A crise econômica desencadeada ano passado nos Estados Unidos, decorrente do setor imobiliário daquele país, levantou a questão sobre o grau de intervenção do Estado na gestão da economia. Em tempos de liberalismo econômico e rios caudalosos e invisíveis de dinheiro que irrigam a economia global, tal questão parecia estar esquecida. Parecia. A participação da Casa Branca no episódio – injeção de bilhões de dólares para salvar o sistema financeiro, de difícil negociação no parlamento americano – foi decisiva para evitar o colapso. Já se passou um ano e a ciranda do capital especulativo volátil voltou. Não há dúvidas que nos próximos anos um novo solavanco irá sacudir a economia. Terá o Estado dinheiro suficiente para amenizar esse novo abalo?
Se, por um lado, o liberalismo econômico balança, pululam regimes intitulados de esquerda, especialmente na América Latina. Tais regimes – o de Hugo Chávez, na Venezuela, em particular – tentam contrapor, rivalizar ou questionar a legitimidade do liberalismo econômico enquanto modelo ideal de economia. Na geopolítica, estes governos respondem pela lacuna deixada pela União Soviética, embora muito longe estejam de exercer liderança tal qual os russos exerceram. Se idealizam um Estado democrático ou não, é fato que estes governos coexistem com uma necessidade que o modelo liberal não supre – o direito à elementar sobrevivência. O discurso populista de Hugo Chávez, Rafael Correa, Zelaya e Lula (mais discreto), entre outros, é direcionado aos que sobrevivem à margem das benesses do capitalismo de massa.
Os próceres da pseudo social-democracia
O Brasil, assim como a Índia, Rússia e China, tem seguido o receituário do liberalismo econômico, o que o alçou à condição de ‘país emergente’. Entenda-se como ‘emergentes’ países que entenderam muito bem como solidificar sua economia aplicando o chamado capitalismo de massa ou criando cenários para o consumo daqueles que outrora tinham baixo poder de compra. Não por acaso, as quatro nações acima citadas têm um grande contingente populacional. Todavia, não cabe alçar o Brasil, Rússia, China e especialmente a Índia ao patamar similar a países como a França, Espanha ou Noruega. O IDH – Índice de Desenvolvimento Humano medido pela ONU – Organização das Nações Unidas dos emergentes ainda está muito aquém de níveis básicos de qualidade de vida.
Com discurso descompassado segue a imprensa brasileira. Em linhas gerais, condena o intervencionismo do Estado à economia por entender que este tipo de prática é ultrapassado. Também entende que os governos ditos de esquerda são um atraso para as nações onde ora se instalam e mastiga excessivamente o discurso calcado da democracia. Condena Cuba, Venezuela, Honduras. Mas esquece da China, governo totalitário que agride os direitos humanos sem cerimônias. Por fim, não sabe exatamente o que fazer, ou o que fazer mais, com o governo Lula. De denúncias infundadas à criação de inúmeras CPIs, setores da imprensa brasileira continuam a fazer crítica sistematizada ao governo em defesa de seu próprio interesse ou dos grupos econômicos hegemônicos que defendem. Tamanha estratégia já tem como conseqüência a perspectiva de que no Brasil a corrupção segue incólume na seara da impunidade, como se nunca na história deste país tal fato jamais tivesse existido – especialmente quando o Brasil era governado pelos próceres plutocráticos draconianos da pseudo-social-democracia brasileira, niilista por excelência.
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Jornalista, Belo Horizonte, MG