Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Um fato e as interpretações

Na Folha de domingo, 9 de maio, o jornalista Nelson de Sá comentou as matérias recentes do Jornal Nacional envolvendo o ex-prefeito e provável candidato à Prefeitura de São Paulo, Sr. Paulo Salim Maluf. No texto o fato central passa a ser secundário. Os documentos com a assinatura do Sr. Maluf, enviados pela Justiça suíça, mostrando serem dele os depósitos feitos naquele país, ficam num plano menor. Perdem para o peso político do personagem. Segundo o raciocínio do articulista existem indícios de manobras eleitoreiras tucanas no posicionamento da Globo. De tucanos emplumados, Serra e FHC.

É exatamente o que Maluf diz. Ele está na frente nas pesquisas, divide com a prefeita Marta Suplicy as preferências dos eleitores. Quem conhece a história recente sabe ser isso comum em São Paulo, desde que Maluf apareça como candidato. Ele liderou contra Mário Covas até o início do segundo turno, esteve na frente contra Marta, embora nessa ocasião disputasse também com Geraldo Alckmin. No fim, como sempre, acabou derrotado. É bom ir para o segundo turno contra Maluf. Tudo indica que sendo candidato ele estará lá. Marta quer Maluf como adversário, o PSDB quer Maluf fora da disputa.

Enquanto nada for provado, Maluf tem o direito de afirmar ser inocente. As contas de fato existiram, entretanto, não estão mais na Suíça. Maluf faz como fazia Tim Maia, que dizia não beber, não fumar e não cheirar, seu único defeito era mentir um pouquinho. Maluf mentiu quando afirmou nunca ter tido contas no exterior. Teve sim, a assinatura do depósito é dele. Mentir é pecado venial, uma passadinha na missa de domingo e tudo está resolvido. Maluf é um homem religioso.

O dinheiro depositado na Suíça, uma montanha dele, parece ter evaporado. Se não for encontrado será como nas novelas de Dashiell Hammett: o cadáver desaparece. Aliás, uma das afirmações de Maluf foi forte o suficiente para causar dúvidas. Ele disse, categórico, em entrevista para a televisão, que gostaria de ser processado para que os papéis da Suíça se tornassem públicos. Por quê? Há indícios, provas contundentes, como a assinatura nos depósitos bancários, e nenhum arremate. Aliás, Maluf parece estar acima do bem e do mal, sempre falou e fez o que quis. Nunca teve problemas maiores, exceto na França, país cheio de petistas, ou seria de tucanos?

Lentos demais

Ainda que haja interesses políticos nas denúncias da televisão, elas são consistentes. O Jornal Nacional fez bem seu trabalho. Como poderia calar? O ‘jornalista’ Arnaldo Jabor, também citado em Toda Mídia como acusador, apenas comentou os fatos e os desmentidos de forma irônica. Maluf é uma figura importante no panorama político nacional, tudo o que se refere a ele terá sempre desdobramentos nessa direção.

Apenas uma coisa a imprensa parece ter esquecido. As investigações das contas no exterior não devem ser tratadas como fatos políticos. São casos policiais com repercussões políticas. Misturar denúncias policiais com fatos políticos é uma forma de desviar a atenção do ponto central da questão. A imensa hipocrisia que campeia no Brasil e que torna impunes os corruptos. Se as contas são de fato de Maluf ele está exercendo o direito de qualquer cidadão brasileiro. É permitido ter contas no exterior. Se não for encontrada a origem dos depósitos, que deveriam estar nas declarações ao Fisco, então a coisa muda de figura, o dinheiro saiu do país de forma ilegal.

Até que tudo seja devidamente apurado, cabe o desafio do Sr. Maluf: quem encontrar o dinheiro pode ficar com ele. Fica claro que deve haver algum trunfo na manga do ex-prefeito. Ou ele é muito esperto ou os que o investigam são incompetentes. Talvez sejam lentos demais, e aí cabe desconfiar: o tempo tem sido o maior aliado de Maluf. Não é à-toa que uma pessoa tem o nome tornado sinônimo de ato ilícito. Qualquer criança de São Paulo sabe o significado de ‘malufar’. Onde há fumaça presume-se que haja fogo. Menos se Maluf estiver envolvido. Então a fumaça pode ser apenas ‘manobra do PT’. ‘Ou dos tucanos’.

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Jornalista