Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Os jornais locais sempre ajudaram suas comunidades

Em meus tempos de repórter iniciante, logo aprendi que o jornalismo local é muito mais que a simples veiculação de uma notícia. O mais importante é oferecer informação, seguramente a chave mestra deste trabalho. Mas o jornal realmente se fortalece quando age em nome dos leitores. É forçar as coisas se rotularmos essa ação de “jornalismo de campanhas”. É muito mais sutil do que isso.

Um exemplo simples ilustra o trabalho desenvolvido no “Barking Advertiser”, em 1965. Um muro foi erguido no centro da principal rota rodoviária, que ligava o subúrbio de Barking, no leste de Londres, ao centro da cidade, a fim de impedir as pessoas de atravessarem o que era uma via perigosa. Havia apenas uma passarela para pedestres e mal situada. Muitas pessoas, portanto, a ignoravam, preferindo brincar com a morte ao escalar um muro entre carros e caminhões circulando em alta velocidade.

O editor enviou um fotógrafo para flagrar os escaladores do muro e um repórter para lhes perguntar por que estavam fazendo aquilo. E publicou uma foto de primeira página dos escaladores com uma história na qual eles explicavam suas frustrações.

Nada aconteceu. Então, na semana seguinte, ele persuadiu um grupo de vereadores a passar algumas horas observando as pessoas escalando o muro e publicou reportagem sobre essa visita, com novos depoimentos de escaladores, com a opinião da polícia e cartas de moradores com reclamações sobre a localização da passarela. Resultado: o Conselho local (espécie de subprefeitura) reviu a situação e concordou com a construção de nova passarela. O muro também foi levantado. A escalada parou. Ninguém morreu. Ninguém ficou ferido.

O “Barking Advertiser” agiu em nome de sua comunidade, como fez em várias outras “campanhas” semelhantes e discretas durante os três anos e meio em que eu estive na equipe. Um de seus atos pioneiros mais memoráveis foi arrecadar milhares de libras para ações de caridade, promovendo caminhadas anuais bem antes de elas se tornarem populares. A ideia surgiu a partir das preocupações com as dificuldades de financiamento de projetos comunitários locais.

Verdades eternas

Menciono tudo isso porque meus olhos se arregalaram quando me deparei com uma postagem no portal GigaOm, afirmando solenemente: “O jornalismo não é apenas informar os leitores, é também ajudá-los a tomar uma atitude.” Oh! Jornais locais (e nacionais) de sucesso na Grã-Bretanha sempre foram proativos. Editores que ouvem os problemas dos seus leitores não apenas os comunicam; eles fazem o seu melhor para ajudar. E sempre foi assim.

O autor na postagem no GigaOm, Mathew Ingram, pareceu surpreso com os esforços para arrecadação de fundos do “Manchester Evening News” (MEN), após um incêndio em um canil em 11 de setembro (observe-se que ele é canadense e talvez seja menos comum os jornais de lá se empenharem numa campanha dessas). Certamente, a resposta ao MEN foi incrível. O jornal informou que 1 milhão de euros (cerca de R$ 3 milhões) foi doado ao canil em um período de 24 horas. Mas a ideia de lançar a campanha não era nada nova. E o resultado é o que você esperaria.

Mesmo David Higgerson, o normalmente sensato diretor digital do grupo “Trinity Mirror”, parecia pensar que a iniciativa de “apenas doar” havia sido extraordinária, qualificando-a de “um momento de genialidade do jornalismo digital”. Não, não foi. As ferramentas digitais foram fantásticas, porque permitiram às pessoas doar dinheiro instantaneamente. Mas, não precisa ser um gênio para sugerir que um jornal local deveria tentar levantar dinheiro após uma tragédia local. Enfim, em vários pontos do seu blog, David deixou claro que essa era uma lição aprendida há muito tempo pelos editores.

“Bons jornalistas”, escreveu ele, “particularmente aqueles que trabalham em pequenas comunidades, sempre tiveram a habilidade de perceber quais as questões que estão em evidência em termos de interesse de uma comunidade.” Sim, eles tiveram e têm essa habilidade. Esse foi o jornalismo de então e é, ou deveria ser, o jornalismo atual, se sobrepondo às alegações de que, de alguma forma, foi transformado, ou até mesmo recriado pelo mundo digital – uma posição claramente errada em relação ao jornalismo tradicional.

Higgerson escreveu ainda: “As salas de redação do futuro precisam estar cheias de profissionais capazes de estar em sintonia com as comunidades que se formam na região, seja em torno de um evento ou de um problema”. Claro que sim, mas esse pensamento não é novo. Isso é o mesmo que ensinar um padre a rezar a missa e é mais um exemplo da maneira pela qual alguns ‘missionários’ digitais superestimam o significado das novas ferramentas, investindo nelas de forma mística.

Na realidade, existem verdades jornalísticas eternas, uma das quais é ser parte de uma comunidade e atuar em seu favor. Essa tem sido uma espécie de segunda natureza para editores e jornalistas que cresceram dentro do jornal impresso.

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Roy Greenslade, do Guardian