Thursday, 07 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Uma eleição construída por imagens

Lamentavelmente, a postura da FolhaGloboVeja em nada mudou em comparação com as eleições Collor-Lula, de 1989: fez propaganda e defesa diretas à direita capitalista e patrimonialista do PSDB. No último debate, ocorrido em 29/10/10, a Globo adequou o formato ao gosto dos/as telespectadores/as atônitos/as de novela, como sugeriu Keila Jimenez na análise ‘Formato com candidatos em movimento é mais dinâmico’ (Folha, 30/10/10). A análise, no entanto, deixou de apontar que o formato com candidatos em movimento abre mais possibilidades para tomadas de câmera desiguais e tendenciosas. No último debate, o/a telespectador/a de novela contou também com os movimentos de câmera favoráveis a Serra para ‘decidir seu voto’.

Na literatura em Linguística é amplamente reconhecida a atual importância das imagens na construção dos significados. Se William Bonner não pode favorecer Serra com palavras (embora tenha acusado a candidata Dilma de ‘driblar o cronômetro’, quando, de fato, ocorrera uma falha de produção), favoreceu a direita conservadora com os enquadramentos e perspectivas das imagens, como chamamos em Linguística.

O/a telespectador/a, desavisado/a da novela ou dos programas de auditório (para usar a comparação feita pela jornalista da Folha) assistiu, nos últimos 30 segundos do debate, a uma Dilma longínqua, distante, em perspectiva vertical, numa imagem de distanciamento e assimetria de poder com o telespectador; ressalte-se, ainda, a sombra do opositor ao fundo. Em outro extremo, ‘naquele momento em que os eleitores brasileiros já não teriam mais oportunidade de ouvir o que pensam os candidatos que pleiteiam a presidência da República’, nas palavras de Bonner, Serra é enquadrado, durante todos os 30 segundos finais, em close-up, com fundo azul-tucano, em ângulo frontal, favorecendo uma imagem de proximidade, simetria, igualdade com o telespectador, não só oferecendo informações sobre sua proposta de programa de governo, como a candidata Dilma fora representada, mas demandando, olho-no-olho, que o/a telespectador/a votasse na direita conservadora brasileira.

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Doutora em Linguística, escreveu o livro Análise de discurso crítica da publicidade: um estudo sobre a promoção de medicamentos no Brasil (LabCom/Portugal,2010) e, em parceria com Viviane Resende, o livro Análise de Discurso Crítica (Contexto/São Paulo, 2006)