No interior do Brasil, tal como em quase todo o mundo, a adequação das operações jornalísticas a modelos de negócio em melhor sintonia com as tecnologias, os processos e os hábitos contemporâneos de produção, distribuição e consumo de informação estão no topo da pauta dos gestores da área.
Apesar de não haver respostas definitivas, há documentos e referências circulando em abundância sobre o tema. Como usar a superdistribuição em rede do conteúdo dos jornais a seu favor? Como alocar, exibir, precificar, vender e aferir resultados da publicação de anúncios em novas plataformas? Como gerar receita para além da venda de publicidade e assinaturas? Como adicionar outros serviços de interesse do leitor, e como cobrar por eles? Como relacionar-se com a nova geração de leitores? Et cetera.
O fato, porém, é que não tem sido fácil para os gestores de centenas de veículos jornalísticos de pequeno e médio porte, país afora, traduzir para a realidade de sua empresa e para o cotidiano de sua praça o que diz essa pilha de relatórios, recomendações, análises de cenários, roadmaps e documentos de visão estratégica que aportam semanalmente em nossos emails ou em sites especializados, geralmente produzidos a partir do ponto de vista de grandes jornais internacionais ou metropolitanos.
No setor comercial dos pequenos e médios jornais, o pragmatismo de quem está acostumado a “trazer o dinheiro para dentro de casa” tampouco favorece a absorção de peças textuais extensas e complicadas, por mais brilhantes que sejam seus relatos e conclusões. O que, exatamente, devo fazer com minha equipe de vendas? Como posso diferenciar a proposta de valor do meu jornal online em relação ao impresso? Como posso operar novos serviços comerciais na internet sem drenar os meus clientes dos anúncios classificados?
Para entender como alguns jornais do interior do Brasil estão, ou poderiam estar, reorganizando seus negócios frente a esses desafios, o Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo organizou, ao longo dos últimos meses, por meio de seu projeto Grande Pequena Imprensa, uma série de visitas a cinco veículos selecionados, em três diferentes cidades paulistas, uma no estado do Rio de Janeiro e outra no Mato Grosso do Sul.
Convidado a participar do projeto como pesquisador, junto a outros dois consultores especializados, pudemos realizar entrevistas com diretores e proprietários dos jornais, coletar dados importantes sobre o mercado em que atuam e vislumbrar algumas possibilidades com o objetivo de traçar uma rota de sucesso para que esses jornais, assim como outros em situação semelhante, possam não apenas sobreviver a esse tempo, mas, a partir dele, prosperar.
Para sintetizar alguns resultados ainda parciais desse levantamento, foi elaborada e compartilhada com os jornais visitados uma lista de apontamentos que indicam ações capazes de ajudar esses veículos a se prepararem e adequarem ao menos uma parte de suas operações – no caso, o setor comercial – para os desafios que têm diante de si.
Seguindo um formato popular na internet – como faz, por exemplo, o site Buzzfeed –, essa lista foi elaborada com 10 tópicos, todos começando a letra “erre”. Seu propósito é identificar ações comerciais estratégicas que podem ser adotadas por esses jornais no esforço de revisar, redefinir, reinventar, reposicionar, rever e reciclar suas atividades, também refutando posições desvantajosas e retendo ou recuperando aquilo que pode representar vantagem competitiva nesse cenário.
A lista
1. Revisar o mapeamento do mercado de mídia local, identificando, comparando e monitorando novos concorrentes por publicidade e novas fontes de informação e de mediação de negócios em âmbito local e regional (revistas, classificados, guias, e-commerce, clubes de desconto, sites, blogs, portais etc.);
2. Redefinir o modelo de negócio da empresa, atualizando a proposta de valor que justifica seus produtos e serviços e diversificando suas fontes de receita para além da venda de anúncios e de assinaturas, incorporando serviços com apelo local e novas modalidades de publicidade e de cobrança por acesso ao conteúdo;
3. Reinventar-se, não mais apenas como um jornal, e sim como uma empresa de mídia que opera uma cesta de produtos e subprodutos impressos e digitais, dentre os quais o jornal pode e deve ser ainda o carro-chefe, atuando como fiador de credibilidade para uma série de outros serviços mantidos em sua órbita;
4. Reposicionar o produto principal da empresa em mídia digital, fazendo-o evoluir de um site de notícias (geralmente, a versão online do jornal impresso) para um portal de informação, serviços e entretenimento, com foco em conteúdos e negócios da cidade e da região, atraindo novos públicos e novos clientes;
5. Refutar a percepção de agências e anunciantes locais de que os anúncios em meio digital são secundários e pouco valiosos em comparação com os anúncios impressos, evitando ofertá-los como bônus ou cortesia para clientes tradicionais e, sim, dotando-os de valor específico e de função diferenciada em relação àqueles;
6. Rever a política de metas da equipe de vendas, atribuindo metas específicas para cada produto e subproduto de mídia impressa e digital, separadamente, com bônus de sucesso sobre a remuneração variável e prêmios especiais como incentivo aos vendedores na fase de lançamento comercial de novos subprodutos e serviços;
7. Reciclar os conhecimentos, as técnicas e os argumentos utilizados pela equipe de vendas, oferecendo treinamento contínuo e incentivo à aprendizagem sobre o mercado de mídia digital e suas ressonâncias no mercado de mídia impressa, por meio de cursos, workshops, palestras, eventos, livros, relatórios etc.;
8. Recuperar e utilizar sistematicamente os dados oriundos de medidas de tráfego e do monitoramento do comportamento da audiência on-line para o planejamento de campanhas comerciais junto a novos segmentos do público leitor e ao mercado anunciante, identificando padrões, correlações, tendências e oportunidades;
9. Reter, organizar e fazer uso estratégico das informações reunidas pela equipe comercial sobre clientes potenciais e efetivos e suas respectivas campanhas publicitárias, por meio de CRM e outros recursos de relacionamento, de modo a orientar a prospecção de clientes e amparar ações de marketing;
10. Reunir, em ação consorciada com outros veículos parceiros do interior, uma escala de leitores suficiente para participar da venda conjunta de espaços publicitários a grandes anunciantes na internet, estudando condições para a possível formação dessa rede e planejando diretrizes para seu modelo de gestão.
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Francisco Rolfsen Belda é jornalista e professor na Unesp-Bauru