Dia 15 de outubro de 2008. Eram quase 19 horas quando entrou no ar o programa SP Record. Seu apresentador anunciava, de forma insistente, que tinha com exclusividade, uma entrevista com Lindemberg, o rapaz que mantinha refém a ex-namorada. Havia 53 horas que o rapaz entrara no apartamento da família da namorada e a fizera refém.
O seqüestrador demonstrou por várias vezes estar inseguro com respeito à sua integridade física, incerto quanto aos seus objetivos e, o pior, demonstrou agressividade ao atirar contra policiais e jornalistas que se encontravam nos arredores do prédio em Santo André.
Diante do quadro de incerteza e perigo, ficam algumas perguntas: o que faz um ‘jornalista’ querer conversar com um seqüestrador nessa situação? Os produtores daquele programa entraram em contato com a polícia para saber se deveriam fazer esse contato? Se isso aconteceu, qual foi a postura da polícia? Será que a equipe do SP Record se imaginou no lugar da família, vendo ‘amadores’ fazerem o trabalho que cabe a profissionais da psicologia?
O fato deixa explícitas as manobras que as emissoras têm feito para vencer a ‘guerra’ pela audiência e conseguir o furo jornalístico. Nesse caso, percebe-se que para alguns a TV pode ser como uma mesa de cassino: ‘Eu aposto duas vidas. Você aposta a audiência?’
Quanta hipocrisia…
Em meio à confusão de valores, destaca-se José Datena, por ter colocado em prática o que prega a Federação Nacional dos Jornalistas.
O Código de Ética do Jornalistas Brasileiros diz que:
Art. 6° – É dever do jornalista:
VI – não colocar em risco a integridade das fontes e dos profissionais com quem trabalha;
Art. 7° – O jornalista não pode:
IV – expor pessoas ameaçadas, exploradas ou sob risco de vida, sendo vedada a sua identificação, mesmo que parcial, pela voz, traços físicos, indicação de locais de trabalho ou residência, ou quaisquer outros sinais.
O apresentador da Bandeirantes disse, de forma enfática, que não vale tudo para ter uma grande audiência. Segundo ele, produtores do seu programa ofertaram uma conversa com o seqüestrador, mas a oferta foi recusada por Datena.
Analisando o contexto, o ato de Datena até parece heroísmo. Entretanto, ele fez apenas o que um verdadeiro jornalista faria naquele momento: respeitar a vida, ou melhor, as vidas que estavam em risco naquele momento.
Depois do final trágico que as emissoras pareciam querer, fica o questionamento: por que ninguém admite que pode ter sido influente no desfecho do caso? Ora, se a polícia erra nas negociações, a polícia tem culpa. E se ‘jornalistas’ fazem esse papel, não deveriam também ter culpa? Quanta hipocrisia…
******
Estudante do 9º período de Jornalismo – UNEB, Juazeiro, Jaguarari, BA