Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Uma longa tradição de conservadorismo

Jornais e revistas de grande circulação, as redes de TV e rádio de grande audiência, nestas eleições de 2006, mantêm sua longa tradição de apoiar forças de direita, conservadoras e contra a distribuição de renda no país. A opção por esse lado feita pela mídia fica evidenciada pela má cobertura do caso do dossiê contra José Serra. A mídia está apostando, com os demais apoiadores de Geraldo Alckmin, todas as últimas fichas da campanha no caso desse dossiê, procurando transformá-lo no grande escândalo que ele não é.

Com isso pretende dar alento à agonizante campanha do PSDB/PFL que até o momento não conseguiu empolgar a população e fazer frente ao projeto político do presidente Lula e do PT, prestes a ser reeleito. A atitude de tucanos e pefelistas e da mídia que lhe é forte aliada demonstra desespero na reta final da campanha, partindo para o jogo do “tudo ou nada” e, como maus perdedores, vendo que vão perder o jogo, tentam melá-lo e ganhar a eleição “no tapetão”, já que, no voto, as pesquisas demonstram muita dificuldade.

É importante que se diga que não é a primeira vez que a mídia brasileira apóia forças políticas do atraso:

** é a mesma mídia que foi fortemente contra o governo de JK;

** a mesma que foi contra o governo de Getúlio Vargas e seu projeto nacionalista e popular, levando-o ao suicídio;

** a mesma mídia que apoiou o golpe militar de 1964;

** a mesma que apoiou a ditadura (e hoje posa de santinha, dizendo que foi contra a ditadura ou escondendo que foi a favor);

** a mesma que abafou a campanha das “diretas já”;

** a mesma que na eleição de 1989 tentou convencer a população de que o Lula e o PT eram responsáveis pelo seqüestro do empresário Abílio Diniz;

** a mesma mídia que apoiou Collor e editou o debate final naquela eleição em favor dele;

** a mesma mídia que abafou a crise econômica e o fato de que o Brasil estava quebrado durante a eleição de 1998, para que assim FHC pudesse ser reeleito.

Essa mídia, que deveria ter por missão informar a população, assume a missão de julgar e condenar e faz isso de maneira precipitada com muita gente da sociedade, queimando na fogueira da má cobertura jornalística vários dos melhores quadros políticos do país, da mesma forma que fez no caso da Escola Base em SP. Nesse caso, a mídia pré-julgou e pré-condenou os proprietários dessa escola como pedófilos, os quais, antes de qualquer investigação consistente na Justiça, foram execrados publicamente, como as “bruxas” da Idade Média que eram queimadas em público na fogueira. Só agora, anos depois, vários meios de comunicação estão sendo condenados na Justiça a pagar indenizações aos donos da Escola Base, porque se investigou e se comprovou que eles não eram pedófilos coisa nenhuma.

Muitas semelhanças

No caso do dossiê contra José Serra é evidente que a grande mídia desviou o foco dos indícios de envolvimento de políticos tucanos na máfia dos sanguessugas, usando como cortina de fumaça o possível envolvimento do PT com a divulgação desses indícios. Como se adquirir informação e querer divulgá-las fosse um grande crime escandaloso que não é. Ir atrás de documentos que comprovam envolvimento de adversários em certas máfias pode até ser arriscado e suspeito, mas não tanto quanto a mídia tenta convencer a sociedade. O caso não tem nada que justifique todo esse alarde a não ser a vontade de certas forças políticas de melarem a eleição e desvirtuá-la, de modo que não reflita a vontade evidente da população.

No período medieval, muitas das chamadas bruxas não eram bruxas coisa nenhuma, eram pessoas denunciadas como tal por algum inimigo que queria se ver livre delas. Até certo ponto, no processo de caça às bruxas havia leis que determinavam que quando fosse comprovado que alguma denúncia de bruxaria era falsa, os falsos acusadores deveriam ser punidos severamente. Mas, com o tempo, a caça às bruxas, que já não era uma prática sensata, descambou mais ainda e aboliu a lei que protegia as pessoas contra falsas acusações. A partir daí, muito mais gente inocente foi queimada nas fogueiras, muitas pessoas que incomodavam pelo comportamento que desagradava pessoas conservadoras foram assim eliminadas.

A atitude da mídia brasileira em pleno século 20 e 21 tem muitas semelhanças com a medieval caça às bruxas: queima na fogueira da execração pública muitas pessoas contra as quais nada contra pesa de real. Entretanto, ela procura nos fazer acreditar que há fatos comprovados contra essas pessoas e que são graves, simplesmente porque são de pensamento político diferente da ideologia de direita encarnada por esses jornais, revistas, rádios e TVs. Se há ou não fato graves, seria interessante deixar a justiça investigar e julgar, pois esta função pertence ao Poder Judiciário e não à mídia.

Um basta

Entretanto, essa mídia, que tanto agiu contra a vontade da população com sucesso em tempos passados, parece já não ter o mesmo poder atualmente, porque vem há um ano e meio agindo intensamente para pôr o presidente Lula na fogueira e não consegue: ele vem mantendo sua larga vantagem nas pesquisas de intenção de voto. Ao que tudo indica o povo está vacinado, criou anticorpos. Não era para menos, depois de tantos anos de história em que a imprensa no Brasil vem se posicionando do lado errado e contra o povo, não era de se estranhar que começasse a perder a credibilidade. Se o povo ainda desse tanta crença à mídia, evidentemente Geraldo Alckmin estaria disparado na frente em todas as pesquisas, já que a grande mídia tão obviamente o apóia com unhas e dentes, mesmo que ainda tentando convencer alguns desavisados de que é imparcial e isenta.

Mas é importante que se diga que, na democracia, uma imprensa livre e democrática é necessária e ajuda o bom funcionamento das instituições. A mídia brasileira, salvo raras exceções, ainda não atingiu esse ideal de ser livre e democrática, ela pertence a algumas poucas famílias, é um oligopólio e defende certas oligarquias. É mais do que evidente que para melhorar o Brasil não será suficiente uma reforma política, é preciso fazer também uma reforma da mídia, é preciso democratizá-la, é preciso diversificá-la, para que ela não continue sendo propulsora de um pensamento único. Enquanto isso não acontece, é importante que os cidadãos conscientes desse país comecem a usar sua força contra esses meios de comunicação parciais que fazem má cobertura jornalística da vida política, deixando de assinar certos jornais e revistas e dando preferência a outros, deixando de dar elevadas audiências a rádios e TVs tão tendenciosas e favoráveis a forças políticas do atraso.

É hora de dizer um basta a essa má imprensa. O assinante tem força sobre jornais e revistas, pode cancelar suas assinaturas, o cidadão pode querer diversificar suas fontes, deixando de se informar apenas por certa poderosa rede de TV e suas afiliadas, bem como em rádios ligadas a esses oligopólios de comunicação. Seria muito bom se reforçássemos a opção por meios de comunicação melhores e alternativos como Carta Capital, Caros Amigos, Brasil de fato, pelo site Carta Maior, pelo site da Adital, pelo Observatório da Imprensa e outros e fôssemos deixando de acompanhar os que se acham senhores do destino nacional.

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Jornalista, Belo Horizonte