Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Um novo comportamento do consumidor

Admito que até poucos dias atrás nunca ouvira qualquer música de Lady Gaga. Ou melhor, talvez até já tivesse ouvido, mas não conscientemente. Confesso, também, que achei bastante esquisito o seu nome, quando o ouvi pela primeira vez.

Gaga? Estranho, para uma cantora…

O que me chamou a atenção na carreira desta cantora e compositora de apenas 23 anos é a sua relação comercialmente vitoriosa com as mídias digitais. Entro no Facebook e encontro 5,2 milhões de fãs. Vou ao seu Twitter e lá estão 2,8 milhões de seguidores. Fico sabendo que a cantora foi a primeira a atingir a marca de 1 bilhão de acessos na web. Repito: 1 bilhão de pessoas acessaram seus videoclipes. Fãs, internautas, seguidores: leia-se, consumidores.

Com este relacionamento direto com o público, a cantora vendeu mais de 20 milhões desingles e 8 milhões de álbuns na internet. Seu público é jovem e os jovens geralmente não compram música, como sabemos. Eles a baixam, de graça, na rede. Mas compraram e o fenômeno despertou a atenção de anunciantes que desejam que ela faça o mesmo por suas marcas. O tino comercial da roqueira excêntrica já ultrapassa o mundo da música. Ela também está no milionário negócio dos jogos eletrônicos. Num deles, o ‘Glam Gaga’, os jogadores – especialmente meninas – decidem o figurino exótico da cantora. E engordam os cofres da estrela.

Vendas caem 43% em quatro anos

Recentemente, a vocalista da banda Pato Fu, Fernanda Takai, se disse surpresa com a velocidade das mudanças: lançou o primeiro disco em vinil, os seguintes em CD e não sabe em que suporte lançará o décimo, que está por sair. Diz ela: ‘Aconteceu tudo muito rápido’. Fernanda sabe que não adianta se queixar, tem que se adaptar e ter boas ideias. Sabe, igualmente, que as mudanças tecnológicas também trazem vantagens, como a possibilidade do mundo ouvir sua música imediatamente após o lançamento.

É neste mundo, em que os bits viajam em fração de segundos, que artistas, profissionais e executivos tentam reaprender a tocar suas vidas e negócios. Não parece fácil. Antes da explosão da internet as regras estavam estabelecidas, negócios e direitos autorais garantidos. Com as cópias gratuitas e a pirataria, gravadoras entraram em declínio, locadoras de vídeo fecharam as portas e artistas perderam a renda. O mais recente relatório da International Federation of Phonografic Industry aponta que no Brasil as vendas de disco sofreram uma redução de 43% entre 2005 e 2009.

Novas formas de gerar dinheiro

O alemão Gerd Leonhard, músico e especialista em mídias digitais, diz que é uma batalha perdida debater maneiras de conter as cópias gratuitas. ‘É preciso tornar legal o que cerca de 4 bilhões de pessoas já estão fazendo.’ Uma das formas que aponta é a de incluir o custo da música no pacote de acesso à internet. Outra: usar a publicidade para arcar com o custo deste oferecimento ‘gratuito’ ao internauta. ‘O principal é que o consumidor sinta como se fosse de graça, a exemplo do que ocorre com o rádio.’

Já perdemos as contas das montanhas de CDs e DVDs piratas apreendidos e destruídos pela polícia. Vemos sempre na televisão. Em que isso mudou o rumo das coisas? A questão é que as pessoas têm a tecnologia e estão no controle da situação. E nunca se ouviu tanta música no mundo como agora. Portanto, o que se deve fazer é encontrar formas de gerar dinheiro a partir do novo comportamento do consumidor e garantir a continuidade da produção. Lady Gaga descobriu. Vale a pena conhecê-la.

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Jornalista, editor de Séries Especiais, chefe de reportagem, TV Gazeta, Vitória, ES