serve apenas para TVs de resolução padrão. Para TVs de resolução maior, a mesma empresa está oferecendo um equipamento de R$ 699.


Nem na Santa Ifigênia, rua de São Paulo dedicada a lojas de eletroeletrônicos, o cenário é diferente: o modelo encontrado pela reportagem, da TeleSystem, custa R$ 950.


As empresas Gradiente, Philips, Semp Toshiba e Sony também anunciaram seus conversores, mas nenhum deles menor do que esse preço (ver abaixo); a CCE afirmou que irá lançar um modelo para TVs de 480 linhas no primeiro trimestre do ano que vem por R$ 499.


No site da Amazon, os conversores para TV digital custam cerca de US$ 100, mas não adianta comprar fora porque o padrão brasileiro não é compatível com outros do mundo.


Segmentação


Serão transmitidos três tipos de sinais digitais: em alta definição, em definição-padrão e portátil, que oferece uma imagem menor.


Inicialmente, haverá somente três tipos de conversor: para TVs de alta definição (a partir de 720 linhas), para TVs analógicas (480 linhas) e para dispositivos portáteis. Representantes da indústria afirmam que, com a interatividade, haverá ainda mais opções de aparelhos.’


 


Aparelho para uso com computador custa menos


‘A transmissão de sinal portátil, que é para computadores e dispositivos móveis, em baixa definição e conhecida como OneSeg, deverá ser o grande mercado da TV digital inicialmente, afirma Marcelo Gomes, gerente de engenharia da Comsat. O motivo é o preço mais baixo dos conversores.


A empresa irá lançar, em 17 de dezembro, um conversor desse tipo que custará R$ 350.


A TecToy é outra empresa que lançou apenas conversores para computadores. O dispositivo parece uma pendrive e custa R$ 369.


A Philips e a Gradiente estão oferecendo equipamentos semelhantes por R$ 370 e R$ 399, respectivamente. Esse tipo de dispositivo não exigirá nenhum tipo de antena, como é o caso dos conversores.


O sinal também poderá ser captado por celulares, mas nenhum fabricante anunciou aparelho com decodificador embutido. A previsão é que eles comecem a ser lançados no primeiro semestre de 2008.


No Japão, os celulares que captam TV digital ultrapassaram 10 milhões de unidades em julho deste ano, informou a Associação Japonesa de Eletrônicos e TI.’


 


Ginga está em desenvolvimento há 17 anos e ainda não é comerciável


‘O sistema Ginga, programa que servirá como um sistema operacional do conversor, está sendo desenvolvido há 17 anos por meio de uma parceria entre o Laboratório de Aplicações de Vídeo Digital, da UFPB (Universidade Federal da Paraíba), e o Laboratório Telemídia, da PUC-Rio, informou o professor Luis Fernando Gomes Soares, responsável pelo Telemídia.


Ele diz que o software está pronto e que alguns fabricantes já o estão testando. ‘Os primeiros aparelhos com Ginga devem chegar no início do ano que vem’, prevê o acadêmico.


A expectativa de Walter Duran, diretor de tecnologia da Philips, é mais pessimista: ele disse, em uma reunião com a imprensa, que o Ginga estará maduro para os fabricantes no final de 2008 e que, por enquanto, não é possível construir o aparelho que o suporte sem conhecer suas especificações finais.


‘Se um computador trava, as pessoas costumam entender, porque é esperado. Mas uma TV não pode travar, senão a pessoa nunca mais compra nada daquela marca. A rejeição é muito maior em eletrônicos de áudio e vídeo’, diz Duran.


O Ginga é o único programa autorizado pelo Fórum do SBTVD (Sistema Brasileiro de TV Digital), ou seja, os fabricantes não podem instalar outra tecnologia para oferecer interatividade.


Criado com recursos das duas universidades, do Governo Federal e de empresas de eletrônicos, de radiodifusão e de telecomunicações, o sistema e as pesquisas para definir o padrão teriam custado menos de R$ 150 milhões, informou Carlos Fructuoso, membro do conselho deliberativo do Fórum da TV Digital.’


 


Folha de S. Paulo


Loja ainda não entrega conversor para TV digital


‘Apesar de o sinal da TV digital chegar a São Paulo no domingo, os consumidores não terão muito tempo para instalar os conversores. As lojas estão vendendo o produto, mas a entrega não é imediata.


As fabricantes de eletroeletrônicos anunciaram que o equipamento estaria nas grandes redes de lojas a partir do início desta semana, porém, por enquanto, nenhuma delas recebeu o produto.


Na Casas Bahia, os conversores da Positivo estão em exibição, mas só poderão ser levados para casa no final da semana. ‘Quero comprar, mas, agora, só depois de as transmissões começarem’, disse o técnico em informática, Lucas Viana, 38 anos, em visita à Super Casas Bahia, em São Paulo.


As TVs com o aparelho embutido da Samsung e da LG também estão na loja, mas não há previsão de quando começam as vendas.


Na rede Fnac, as TVs já podem ser encomendadas, mas o prazo de entrega é de 15 dias. A previsão do Wal-Mart é que a venda dos conversores comece amanhã. O Carrefour pretende comercializar no sábado.


A Positivo afirmou que os dois modelos de conversores indicados para as TVs de tubo e para as de LCD e de plasma foram entregues para a Casas Bahia no dia 22. Segundo a empresa, o atraso poderia estar relacionado à distribuição do produto entre as lojas.


Outras redes que ainda deverão receber o conversor nesta semana são Wal-Mart e Lojas Americanas. Esta última, no entanto, não confirmou se terá mesmo os aparelhos à venda.


A fabricante LG disse que seus televisores também deverão estar nas lojas até o final desta semana.


Segundo a Samsung, os televisores com o conversor embutido serão entregues às lojas só na próxima semana, após o início das transmissões da TV digital.


Hélio Costa


Em discurso na noite de ontem a uma platéia de empresários do setor de radiodifusão, o ministro das Comunicações, Hélio Costa, afirmou que o governo pretende conceder benefícios às empresas para que o conversor da TV digital chegue ao mercado ao preço de R$ 200.


‘Para que nós possamos ter a popularização da TV digital, nós temos que ter ‘a caixinha’ [conversor] a preços populares. Somente vamos conseguir isso se nós dermos para essa caixa conversora os mesmos benefícios que foram dados para o ‘computador popular.’’ E acrescentou: ‘Nossa caixa conversora da TV digital pode, sim, chegar ao consumidor a um preço de R$ 200, e nós vamos trabalhar nesse sentido’.


Atualmente, os preços dos conversores anunciados pelas fabricantes do aparelho variam entre R$ 499 e R$ 1.099.


O ministro Hélio Costa disse que falava em nome do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estava presente ao jantar, oferecido em comemoração aos 45 anos da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão).’


 


Daniela Arrais


Usuário não deve investir em nova TV


‘A grande mudança em como o telespectador assiste à televisão não deve ser motivo para alto investimento em troca ou melhoria de aparelhos. Especialistas ouvidos pela Folha recomendam ao consumidor deixar a ansiedade de lado e esperar pelos avanços da TV digital.


‘O consumidor não deve trocar imediatamente seu aparelho de TV. Ele deve esperar até que realmente toda a cidade de São Paulo seja coberta, os testes tenham sido feitos e os equipamentos tenham chegado ao mercado, para que tenha opções de escolha’, afirma Alexandre Hashimoto, consultor de telecomunicações e coordenador do curso de sistemas da informação das Faculdades Integradas Rio Branco.


Hashimoto ressalta que se o telespectador fizer a mudança agora vai pagar um preço alto em troca de poucos recursos -terá que comprar conversor (set-top box), antena UHF e já possuir TV de LCD ou plasma. ‘Ele só conseguirá a imagem digital de melhor qualidade, mas com poucos canais e serviços disponíveis.’


‘Para realmente ter a TV com qualidade digital, o telespectador tem que comprar um aparelho que custa quase R$ 10 mil. A experiência digital vai ser muito cara’, afirma Silvio Meira, professor de engenharia de software e cientista-chefe do C.E.S.A.R (Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife). ‘Há um problema adicional: você não tem, a partir do começo, uma quantidade muito grande de programação transmitida.’


Para Meira, a chegada da TV digital ao Brasil é a batalha da década, porque tem tudo para funcionar como um dos motores de convergência entre mídias. ‘Você vê cada vez menos televisão, porque [o que você quer ver] está no YouTube. Existe uma visão de mundo que é o sistema de broadcast [transmissão] que escolhe o que eu quero ver. Mas eu quero controlar o que eu quero ver. Com a TV digital, a noção de que a TV sincroniza as pessoas vai ficar mais rala.’


O grande desafio a ser enfrentado será o de fazer a TV digital funcionar como a internet, segundo Meira. ‘Se temos TV na tela da internet, por que não o contrário? A interatividade passa a ser interessante quando eu estou vendo um programa, não entendo alguma coisa e vou procurar na Wikipédia sobre o que ele está falando’, diz, ressaltando que ainda não há no mundo um sistema de interatividade eficiente.


Para Hashimoto, a chegada do sinal digital aberto é um marco no sistema de comunicação brasileiro. ‘A partir de 2008, o telespectador passa a ter liberdade de escolha, ainda pouca. Mas até 2016 vamos ter outros recursos, sairemos da condição de reféns das emissoras.’’


 


TV BRASIL
Melchíades Filho


PTV


‘BRASÍLIA – A oposição não vai perder a oportunidade de carimbar a nova rede de televisão como uma emissora a serviço do PT. Antes de tudo, porque as ocasiões para fazer barulho têm rareado -o valerioduto mineiro pôs em xeque o discurso da ética, por exemplo. Mas, principalmente, porque a condução do projeto não tem sido mesmo marcada pelo ‘espírito público’ de que tanto falam seus defensores.


A idéia da TV Brasil, com estréia marcada para domingo, não surgiu de compromissos firmados em campanha nem de antigas convicções. Nasceu de um ataque prosaico de irritação do presidente Lula com a cobertura na grande imprensa do escândalo dos ‘aloprados’ do PT na reta final do primeiro turno.


Tanto que, de tão abrupta, a decisão acabou encaminhada na forma de (mais uma…) medida provisória, sem estender aos parlamentares o debate para qual o governo havia antes convidado somente especialistas e puxa-sacos de plantão.


Pior 1: a relatoria do texto foi entregue a um deputado petista. Pior 2: na hora em que outros partidos esboçavam colaboração, por meio de emendas, o Planalto travou a tramitação do decreto -e de todo o trabalho legislativo- até que seja selado o destino da CPMF.


Enquanto isso não acontece, a medida provisória permitiu à Presidência nomear o conselho que deverá zelar pela independência da TV. Não por acaso, a montagem obedeceu ao conceito Ipea de pluralismo: plural só no número de contratados.


Por fim, há o modelo de negócio. Ainda que o governo prometa repasses automáticos, o fato é que a emissora ficará a reboque de verbas controladas pelo presidente (Orçamento e patrocínio de estatais).


Sem ouvir o Congresso, dar assento a não-alinhados e tornar mais evidente a fonte de recursos (taxar o assinante de canais a cabo, por exemplo), fica difícil sustentar essa TV como ‘produto e instrumento’ da construção democrática.’


 


MÔNICA VELOSO
Andreza Matais


‘Renan dizia que o dinheiro era dele’, afirma jornalista


‘Pivô do escândalo que tirou Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado, a jornalista Mônica Veloso lança hoje o livro ‘O Poder que Seduz’. Em 198 páginas, ela alfineta políticos, conta que é comum parlamentares receberem propina de lobistas e diz que ‘Renan não conseguiu provar que pagava a pensão [a ela] com recursos próprios’.


Mônica se tornou conhecida depois de revelada denúncia de que Renan teria tido despesas pessoais pagas pela empreiteira Mendes Júnior. Entre elas, uma pensão que dava a Mônica, com quem teve uma filha fora do casamento. Renan foi acusado de quebra de decoro, mas absolvido nesse processo.


Sobre a suspeita de que o dinheiro da pensão viria da empreiteira, Mônica nada esclarece. Afirma que depois de ter engravidado recebeu pensão de Renan ‘das mãos de Claudio Gontijo’, lobista da construtora, entre março de 2004 e novembro de 2005, ‘sempre em dinheiro vivo’, e que ‘Renan dizia que o dinheiro era dele’.


A jornalista afirma que políticos e ministros do Judiciário recebem propina de lobistas em troca de atender ao interesse de empresas e outras demandas, mas não diz nomes.


Entre os políticos citados, Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA), morto em julho, foi descrito como um ‘colecionador’ de veículos de comunicação. ‘Ele deixou um império que fatalmente elegerá muitos de seus herdeiros.’’


 


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


‘Abençoado por Deus’


‘O Brasil no ‘alto IDH’ e ‘pela primeira vez’ foi a manchete nos sites e telejornais, por todo lado, com esforços aqui e ali para relativizar -em especial com estudo da FGV sobre falta de esgoto. Já o Terra deu em manchete que o resultado seria melhor se a ONU evitasse o ‘erro metodológico’ de usar o ‘PIB velho’.


De todo modo, o anúncio mundial foi em Brasília, o etanol ganhou apoio formal da ONU contra as tarifas de EUA e Europa e Lula até assinou texto no próprio relatório. À noite, saiu a celebrar pelos telejornais de Record e Band, em entrevistas ao vivo, mas nada de Globo. No discurso público, do ‘JN’ à Folha Online, saudou o ‘momento tão especial’ do país, que pode se ‘dar ao luxo de dizer ‘somos abençoados por Deus’’.


No exterior, a repercussão focou quase unicamente o alerta da ONU de que o aquecimento global requer a ‘ajuda dos países ricos’ aos mais pobres, de bilhões.


OUTRA COISA


Do blog de Tutty Vasques, ‘Brasil no clube dos países de alto IDH não tem nada a ver com menina na cela com 20 homens no Pará’ ou ‘uma coisa não é outra coisa’. Também nada tem a ver com ‘morador de rua incendiado em São Paulo’, que a polícia antes deu por ‘acidente’ e depois por ‘ataque de rival’, ontem na Folha Online. Nem com outro ‘morador de rua morto a tiros’ em São Paulo.


‘UM COMEÇO’


‘New York Times’ e outros elogiaram Brasil ‘e Senegal’ em Annapolis, mas notando que ‘só importam cinco’: palestinos, israelenses, sírios, sauditas e os americanos.


A BBC Brasil entrevistou o chanceler Celso Amorim, que deu como ‘primeiro passo’ na cena global. ‘Com o tempo, a gente vai ter mais influência.’


À BEIRA


Enquanto isso, em meio aos apelos de países como o Chile e a Colômbia pela moderação do Brasil, a Globo deu Bolívia e até Venezuela como ‘países à beira de crise institucional’.


NOVO ‘PLAYER’


‘Jorra dinheiro no leilão’ de petróleo, anotou o blog de Lauro Jardim, e ‘o destaque é a PetroEike’, a empresa OGX. Também no exterior o ‘novo player local’ ganhou atenção.


Mas Bloomberg e o site de estratégica Stratfor focaram a invasão da agência pelo MST, contra esta e qualquer venda.


ÀS COMPRAS


O ‘braço de investimento’ de Abu Dhabi comprou parte do Citigroup, deram ‘FT’ e ‘WSJ’ de manchete. E não foi o primeiro caso de resgate de grupos financeiros de EUA e Europa por fundo soberano, segundo artigo. Antes, fundos da China e de Dubai entraram no Blackstone e no Och Ziff, eles também cambaleantes.


SOBERANO AQUI


E a Dow Jones noticiou que o fundo soberano brasileiro vai a campo até o fim do ano.


VAIVÉM NA PROTEÇÃO


O ‘FT’ deu que a União Européia vai cortar as tarifas sobre importação de cereais, inclusive do Brasil. É ‘para reduzir tensão’, baixar preço.


Mas a BBC já noticia que o ‘sindicato dos fazendeiros’ britânicos cobrou veto à carne do Brasil. E a Reuters noticia que ‘a maior organização de fazendeiros’ dos EUA atacou Brasil e Índia por resistirem a se abrir, na Rodada Doha.


GUERRILHA


Os conflitos em série nos subúrbios de Paris foram descritos como ‘guerrilha urbana’, com Molotov e ‘muita organização’, pelo ‘Le Monde’. O ‘Le Figaro’ destacou o uso de ‘armas de fogo contra a polícia’


PROTECIONISMO DA BOLA


O presidente da Fifa questionou no final de semana a presença de brasileiros em outras seleções, com eco por todo lado, do site da ‘Sports Ilustrated’ a coluna do ‘NYT’, ontem. E o ‘Telegraph’ cobriu palestra de Carlos Alberto Parreira em Londres, em reportagem sob o título ‘Fábrica de talentos do Brasil não está diminuindo’ e a Inglaterra deve ‘desenvolver mais jogadores’, como aqui.’


 


RANKING
Folha de S. Paulo


Jobs é o mais poderoso do mundo dos negócios, afirma ‘Fortune’


‘O presidente da Apple, Steve Jobs, é a pessoa mais poderosa do mundo dos negócios, segundo a ‘Fortune’. De acordo com a revista, ele comanda uma empresa ‘que é um mosquito em meio a elefantes’, mas consegue atrair a atenção de Hollywood, da indústria de telefonia celular e fonográfica, entre outras, graças a invenções como o iPod e o iPhone.


O segundo lugar na lista é de Rupert Murdoch, dono da NewsCorp e que recentemente adquiriu o ‘Wall Street Journal’. Bill Gates, o homem mais rico do mundo segundo a ‘Forbes’, aparece apenas em sétimo lugar na lista dos mais poderosos.


Gates está atrás, entre outros, de Eric Schmidt, Larry Page e Sergei Brin (do Google) e de Warren Buffett, com quem sempre rivaliza na lista de bilionários e que prometeu ceder a maior parte da sua fortuna para a instituição filantrópica de Gates.


O mexicano Carlos Slim, outro que disputa com Gates o posto de homem mais rico, foi considerado a 20ª pessoa mais poderosa do mundo dos negócios pela ‘Fortune’. John Chambers, o presidente da Cisco, empresa investigada no Brasil por suposto esquema de fraudes de importação, é o 11º. Os indianos Lakshmi Mittal, Indra Nooyi e Ratan Tata também estão entre os 25 mais poderosos.’


 


TELEVISÃO
Daniel Castro


Record veta campanha pró-droga em novela


‘A cúpula da Record vetou uma campanha favorável à descriminalização das drogas na novela ‘Caminhos do Coração’, seu maior sucesso atual.


Há duas semanas, foi ao ar uma cena em que um policial civil ‘do bem’ (André Segatti) debatia o assunto com uma moradora de favela (Regina Dourado). O policial argumentava a favor da liberação, pois entendia que é melhor gastar dinheiro público com saúde e educação do que com armas no combate ao tráfico. A moradora de favela era contra, mas a opinião do policial teve maior peso.


Outras duas cenas posteriores, que também tratavam da questão, acabaram nem sendo gravadas. A Folha apurou que o autor Tiago Santiago foi repreendido e lembrado de que o bispo Edir Macedo é contra a legalização de psicotrópicos.


Santiago apenas confirma o corte das cenas. Ele diz que é a favor da liberação das drogas e que ‘queria promover um debate’ na novela, exibindo argumentos favoráveis e contrários.


Segundo ele, a direção pediu para interromper a abordagem porque ‘Vidas Opostas’, antecessora de ‘Caminhos do Coração’, já fizera um debate sobre drogas. ‘Me prometeram total liberdade na minha próxima novela’, diz Santiago.


A Record, oficialmente, afirma que não houve censura e que a campanha foi interrompida em um ‘consenso entre autor, diretor-geral da novela e diretor de teledramaturgia’.


TROPA DE ELITE Será Geraldo Luís, e não mais mais Luciana Liviero, o apresentador do ‘Balanço Geral’, jornal local que a Record estréia em São Paulo segunda, às 12h. Ele faz sucesso em Limeira (SP) e se apresenta em seu site, ‘decorado’ com furos de balas, como ‘o repórter policial do Brasil’. Aparece de dedo em riste, com PMs ao fundo. Mas a Record diz que o jornal não será policial, e sim comunitário.


PITCHING O GNT definiu ontem as produções independentes que exibirá em 2008. São elas: ‘Um Mundo pra Chamar de Seu’ (um ‘Supernannny’ ecológico), ‘Pet.Doc’ (sobre animais de ‘família’), ‘Dilemas de Irene’ (com dicas para mulheres) e ‘Noiva do Cordeiro’, da Canal Imaginário (sobre uma comunidade só de mulheres em MG).


CAPACETE 1 Está fazendo sucesso o novo penteado de Fátima Bernardes, no ar desde desde segunda no ‘JN’: cabelos curtos, na altura da nuca, com pontinhas viradas para trás. Telespectadores congestionaram as caixas de e-mails da jornalista e da Globo.


CAPACETE 2 Fátima conta que buscava um novo visual, moderno, que não fosse um corte curtinho à la joãozinho. Ela fez a mudança com o cabeleireiro argentino Flavio Chiodelli, que atende em dois salões do Rio de Janeiro. A jornalista também fez reflexos em tom chocolate claro.


BARRIGA A audiência de ‘Malhação’, que antecipou para outubro a estréia da temporada 2008, continua ladeira abaixo. Na semana passada, deu 18,5 pontos.’


 


TROPA DE ELITE
Mônica Bergamo


Globo acusa Padilha de ‘lista de factóides e inverdades’


‘A declaração do diretor José Padilha, de ‘Tropa de Elite’, ao jornal ‘New York Times’, de que a Globo Filmes não se interessou pelo filme porque ele não tinha um ‘final feliz’, deixou a Globo perplexa -e irada. A coluna conversou com Carlos Eduardo Rodrigues, diretor-executivo da Globo Filmes:


FOLHA – Vocês rejeitaram ‘Tropa’ por falta de final feliz?


CARLOS EDUARDO RODRIGUES – Você acha possível ter final feliz no ‘Tropa de Elite’? Isso [declaração de José Padilha] faz parte da mesma lista de factóides de pirataria, inverdades e promoção inadequada do filme. São os três itens que você pode colocar.


FOLHA – Você acha que é mentira dos produtores que o filme foi pirateado?


CARLOS EDUARDO – Você acha que é mentira? Você tem dúvida? Final feliz… É uma declaração, repito, irresponsável, para criar bochicho para ver se o filme faz mais alguma coisa [em termos de bilheteria] agora no final, já que não fez os 5 milhões esperados que eles [Padilha e os produtores de ‘Tropa’] sempre falaram nos jornais. Vai ficar o décimo [no ranking de espectadores] da retomada. Os outros nove são nossos. Se você pegar o ranking da retomada, vai ver.


FOLHA – Vocês analisaram o filme?


CARLOS EDUARDO – A gente analisou o filme. E tomamos uma decisão conjunta, e unânime, de todos os que participaram da discussão, de não estarmos dentro do filme. Isso é normal. A gente analisa mais de cem projetos por ano.


FOLHA – E vocês queriam mudar o final?


CARLOS EDUARDO – Em todos os projetos que a gente participa, há uma troca entre os artistas, sugestões. A Globo Filmes não é uma agência de veiculação de mídia para promover filmes. A gente atua numa parceria. Agora, final feliz? Todas as cosias que foram sugeridas [para o diretor Padilha ] estão documentadas, nós temos todas as trocas de e-mails que aconteceram. Em nenhum momento tem uma coisa dessas.


FOLHA – E as sugestões não foram aceitas?


CARLOS EDUARDO – Essa coisa é muito da mentalidade de algumas pessoas: o Harvey Weinstein [criador da multinacional Miramax e co-produtor de ‘Tropa de Elite’] pode dar sugestões. Mas [os diretores] Daniel Filho e Guel Arraes não podem. Tem uma coisa de ser colonizado que a gente não quer ser mais. Mas algumas pessoas continuam querendo ser. Por que quando é um co-produtor americano, como o Weinstein, ou europeu, todo mundo respeita e quando é um parceiro local, brasileiro, que tem uma experiência muito grande no mercado nacional, ninguém respeita?


FOLHA – Vocês se arrependem de não ter feito o filme?


CARLOS EDUARDO – De jeito nenhum. Mas de jeito nenhum, graças a Deus. Ideologicamente, eu durmo muito tranquilo no meu travesseiro.


FOLHA – Como assim? Você acha que o filme é reacionário?


CARLOS EDUARDO – Eu durmo tranquilo. Pergunte a quem fez o filme o que eles acham.


FOLHA – O capitão Nascimento não é o seu herói?


CARLOS EDUARDO – De jeito nenhum. Não deve ser o seu também, né? Agora, o filme retrata a realidade. Tecnicamente, a direção de atores é excelente, o Wagner Moura é um escândalo. Como obra cinematográfica é impecável. Agora, só não faz sentido chegar numa altura dessas e ser indelicado dessa maneira. A declaração dele é infeliz, que queríamos final feliz, que não ousamos. Ele está atacando os próprios colegas. O filme não é da Globo Filmes. O filme é do [Hector] Babenco, do Fernando Meirelles, do Daniel Filho, do Cacá Diegues e de tantos outros. Quiseram criar um factóide para voltar para a mídia. Só que não vão fazer isso às custas da gente.


Frases


‘Você nunca impressiona a audiência dessa maneira. Nossa idéia é fazer filmes ásperos’.


JOSÉ PADILHA ao ‘New York Times’


‘É uma declaração irresponsável, para criar bochicho já que o filme não fez os 5 milhões esperados’.


‘Tem uma coisa de ser colonizado que a gente não quer ser mais. Mas algumas pessoas continuam querendo ser’.


‘Ele está atacando os próprios colegas.


O filme não é da Globo Filmes. O filme é do [cineasta Hector] Babenco, do Fernando Meirelles, do Daniel Filho, do Cacá Diegues e de tantos outros’.


‘Mas de jeito nenhum, graças a Deus. Ideologicamente, eu durmo muito tranquilo no meu travesseiro [afirmando que não se arrepende de não ter produzido o filme ‘Tropa de Elite’]’.


Carlos Eduardo Rodrigues, diretor da Globo Filmes’


 


POLÊMICA NA ARTE
Laura Vinci


A maior violência contra a arte é querer falar dela sem ela


‘A vontade de pôr em discussão a arte contemporânea, vista como uma espécie de aberração por alguns críticos, seguidos por alguns jornalistas, produziu uma curiosa aberração: defensores da arte falam da arte sem ver a arte, e sem nenhum pudor.


No caso, o meu trabalho ‘Ainda Viva’, que ficou exposto na galeria Nara Roesler durante 40 dias, foi criticado pelo jornalista Luciano Trigo em um artigo intitulado ‘É de fama e dinheiro que se trata a arte?’ (Ilustrada em 19/11).


O poeta e crítico Ferreira Gullar, já citado por Trigo, permitiu-se citar a mesma instalação respondendo a uma enquete sobre o tema do ‘feio’ na arte, no jornal ‘O Estado de São Paulo’ de 24 de novembro.


A única coisa que Gullar sabe sobre o trabalho é que nele existem ‘300 maçãs’ expostas ao apodrecimento, o que lhe pareceu suficiente para tecer considerações ácidas sobre a obra e o estado geral da arte.


Imagino então se ele soubesse que não são 300, mas 7.000 maçãs. Se ele visse que mesmo assim, numa dimensão de Ceasa, uma maçã é uma maçã que sempre lembrará Cézanne.


Que postas numa superfície de mármore, que tem a dignidade do altar, da lápide e da tela branca, elas estão ali falando da tradição da natureza-morta na pintura. Que elas apodrecem em conjunto sem perder a beleza e exalando um perfume embriagante. Talvez ele se lembrasse que ‘natureza-morta’ se diz em inglês ‘still life’, vida parada, ou ainda vida. Que isso é uma pergunta sobre o destino da arte, e não uma confusão da arte com o lixo. Talvez ele se lembrasse que é poeta. Que o problema que ele vê na instalação, sem vê-la, é justamente o que ela está problematizando.


Se ele olhasse mais adiante, veria ainda uma coluna de peças de vidro pendendo do teto, e chegando quase até o chão, sem chegar a tocá-lo. Independente do que ele achasse dela, veria que é difícil descrevê-la.


Essas peças estão intactas na linha dos tiros reais que marcam a parede dos fundos, convivendo com a violência real e virtual que está no ar, como uma questão aberta a quem participa da experiência de estar ali.


Talvez Ferreira Gullar se surpreendesse, talvez detestasse ainda mais a arte contemporânea como um todo. Esse não é o ponto. A maior violência contra a arte, seja qual for, é a de achar que se pode falar dela sem ela, fingindo que está falando dela. Ninguém tem o direito de declarar que não gosta do ‘Poema Sujo’, de Gullar, sem lê-lo, porque não gosta, por exemplo, de ‘arte suja’. E de autorizar jornalistas a achar que podem fazê-lo também.


Mas, e se Ferreira Gullar se entusiasmasse e, para surpresa geral, quisesse comprar o trabalho? Aí perceberia que ele é não é facilmente comprável, não por causa de um preço, mas porque não se insere com facilidade, pela sua natureza, no mercado do qual faz parte.


Ao contrário do que sugere o título do artigo publicado pela Folha.


LAURA VINCI é artista plástica’


 


Folha de S. Paulo


Polêmica começou em artigo


‘Na Ilustrada do dia 19, o jornalista Luciano Trigo assinou artigo no qual criticava a arte contemporânea. Ele citava críticas do poeta e colunista da Folha Ferreira Gullar a obras das artistas Laura Vinci e Débora Bolsoni. Para Trigo, obras contemporâneas seriam ‘desligadas da realidade’. No dia 22, o editor da Ilustrada, Marcos Augusto Gonçalves, escreveu em sua coluna que opiniões como as de Trigo e Gullar lembravam os ataques de Monteiro Lobato à pintora modernista Anita Malfatti.’


 


Moacir dos Anjos


É do mundo que a arte contemporânea trata


‘Sob o pretexto imodesto de discutir ‘os rumos da arte contemporânea’, o sr. Luciano Trigo condensa, em artigo publicado na Ilustrada em 19/11 (‘É de fama e dinheiro que se trata a arte?’), um número significativo de equívocos e lugares-comuns sobre as artes visuais. Por ser exemplar de outras manifestações semelhantes e recentes em jornais e revistas do país -em seu conteúdo simplista e em sua arrogância formal-, julgo ser necessário tecer alguns comentários sobre o referido texto. O autor se apóia, para formular seu juízo depreciativo sobre a arte contemporânea, em uma caracterização pueril do processo de atribuição de valor à produção recente das artes visuais, em que artistas corrompidos subordinariam seu trabalho à obtenção de inserção dócil no ‘sistema’ mercantil.


Para o sr. Trigo, isso se deveria ao fato de os artistas há muito terem dado as costas para críticos íntegros capazes de identificar o ‘valor intrínseco’ do que produzem (e aqui os nomes por ele invocados não poderiam ser outros senão os de Affonso Romano de Sant’Anna e Ferreira Gullar, notórios detratores da arte atual), aliando-se a curadores e galeristas empenhados em construir ‘fama’ e garantir ‘sucesso’ financeiro.


Preguiça intelectual


Sem desconhecer que existem artistas, curadores e galeristas inescrupulosos, assim como existem profissionais corruptos em quaisquer áreas de atuação (seja a advocacia, o jornalismo, a política ou o sacerdócio), a generalização proposta em seu artigo só se justifica por preguiça intelectual ou por má-fé dissimulada.


O articulista esquiva-se, portanto, de modo grosseiro (em ao menos dois sentidos da palavra), de buscar entender os complexos mecanismos de valoração simbólica e monetária da arte contemporânea, fundados no conflito irresoluto entre instituições diversas, tais como a mídia, as universidades, os museus e as galerias.


Conflito que gera, através de intervenções legitimamente interessadas dos representantes daquelas instituições -críticos, historiadores, curadores, galeristas-, convenções instáveis sobre qualidade e preço de obras, as quais, por sua própria natureza, estão fadadas a serem recorrentemente rompidas e substituídas por mais outras.


Ao contrário do que o autor sugere, é do atrito constante entre juízos distintos que se constroem, a cada momento, acordos sobre o que é ou não é arte e sobre os valores com que as produções simbólicas circulam no mundo da riqueza, inapelavelmente satisfazendo alguns e frustrando outros.


A recusa em reconhecer a impossibilidade de atribuir valores inequívocos e estáveis a um trabalho de arte no mundo contemporâneo -definidos, de preferência, por críticos que partilham a sua visão de mundo- faz com que o sr. Trigo se conceda o direito de aplacar a sua legítima discordância do reconhecimento social detido por artistas contemporâneos (quer em termos simbólicos, quer em termos monetários) atribuindo-lhes, de modo vulgar, um comportamento supostamente venal.


A determinação do autor do texto em desqualificar a produção recente em artes visuais leva-o, ainda, a associar as criações dos artistas contemporâneas a repetições descontextualizadas do que foi já feito pelos ‘movimentos de vanguarda do século 20’. Tais trabalhos seriam pouco mais, em sua visão, do que o fruto do esforço ultrapassado de ‘chocar’ as pessoas, constituindo-se em componentes de uma estratégia ‘desesperada’ de destacar-se frente a potenciais competidores e de ganhar maior espaço de mercado. Por estarem desconectadas de seu tempo, as obras feitas por esses artistas seriam auto-referentes e incapazes, por isso, de articularem-se às questões culturais e sociais da contemporaneidade, tal como fizeram, em sua época, os … ‘movimentos de vanguarda do século 20’.


Fora de contexto


Para além da contradição do argumento utilizado, em que uma presumida vinculação da arte contemporânea com os tais movimentos de vanguarda é ora denunciada como ‘empulhação’ e ora cobrada como pertinente, o que mais chama a atenção aqui é a incapacidade do sr. Trigo em notar a maneira como a produção artística atual vincula-se criticamente ao tempo e ao lugar onde foi criada: não somente por meio da representação de um contexto específico (cultural, político, social, econômico), mas também evocando esse contexto na própria materialidade com que se apresenta ao mundo.


Incapacidade que impede o autor de considerar o roçar entre maçãs vermelhas perecíveis e a solidez branca e esculpida do mármore (parte do trabalho de Laura Vinci recentemente exposto na galeria Nara Roesler) como locução simbólica do momento e do espaço em que vivemos. Assim como o inibe a ponderar que um quebra-molas construído de paçoca, matéria que desmorona mesmo ao contato físico mais delicado (instalação de Débora Bolsoni ainda exposta no Museu de Arte Moderna), pode muito dizer sobre a fragilidade do ambiente social que nos acomoda.


Que fique claro, entretanto, que a questão aqui posta não é a de cobrar adesão do articulista a essas obras, mas a de abrir-se a elas tal como elas se abrem ao mundo. Ainda que o autor do texto continuasse a não partilhar aquilo que é evocado por esses e tantos outros trabalhos contemporâneos; e ainda que contraditasse os modos como esses sentimentos de estar no mundo são neles enunciados. O fundamental, ao fim e ao cabo, é apenas não buscar medi-los e julgá-los com o metro e as razões que não lhes cabe mais e não lhes entendem o bastante.


Por fim, e ao contrário do que o sr. Trigo afirma na primeira frase de seu texto, as exposições a que se refere e sobre as quais tece comentários críticos estiveram ou estão em cartaz apenas em São Paulo, o que lança dúvidas acerca do articulista ter-se dado ao trabalho, ao menos, de ver in loco as instalações comentadas. Ou se, como já havia decidido de antemão que as obras de Laura Vinci e Débora Bolsoni eram destinadas tão somente a ‘trazer fama, viagem e dinheiro’ a suas autoras, não seriam sequer dignas de um olhar atento antes de desqualificá-las do modo desrespeitoso como o faz.


MOACIR DOS ANJOS é pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco e curador de ‘Contraditório -Panorama da Arte Brasileira’, exposição em cartaz no Museu de Arte Moderna de São Paulo’


 


CINEMA
Silvana Arantes


Pelo Oscar, ‘O Ano’ investe nos EUA


‘O cineasta Cao Hamburger viaja hoje para os EUA, com a meta de aquecer, com a sua presença, a campanha pela indicação de ‘O Ano em que meus Pais Saíram de Férias’ à disputa do Oscar de melhor filme estrangeiro.


‘As chances de ‘O Ano…’ ser indicado em uma das cinco vagas da categoria são matematicamente de 63 para 5’, diz Hamburger, referindo-se ao fato de que 63 países apresentaram um filme à Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood.


‘Mas, pela qualidade do filme e por sua vitoriosa carreira internacional, podemos ser mais otimistas’, pondera o diretor, que terá encontros com a imprensa e acompanhará sessões de seu filme em Los Angeles, Nova York e Washington.


Visto por cerca de 400 mil espectadores no Brasil desde o seu lançamento em 2006, o longa foi selecionado pelo Festival de Berlim neste ano e participou de outras 18 mostras nacionais e internacionais, nas quais acumulou 25 prêmios.


Estratégia


‘Agora, traçamos uma estratégia para gerar visibilidade para o Cao e o filme nos EUA’, diz o produtor Fabiano Gullane.


Como parte da estratégia, a distribuidora norte-americana do filme, a City Lights Pictures, contratou Stephen Raphael, que trabalhou neste ano na campanha do longa mexicano ‘O Labirinto do Fauno’, de Guillermo Del Toro, que recebeu seis indicações ao Oscar e venceu em três categorias.


‘Creio que este filme tem o perfil e os elementos necessários para ganhar o Oscar estrangeiro. Ele me lembra vencedores anteriores, como ‘Kolya’ e ‘Cinema Paradiso’’, escreveu o executivo da City Lights, Sal Scamardo, a Hamburger.


Segundo Gullane, por sugestão da City Lights, a produção do filme aceitou participar de seis festivais de cinema judaico nos EUA, a partir deste mês, até janeiro. ‘Eles acham que vale investir nas comunidades judaicas americanas’, afirma.


O garoto Mauro (Michel Joelsas), protagonista de ‘O Ano em que meus Pais Saíram de Férias’, passa a conviver com uma comunidade judaica no bairro paulistano do Bom Retiro, quando seus pais, militantes políticos de esquerda, são forçados à clandestinidade pela ditadura militar, em 1970.


Hamburger, porém, afirma não pretender ‘ressaltar o caráter ‘judeu’’ do longa. ‘Vamos apresentá-lo como um filme com uma pegada diferente do que o mundo está acostumado a esperar de um filme brasileiro -com uma história forte, que toca em emoções que dizem respeito ao ser humano, independentemente de raça, cultura, credo e nacionalidade.’


Na campanha pela indicação do Brasil ao Oscar estão sendo gastos R$ 549 mil. Os recursos provêm do governo e dos produtores brasileiros e do distribuidor norte-americano.


A Academia anuncia os concorrentes ao Oscar 2008 no dia 22 de janeiro. A cerimônia ocorre no dia 24 de fevereiro.’


 


Folha de S. Paulo


‘Tropa de Elite’ tenta Oscar em 2009


‘Preterido pelo comitê que definiu o representante do país na corrida ao Oscar 2008, ‘Tropa de Elite’ tentará concorrer a estatuetas -nas categorias principais- em 2009. O longa estreará nos EUA no ano que vem. Assim, terá cumprido o requisito para disputar o Oscar com os demais filmes exibidos em território norte-americano. Foi o que ocorreu com ‘Cidade de Deus’, que obteve quatro indicações nas categorias principais em 2004.


O diretor José Padilha diz que a data de estréia de seu longa nos EUA ainda não está definida. ‘Primeiro, vamos decidir em que festival vamos abrir [a carreira internacional do filme].’ A estréia comercial de ‘O Ano…’ nos EUA está prevista para o próximo mês de janeiro, em 25 cidades.’


 


‘Cleópatra’ vence Festival de Brasília


‘O filme ‘Cleópatra’, de Julio Bressane, foi escolhido pelo júri oficial o melhor longa-metragem em 35 mm do 40º Festival de Brasília, encerrado ontem. Alessandra Negrini, que interpreta a personagem-título, levou o Candango de atriz. A produção recebeu mais quatro prêmios.


O troféu de direção foi para Laís Bodanzky, por ‘Chega de Saudade’, o segundo longa mais premiado da noite, com três menções (melhor filme segundo o júri popular e melhor roteiro, para o oficial).


O Prêmio Especial do Júri foi dado a ‘Anabazys’.’


 


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O Estado de S. Paulo


Quarta-feira, 28 de novembro de 2007


TV DIGITAL
Ethevaldo Siqueira


TVs do futuro: IPTV e U-HDTV


‘Pelo menos duas novas formas de TV digital estão nascendo no mundo, em paralelo com a TV digital aberta (em broadcasting) que começa a funcionar comercialmente domingo na Grande São Paulo. São elas: a TV sobre protocolo IP (IPTV) e a Ultra High Definition Televison (U-HDTV). Essas duas opções avançadas deverão disputar a preferência de milhões de espectadores no Brasil e no mundo nos próximos cinco anos.


Comecemos pela IPTV. Ela também é digital, isto é, formada por bits. Mas esses bits se organizam sob a forma de pacotes, exatamente no formato e protocolo utilizado para a transmissão dos dados via internet. Uma mensagem de e-mail que transmitimos é, na realidade, um conjunto de milhões de pacotes de bits organizados com o protocolo IP.


Embora o protocolo IP fosse ainda nos anos 90 considerado inadequado para a transmissão de voz ou de áudio e vídeo, os pesquisadores passaram a criar softwares capazes de permitir seu uso em comunicações de voz e imagens. O grande estímulo para esse esforço decorre do fato de o protocolo IP ser hoje um padrão mundial, em conseqüência da expansão da internet em escala global. Os resultados das pesquisas permitiram primeiro o sucesso da telefonia de voz sobre protocolo IP (VoIP). Agora é a vez da televisão sobre IP ou IPTV.


Uma condição essencial para o funcionamento ou recepção da IPTV é a disponibilidade de banda larga. Para o usuário residencial, a IPTV começa a ser oferecida sob a forma de Vídeo sob Demanda (Video on Demand), em serviços do tipo triple play – associando o acesso de banda larga à internet e ao telefone IP.


Na maioria esmagadora dos casos, a IPTV é oferecida numa estrutura de rede fechada. Os primeiros serviços desse tipo começam a ser oferecidos pelas maiores concessionárias de telecomunicações do País, como a Brasil Telecom, Oi e Telefônica, tanto via linha telefônica metálica quanto sobre fibra óptica.


Na opinião dos especialistas, ainda por alguns anos, a IPTV não competirá com a TV aberta, em broadcasting, mas, sim, com os serviços atuais de TV a cabo ou por assinatura. No âmbito corporativo, a IPTV pode ser utilizada em serviços de videoconferência e outras aplicações empresariais.


A Universidade de São Paulo (USP) lançou recentemente um serviço de teste de IPTV, com base numa plataforma desenvolvida em colaboração com a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa do Brasil. O objetivo é criar, num futuro próximo, um novo canal para a comunicação entre a comunidade científica e o público em geral. Atualmente, o serviço de IPTV da USP conta com seis canais com vídeos produzidos na própria universidade.


Numa visão futura, talvez haja em 2012 mais telespectadores diante de monitores de alta definição de seus computadores do que diante de receptores da TV digital de transmissão aberta, como a que se inicia em São Paulo.


A grande vantagem da IPTV poderá ser a possibilidade de vermos nosso canal preferido, programas especiais, sem uma grade fixa de programação, a qualquer hora e em qualquer lugar. Sim, porque poderemos receber centenas de programas de IPTV, aqui, nos Estados Unidos, na Europa ou no Japão, no celular, no laptop ou no iPod do futuro. E ainda poderemos produzir conteúdos audiovisuais como no YouTube.


U-HDTV: para além da alta definição


Cientistas da TV estatal japonesa (NHK) criaram há pouco mais de dois anos aquela que, talvez, seja a televisão de maior qualidade visual já desenvolvida na história. Seu nome: Ultra High Definition Television (U-HDTV), que permite a ampliação de imagens para monitores de até 11 metros de diagonal.


As imagens da U-HDTV são formadas por 4.320 linhas de 7.680 pixels, o que dá um total de 32 milhões de pixels. Para se ter uma idéia do avanço que ela significa, vale lembrar que a televisão de alta definição de hoje (HDTV) tem 1.080 x 1.920 pixels, ou seja, cerca de 2 milhões de pixels. São, portanto, 16 vezes mais pixels ou informação visual em suas imagens.


O som multicanal de 24 canais (22.2) é o mais realista e envolvente já produzido pela tecnologia. Basta lembrar que o surround dos melhores home theaters tem seis canais (5.1).


U-HDTV se destina a grandes espetáculos e usos profissionais e não a substituir a TV digital doméstica de 1080 pixels de nossos dias – concebida para telas menores e pequenos ambientes.


As imagens da U-HDTV nos dão uma sensação jamais experimentada diante de outras formas de comunicação eletrônica. Por isso, suas demonstrações produziram impacto em todos os que conseguiram um lugar na sala de projeção, no Nab Show (evento da National Association of Broadcasters, realizado em abril, em Las Vegas).


Hirokazu Nishiyama, diretor da NHK e um dos responsáveis pelo desenvolvimento da U-HDTV, disse em entrevista exclusiva ao Estado, em abril deste ano, que o maior objetivo desse projeto é ‘criar no espectador a sensação de estar imerso na própria cena’. A essa experiência, ele chama de Tele Sense: a sensação de estar lá, como parte integrante das cenas, dentro da imagem.’


 


LITERATURA
Francisco Quinteiro Pires


‘Vai brincar na rua, moleque!’


‘O mercado editorial ganhou recentemente dois livros sobre brincadeiras. Mãe da Rua e Giramundo resgatam a época e as localidades em que há tempo e espaço disponíveis para as crianças brincarem sem grandes preocupações. Da época em que as mães gritavam sem receio e pedindo alívio: ‘Vai brincar na rua, moleque!’


O avanço da urbanização e a consolidação do progresso técnico-científico transformaram divertimentos como a peteca, a pipa e o pião em lembranças de avós ou em motivo de piadas que lembram, nas conversas de adultos, a idade já não tão jovem. Gracejos à parte, as duas publicações são úteis para entender como as crianças brincam e crescem atualmente.


‘Minha pretensão não era fazer um tratado de sociologia, apenas relembrar a realidade do grupo de meninos que brincavam nas ruas da cidade de São Paulo, na minha época’, diz Ettore Bottini, autor de Mãe da Rua (Cosac Naify, 83 págs., R$ 42). (Embora não seja revelado no livro, o bairro em que Bottini passou a infância é o da Vila Mariana, na zona sul). ‘Mas é inegável que o meu livro trata a rua como um espaço público de socialização diferente do espaço de hoje, que tem um outro tipo de ocupação, que abriga a violência e a agressividade urbanas e tem calçadas mais estreitas e prédios cheios de grades parecidos com barricadas.’


Para Bottini, um representante da socialização ao ar livre e sem amarras, como o vão livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp), de Lina Bo Bardi, tornou-se com o tempo um local utópico, em contraste com a metrópole de gente apressada, na qual é difícil ver crianças brincando à solta, sobretudo dentro dos limites do centro expandido da capital.


Os meninos da alvorada do século 21 se socializam em espaços privados, na própria casa ou na casa de amigos, na maioria feitos no meio escolar, ou em limites institucionais, como a escola, o clube, o curso de língua ou de natação, o judô, o balé, etc. ‘Quando eu era criança, era impensável me relacionar com um colega de sala de aula fora dos muros do colégio’, afirma Bottini. O aval para brincar na rua era dado pela criatividade da própria criança e não pela obediência à hierarquia de uma instituição.


O artista gráfico Ettore Bottini teve a idéia de escrever Mãe da Rua depois de conversar com o irmão sobre as regras da bolinha de gude. Os jogos infantis praticados nos anos 1950 e 1960 e os brinquedos feitos com sobras da sociedade industrial, então no auge, são reunidos por Bottini em forma de um ‘manual’ que, além de registrar os objetos e as regras da diversão, ensina a fabricá-los e a aplicá-las.


Eles vão de armas, como o estilingue e o revólver de feijão, a brinquedos, como o futebol de botão e o carrinho de rolimã. São na definição de Bottini os ‘objetos-gambiarra’, que aproveitam na composição materiais inutilizados, como serras e antenas velhas. ‘E a gente se lembrava deles somente nos dias de chuva ou quando não estávamos jogando futebol, que era disparado a diversão preferida dos meninos.’


O modo como as crianças viam a arquitetura também é diverso do atual. ‘Antes de a cidade se expandir e os automóveis tomarem conta de tudo, depois dos anos 1970, as ruas eram vistas como pista de skate ou de corrida e as garagens e portões das casas, como balizas de um campo de futebol’, diz Bottini.


Embora o ‘viés saudosista’ seja inevitável em um livro como Mãe da Rua, Ettore Bottini não critica as crianças que crescem na frente do computador ou da televisão. ‘Não quero que um garoto adote a bolinha de gude nas horas de diversão, as brincadeiras devem ser pertinentes à realidade atual, que tem outras exigências’, opina.’


 



Livia Deodato


O livro vai mesmo chegar ao seu fim?


‘Onde vamos fazer a anotação ao pé da página com uma emocionada letra tremida? E a marca da lágrima sobre a página amarelada, em que livro vai ficar? As perguntas de Ziraldo também já passaram pela sua cabeça, caso o fim tão anunciado do livro esteja realmente próximo? Editores, intelectuais, poetas, políticos e outras tantas pessoas estreitamente ligadas ao universo literário expõem suas preocupações, dão soluções, fazem rima e prevêem O Futuro do Livro, obra que será lançada hoje numa parceria entre a gráfica Ipsis e a editora Olhares.


O bibliófilo José Mindlin, o ministro da Cultura Gilberto Gil, os professores Heloisa Buarque de Hollanda e Muniz Sodré e os escritores Luis Fernando Verissimo e Milton Hatoum são apenas seis dos 60 nomes convidados a darem suas opiniões, cuja abordagem varia desde a possível extinção do objeto em si até a forma enxuta e veloz que notícias e histórias adquirem com os adventos tecnológicos. ‘A participação foi livre. Bob Wolfenson, por exemplo, mandou uma foto de um sebo de Cuzco, no Peru’, conta o editor Otávio Nazareth.


A edição, com tiragem inicial de 2.500 exemplares, traz ilustrações divertidas, outras um tanto psicodélicas, que brincam com a disposição das palavras. E justamente por causa de o conteúdo ter esse aspecto tão colorido, Nazareth e o diretor editorial Eduardo Len optaram por uma capa mais sóbria – mas nem por isso menos criativa. Hélio de Almeida, conhecido por suas belas capas na Cia. das Letras, estampou a foto de um livro envelhecido, visto como se estivesse de pé na prateleira – a capa traz o lado das folhas e a contra, a lombada.


Serviço


O Futuro do Livro – 60 Visões. Vários escritores. Ed. Olhares/ Ipsis. Livraria da Vila. Al. Lorena 1.731, 3062-1063. Hoje, 19 h’


 


CINEMA
Flávia Guerra


Uma relíquia do jovem Bertolucci


‘Quem está acostumado a associar a figura do diretor italiano Bernardo Bertolucci a filmes que são verdadeiros espetáculos como O Último Imperador ou a polêmicas como O Último Tango em Paris e até mesmo ao recente Os Sonhadores vai se surpreender ao ver La Strategia Del Ragno (A Estratégia da Aranha), de 1970, que tem sessão hoje, às 21horas, no Espaço Bombril. Um dos primeiros longas do diretor, que pode ser chamado de clássico do cinema moderno, revela quanto Bertolucci já foi um cineasta de vanguarda capaz de representar a essência do que pode ser chamado de Cinema Novo Italiano.


A relíquia não chega a São Paulo por acaso. O longa integra a programação de Venezia Cinema Italiano 3, que segue até amanhã. Realizada pela Secretaria Municipal das Subprefeituras, a Embaixada da Itália, em parceria com a Biennale di Venezia, a seleção traz à cidade o melhor da safra produzida pelos herdeiros do neo-realismo italiano.


Vale lembrar o que disse, no domingo, o diretor Carlos Reichenbach, que se inspirou nos mestres italianos dos anos 60 para criar seqüências inteiras de seu Falsa Loura, que integrou o Festival de Cinema de Brasília: ‘O cinema italiano desta época foi dos melhores, senão o melhor, do mundo. Está tudo ali. Na obra de nomes como Rossellini, Valerio Zurlini, Damiano Damiani. São referência até hoje.’


De fato. ‘Eles deixaram um legado que transparece nesta nova safra. Muito antes disso, já haviam influenciado, por exemplo, o Cinema Novo brasileiro’, concorda Sergio Tofetti, vice-diretor da Cineteca Nazionale Italiana, responsável pela restauração de A Estratégia da Aranha e de tantos outros clássicos italianos. A julgar por esta mostra, e por outras que já passaram pela cidade, ainda que distante da genialidade de seus mentores, os novos nomes do cinema italiano vêm tentando recuperar o prestígio.


Daí a importância de trazer ao Brasil um filme como A Estratégia da Aranha. O longa, que chega em cópia restaurada após ter sido exibido no último festival de Veneza, na homenagem prestada a Bertolucci, que recebeu o Leão de Ouro pela carreira, é material de estudo arqueológico. ‘Foi importante restaurar este filme. Fala muito do que seria depois o trabalho do Bertolucci. Partimos da cópia original, que estava muito degradada. Tivemos de escanear e restaurar alguns fotogramas com tecnologia digital’, explica Tofetti.


O filme conta a história de Athos Magnani, que tem o mesmo nome do pai assassinado na 2ª Guerra pelos fascistas na Itália. Ele um dia recebe um chamado e volta a esta cidade, Tara, com a missão de investigar quem foi o real assassino de seu pai. Acaba descobrindo mais. Vê-se diante da dúvida: seu pai foi de fato um herói ou um traidor?


Baseado no romance Tema do Traidor e do Herói, de Jorge Luis Borges, A Estratégia da Aranha foi um dos primeiros filmes de Bertolucci, que já havia dirigido anos antes seu primeiro longa de destaque, Antes da Revolução (1962). ‘Sua linguagem moderna, a forma de direcionar a câmera e os planos longos mostram como Bertolucci foi um diretor da modernidade. O cinema dele é tão importante para nós quanto o Cinema Novo, movimento com o qual ele tinha relação forte, era para vocês, brasileiros’, comenta Tofetti. ‘Por isso é também tão importante levar este filme ao Brasil. Sem contar que o argumento diz respeito à cultura latino-americana.’ ‘Bertolucci se tornou um diretor do cinema-espetáculo. Mas antes ele fazia um cinema originalmente de autor.’


E esta capacidade de ser um cineasta de vanguarda permaneceu em todas as grandes produções que dirigiu. ‘Influenciou, e ainda influencia, cineastas de todo o mundo.’


Serviço


A Estratégia da Aranha (La Stategia del Ragno, 1970, 99 min.). Dir. Bernardo Bertolucci. Cine Bombril CCSP, hoje, 21 h. , amanhã, 20 h. Grátis’


 


VENEZUELA
Lourival Sant´Anna


Chávez faz ameaça a empresários anti-reforma


‘O presidente Hugo Chávez ameaçou confiscar as empresas filiadas à Federação de Câmaras e Associações de Comércio e Produção da Venezuela (Fedecámaras) por sua oposição à reforma constitucional, que será submetida a referendo no domingo. ‘Se o presidente da Fedecámaras insistir em suas ameaças ao governo bolivariano, tiro-lhes todas as empresas que eles têm’, disse Chávez, durante um evento com empresários que apóiam a reforma, num hotel em Caracas, na noite de segunda-feira.


‘O presidente da Fedecámaras, assustado, ameaçou fazer tudo que tivesse de ser feito para evitar a aprovação da reforma constitucional. Bom, compadre, manda brasa’, disse Chávez, diante da platéia dos Empresários pela Venezuela (Empreven), pró-governo. ‘Se a Fedecámaras quer nos enfrentar, quer enfrentar o país, adiante, Fedecámaras, mas vão ficar sem ‘Fe’, sem ‘de’ e sem ‘cámaras’.’ Integrantes da Empreven disseram estar prontos para ‘substituir’ a Fedecámaras, criada em 1944.


oi uma resposta a um comunicado divulgado na manhã de segunda-feira pelo presidente da Fedecámaras, José Manuel González, pedindo que os venezuelanos se unissem para votar ‘não’ no referendo do domingo. ‘O trabalhador venezuelano aprecia os postos de trabalho de nossas indústrias, comércios, fábricas privadas, e sem consulta, de forma contrária a nossa maneira de ser, querem impor-nos uma proposta que atenta aberta e definitivamente contra as oportunidades de trabalho estável que o setor privado venezuelano representa’, diz o comunicado.


A proposta, que modifica 69 artigos da Constituição, introduz uma forma de ‘propriedade social’. Por meio dela, os conselhos populares, criados pelo governo Chávez, poderão possuir empresas. Chávez nega que vá eliminar o direito à propriedade privada.


No comunicado, a Fedecámaras se solidariza com a Igreja Católica, outro alvo da incendiária retórica de Chávez. Em entrevista a jornalistas simpáticos ao governo, na noite de domingo, Chávez fez uma advertência aos dirigentes católicos, que qualificam de ‘anticristã’ a reforma: ‘Se continuarem dizendo essas coisas, vamos ter de fazer algo. É triste ver um padre na prisão, mas paciência tem limite.’ Em discurso num evento de mulheres a favor do ‘sim’, Chávez chamou ontem os dirigentes católicos de ‘fariseus e hipócritas’.


Já o vice-presidente Jorge Rodríguez anunciou ontem que denunciará a Conferência Episcopal da Venezuela (CEV) perante o Conselho Nacional Eleitoral, para que investigue se a entidade está atuando como ‘partido político’. Segundo Rodríguez, que lidera a mobilização em favor do ‘sim’ no referendo, integrantes do ‘comando delinqüencial da resistência’ (Comando Nacional da Resistência, contrário à reforma) se reuniram no domingo no Instituto Diocesano, em Maracay, ‘planejando as tramóias ocorridas ontem em Carabobo e Arágua (Estados no norte do país)’, onde confrontos deixaram um morto e seis feridos na segunda-feira. ‘Se é um partido político, que determine se se inscreveu no bloco do ‘não’, e se cumpriu com os requisitos exigidos’, pediu Rodríguez.


Apesar das ameaças, o vice-presidente da CEV, monsenhor Roberto Lückert, voltou à carga ontem. ‘Ele (Chávez) vai tentar ganhar de qualquer jeito, mas vai ser tal a avalanche de votos (contra), que vai ficar difícil para ele fazer a trapaça que sempre fez’, disse o dirigente católico à Rádio Caracol, de Bogotá.


Rodríguez, que chefia o Comando Zamora, de mobilização pelo ‘sim’, acusou os oposicionistas pela morte do operário José Aníbal Yépez, em confronto com manifestantes em Guacara (Carabobo). Yépez, de 19 anos, cuja mulher está grávida de seis meses, trabalhava na companhia estatal Petrocasa. Ele estava num grupo de operários que queriam passar com material de construção por uma avenida ocupada por manifestantes oposicionistas. Segundo o vice-presidente, o autor dos disparos é o dono de um bufê de festas. Quatro pessoas foram detidas.


‘Deve-se aplicar todo o peso da lei sobre o assassino, sem contemplação nenhuma. Trinta anos de cárcere’, disse Chávez, no evento com as mulheres a favor do governo, num ginásio de Caracas. ‘Sabemos quem são os autores intelectuais, e para cada porco chegará seu sábado’, sentenciou. ‘Há autores intelectuais no Pentágono, mas aqui também há autores intelectuais que cumprem ordens do império norte-americano’, prosseguiu o presidente. ‘Não creiam que a impunidade na qual estão se movendo será eterna. Chegará o dia em que teremos as provas suficientes, sempre no marco da Constituição, que a partir de domingo será vermelhinha.’


PROPRIEDADE’ BOLIVARIANA


Social: Propriedade que pertence ao povo, mas é controlada pelo Estado


Coletiva: Propriedade que é mantida por grupos sociais ou comunitários, mas também fica sob o controle do Estado


Mista: Propriedade que conta com a participação do setor privado e do Estado, mas fica sob o controle do governo venezuelano


Pública: Propriedade administrada pelo governo da Venezuela


Privada: Propriedade que pode ser confiscada pelo Estado quando afetar os direitos de terceiros ou da sociedade’


 


CULTURA
Jotabê Medeiros


Artistas negros iniciam nova onda ‘Fica, Gil’


‘‘É pena que ele está ameaçando deixar o ministério. Quer só cantar. Isso é muito bonito, mas o mais difícil é o desafio de mudar o que está aí. Fica, ministro!’, pediu em seu discurso o escritor, dramaturgo e professor Abdias do Nascimento, de 90 anos, o homenageado da noite. Então, a platéia toda, cerca de 150 artistas, intelectuais e militantes de movimentos negros, iniciou em coro o segundo ato do movimento ‘Fica, Gil!’, pedindo em coro a permanência do ministro da Cultura em seu posto.


Gil, que assistia na platéia à cerimônia de abertura da 4ª Mostra Internacional do Cinema Negro, na Cinemateca Brasileira, anteontem à noite, apenas ouvia, sorria e semicerrava os olhos. ‘Claro que sou sensível (ao apelo). Mas a intenção é deixar o ministério até o fim do ano que vem. A decisão pode mudar, mas minha intenção é deixar’, afirmou o ministro, falando com exclusividade ao Estado.


Artistas como Tony Tornado, Neuza Borges, Zezé Motta, Maria Alcina, e intelectuais da USP, como o antropólogo João Batista Borges Pereira e professor doutor Celso Prudente: a nata da militância pela conscientização racial compareceu, além de autoridades, como Silvio Da-Rin, secretário do Audiovisual. Momentaneamente, Gil deixou de ser o dono do palco para misturar-se à platéia, de onde assistiu durante quase três horas a pocket shows, discursos e até enfrentou um início de saia-justa, com o cantor Moacyr Franco.


Franco iria apresentar um set com algumas de suas músicas. Quando subiu ao palco, disse: ‘Pena que o ministro já foi embora…’ Mas Gil estava bem ali na primeira fila. ‘Eu não tinha visto, ministro. Eu, que Deus me perdoe, já fui deputado federal. Político vem, fala e vai embora. Você também já cometeu seus pecadinhos políticos’, disse a Gil, que o contestou. Mas, sem microfone, teve de ouvir Moacyr Franco (que, nos anos 1980, foi deputado federal pelo PTB) fazer o seu número meio provocador.


‘Eu não sei se Vossa Excelência tomou conhecimento, mas eu fiz uma música, que a Rita Lee gravou, Tudo Vira b… Eu ia cantar aqui, mas tem muitas senhoras presentes, então vou cantar uma nova, Se Vira nos Cinqüenta.’ A canção era um primor de mau gosto, abordando as dificuldades sexuais e fisiológicas dos homens de meia-idade, mas foi muito aplaudida. A capela, Zezé Motta cantou Zumbi, música de Gil e de Waly Salomão, e Gil fez corinho para ela da platéia. Maria Alcina cantou Fio Maravilha, de Jorge Benjor.


Houve diversos discursos mais incisivos. O babalaô Ivanir Santos subiu ao palco para denunciar que adeptos do candomblé estão sofrendo perseguições por parte das religiões evangélicas e exigiu o cumprimento da Constituição no que diz respeito à liberdade de culto. Segundo ele, evangélicos estão invadindo terreiros de umbanda pelo País e já houve casos de agressões físicas.


‘Na semana passada, fui até a Rede Globo conversar com Ali Kamel, que inclusive é nosso adversário na questão das cotas raciais, para dizer a ele que, para além das suas convicções, era preciso cobrir o que está acontecendo, que o jornalismo tem de exigir respeito pela liberdade religiosa. Ele me recebeu, me ouviu e mandou uma equipe de TV cobrir a questão na Bahia e no domingo o Fantástico tratou desse tema’, contou o babalaô.


‘Mandei uma carta ao presidente Lula pedindo que ele não ceda, porque os reacionários racistas estão em todo lugar. Esse aí que o Ivanir citou, que é chefe de Redação do Globo, esse é um racista furioso. Quando sai um artigo dele, pode ver que ele está atacando os afrodescendentes’, retrucou Abdias Nascimento.


Em conversa com o decano Nascimento, Gil elogiou sua aparência, disse que ele estava ótimo, que a idade do escritor (90 anos) não lhe trazia nenhum malefício. ‘A semana passada eu estive com Roberto Carlos’, contou Gil. ‘A gente conversou sobre essa coisa da idade, ele me disse que a mãe dele, Dona Laura, está escutando mal. Ela tem 94 anos. Eu lembrei a ele que minha mãe está com 92 anos, a do Chico Buarque está com 98 anos, e a do Caetano com 100 anos. Pegaram gosto pelo viver, e acho que nós contribuímos para isso, com nosso ofício de alegrar as pessoas’, contou. ‘Minha mãe (Dona Claudina) teve catarata, não enxerga muito bem, mas está ótima. Já o Caetano fica boquiaberto com Dona Canô: não é só o físico que está ótimo, mas também o psicológico, o intelectual.’ Depois de ouvir toda essa argumentação, Abdias Nascimento berrou no hall da Cinemateca: ‘Eu sou lindo!’


Gil se vê obrigado a atuar às vezes como um oráculo, noutras como um paciente conselheiro. A atriz Neuza Borges o puxou pelo braço para reclamar de uma suposta discriminação por parte da TV brasileira, onde ela trabalhou nos últimos 40 anos. ‘Eu me mudei para Salvador, onde sou tratada como uma princesa. Eu desisti. Mandei às favas esses autores e diretores de novela’, contou. Gil retrucou: ‘Se você está aqui, é porque ainda não desistiu.’


‘Seria bom se eles pudessem, além de pedir para que eu fique, pedir para que minha saúde se restabeleça, minha voz se recupere’, disse o ministro Gil, que volta a cantar no dia 16 de janeiro no Festival de Verão de Salvador, desta vez para mais de 15 mil pessoas (com Ivete Sangalo como convidada). Segundo o ministro, a cicatrização da garganta (ele retirou dois calos nas cordas vocais no mês passado) evoluiu bem, mas a voz ainda está se recobrando.


O ministro revelou que estava particularmente satisfeito com o acordo assinado em Brasília, também anteontem, com servidores do ministério que estavam em greve desde maio. ‘Era uma reivindicação dos servidores do ministério desde que nós chegamos lá, em 2003. Eles querem um plano de carreira, querem a recomposição dos salários. Mais que um compromisso, é uma necessidade do serviço público, porque é daí que vem a qualidade’, disse Gil.’


 


ENTREVISTA / FERNANDA YOUNG
Leila Reis


‘Escrevo para conseguir sobreviver à melancolia’


‘Fernanda Young tem trabalhado muito para a TV em parceria com o publicitário e marido Alexandre Machado. Nesta entrevista, a roteirista da série O Sistema e do quadro Super Sincero (com Luiz Fernando Guimarães, no Fantástico) e entrevistadora do Irritando Fernanda Young, na GNT, reclama o tratamento que tem recebido da imprensa como escritora: ‘Acabei de lançar meu oitavo romance e não tive uma resenha sequer.’ Aos 37 anos de idade e duas filhas (7 anos), Fernanda diz que conseguiu reverter a antipatia que cativou quando colocou seu lado ‘anarquista e desagradável’ para fora no Saia Justa e que, mesmo ganhando mais dinheiro na TV, é na literatura que ela se garante: ‘É o que eu preciso fazer para sobreviver à melancolia.’


Por que você acha que O Sistema vai mal de ibope?


A direção da Globo está satisfeita com audiência (média de 12 pontos no Ibope), porque O Sistema é uma experimentação, uma história nonsense, com novos atores, formato diferente. Se todas as outras emissoras copiam o que a Globo faz, então é uma decisão sóbria experimentar na linguagem, em outro tipo de humor.


O telespectador está preparado para um humor mais sofisticado?


Acho que o grande público é capaz de reconhecer as barbáries brasileiras em O Sistema, porque a série é um deboche que alinhava vários clichês presentes no inconsciente coletivo. É uma grosseria achar que o telespectador não está preparado para programas que saiam fora do arroz com feijão.


De tudo que você escreveu para a TV, qual programa você considera o melhor?


Neste momento é O Sistema. Por causa da experiência com novos atores (escolhidos por meio de teste), idas e voltas no tempo, letreiros e efeitos especiais.


Como autora, você infere na escalação do elenco?


Quando a gente pensou na série, Selton Mello (com quem fizemos Os Aspones) foi a nossa primeira escolha. O próprio Selton estimulou a opção pelos novos atores. Maria Alice Vergueiro foi um desejo alternativo do grupo e trouxe um público jovem, que baixa a série no YouTube. Ney Latorraca é tão forte na minha história de telespectadora, que achava que ele estava acima das minhas possibilidades, até que ele pediu para trabalhar comigo quando fizemos Irritando Fernanda Young (GNT). Formamos um bom time.


Você é romancista, roteirista e apresentadora de programa. Em qual função você é mais você?


Como romancista, porque é o que eu faço melhor. É o que eu preciso fazer para sobreviver à melancolia.


Como sobreviver à melancolia?


Não escrevo por vaidade, é uma necessidade que tenho desde os 17 anos. Escrever romances é o que faço melhor, assim como tentar ser uma boa mãe. Já sofri muita crítica e preconceito, porque devo ter um perfil que não resvala para o intelectual e isso incomoda a imprensa especializada. Tanto que acabo de lançar meu oitavo romance, É Tudo Que Você não Soube, e não publicaram uma resenha sequer. Acho ausência de auto-estima descartar assim um autor nacional.


Quando deixou o Saia Justa, você disse que queria que seu cabelo crescesse sem ninguém dar palpite. Você já resolveu o dilema de ser famosa ou não?


Não tenho necessidade de estar no ar. Faço o Irritando Fernanda Young porque é um programa que eu criei. Você não me vê em revistas de celebridades, minha vida social se restringe a um restaurante japonês ou uma pizza com cerveja até as 7 da noite. Durmo às 10 toda noite para dar conta do trabalho. Conquisto a auto-estima por meio do trabalho e das minhas filhas.


Você conseguiu inovar o talk show pegando o tema da irritação e se colocando na conversa. A que você credita esse prestígio?


Quando fazia Saia Justa não tinha noção do número de pessoas que estavam me vendo. Coloquei em cena meu lado anarquista, desagradável, burro e paguei um preço alto por isso. Acho que depois consegui reverter, porque as pessoas gostam de ir ao meu programa. Elas sabem que não serão expostas ao ridículo nem serão pressionadas a falar o que não querem. E me exponho mesmo, não me importo de fazer escada para os entrevistados. Fábio Jr. ficou impressionadíssimo quando eu disse que era fã a ponto de ir aos shows dele.


Por que Alexandre Machado nunca aparece? Qual é o acordo da dupla?


Alexandre não suporta sair de casa. Ele tem uma auto-imagem que é mais bonita do que a realidade, por isso não quer se ver em fotos e revistas. Ele fica em conflito porque se imagina como o Sean Connery.


Você me disse há três anos que queria transformar o seu livro Aritmética em minissérie. O que você fez para isso?


Eu sou muito respeitada na Globo, mas não sou política. Se depender de mim e do Alexandre freqüentar os corredores da Globo para chegar lá, nada vai rolar. Mandei o texto para o Jayme Monjardim e não obtive resposta. Mas agora existe uma hipótese de fazer a minissérie, porque mostramos o texto para o José Lavigne e ele topou conversar a respeito.


Qual das suas atividades te dá mais dinheiro? E qual a que dá mais aporrinhação?


A de roteirista de TV é a mais bem remunerada e na qual a família se concentra. Eu não conseguiria viver de literatura sendo singelamente paga porque não sou uma pessoa singela. Sou viciada em marcas, adoro Louis Vuitton, apesar da minha aparência, sou muito suburbana.’


 


TELEVISÃO
Keila Jimenez


A novela Aguinaldo


‘Aguinaldo Silva virou uma novela a parte. Ele mesmo se enredou em uma trama daquelas. O autor, que está afastado temporariamente de Duas Caras, caiu em uma tática adotada pela Globo anos atrás com Benedito Ruy Barbosa.


Alegando problemas de saúde, Benedito se afastou do comando da novela Esperança em 2002, depois de entrar em atrito com a Globo. A trama, que vinha registrando uma das mais baixas audiências do horário, perdeu seu autor do meio para o fim.


Aguinaldo não estava atrasando capítulos, mas mesmo assim acabou sendo ‘licenciado’ pela emissora por tempo indeterminado. E apesar de andar na casa do 37 pontos, Duas Caras não é um fiasco de audiência. A antecessora, Paraíso Tropical, por muito tempo registrou ibope semelhante. E vale lembrar que os demais horários de novelas da líder passam longe das médias antes alcançadas.


O problema é mesmo com Aguinaldo, e a Globo. O autor, que andou falando sem pudor – atacando muita gente – em entrevistas e em seu blog, prometeu agora um voto de silêncio. Talvez esse seja o ‘final feliz’ sonhado pela rede para essa história.’


 


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