Tuesday, 19 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

O jornal e a revista do futuro

Alguns anos atrás, o magnata da mídia Rupert Murdoch se uniu a Steve Jobs para criar o que seria o jornal do futuro. Dinheiro e genialidade de sobra deram com os burros n’água. O The Daily, exclusivo para Ipad, não durou nem dois anos. Foi o fim do sonho de que o advento do tablet traria a solução mágica para o minguante mercado de jornais e revistas.

O projeto de Murdoch/Jobs apostava no jornalismo multimídia – contar as histórias usando, além de texto e foto, também áudio, vídeo, gráficos animados e outras linguagens impossíveis no papel, mas libertadas pelo gênio da lâmpada do Ipad. Tudo muito bonito na teoria, mas caro de fazer e, no final das contas, não tão encantador a ponto de trazer o número necessário de assinantes.

Desde então, as tentativas de inventar o futuro da mídia foram sempre mais modestas. E, em muitos casos, bastante confusas. Um caso exemplar é o do The New York Times, como se viu recentemente com o vazamento de um estudo interno, altamente confidencial, sobre a transição do papel para o digital. Em um relatório de cerca de cem páginas, a empresa mostra em detalhes o quanto também está perdida nesse caminho.

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É ao mesmo tempo angustiante e desafiador tentar encontrar o substituto do jornal e da revista como conhecemos hoje. Ao contrário de muitos colegas, acredito que o jornalismo em si não está ameaçado. Vai acabar se adaptando aos tempos e encontrará novas formas de financiamento. Ou, como bem resumiu o jornalista Xico Sá: “Jornalismo é que nem barata; não vai desaparecer nunca”. O problema está mais na sobreviência das empresas de mídia tradicionais.

Desconfio muito de quem acredita na existência de balas de prata. Na minha opinião, o caminho será gradual, com muitas tentativas e pequenos avanços. E, como sempre, os avanços de uns serão rapidamente copiados por todos.

Foi assim, por exemplo, com o chamado “paywall poroso”, sistema que oferece conteúdo grátis para internautas que acessam pouco o site e cobra dos leitores assíduos. Popularizado pelo Times, correu o mundo. No Brasil, dez dos trinta maiores jornais já copiaram o sistema.

Uma novidade que parece estar se tornando padrão lá fora, mas ainda não se espalhou tanto por aqui, diz respeito à forma como o conteúdo é apresentado aos leitores em sites e aplicativos para tablet ou celular. É a tendência da “barra de rolagem contínua”, que vai mostrando conteúdos em uma sequência aparentemente infinita, um abaixo do outro, diferente do modelo tradicional de home pages com várias colunas de títulos e fotos, que exigem malabarismos dos olhos, e matérias que se abrem em páginas exclusivas.

Inspirado no Facebook, que acostumou as pessoas a ler assim, esse sistema foi introduzido no jornalismo pelo portal americano Quartz, há dois anos. Desde então, diversos sites de notícias decidiram trilhar o mesmo caminho. Este ano, foi adotado, por exemplo, pelos sites da Time, maior revista semanal de informação do mundo, e da NBCNews, nos Estados Unidos (no Brasil, o portal Terra lançou um modelo semelhante, com rolagem contínua, mas mantendo as colunas da home page tradicional).

Na Time, a taxa de rejeição, que mede o quanto os leitores abandonam o site na primeira página visitada, caiu 15% após a mudança. Além de agradável ao leitor, a rolagem contínua é boa para a publicidade, que deixa de ficar segregada em um lugar que os olhos podem ignorar para entrar novamente na sequência da leitura, como acontece no folhear de uma revista ou de um jornal.

Para chegar ao nível de sofisticação do Facebook, falta desenvolver um algoritmo capaz de identificar automaticamente os gostos da freguesia e entregar para cada leitor uma sequência exclusiva de conteúdos. Mas essa talvez já seja uma missão grande demais para as combalidas e escaldadas empresas de mídia, que, a exemplo de Murdoch, torraram muito dinheiro nos últimos anos tentando desbravar o futuro.

Um passo de cada vez.

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Demetrius Paparounis é jornalista, consultor em comunicação e diretor da TAG Content.