Tuesday, 19 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Jornal com sotaque ‘arretado’ faz sucesso na Rocinha

Um jornal com sotaque “arretado”, voltado para os nordestinos que vieram morar na Rocinha, está fazendo sucesso na comunidade – e também fora dela. O “Fala Roça”, que circula a cada dois meses e está em sua quinta edição, chamou a atenção do consulado dos Estados Unidos, que, no ano passado, pagou a passagem para que o idealizador do projeto, Michel Silva, de 21 anos, fosse conhecer as principais redações de Nova York.

Depois de ver de perto como trabalham o “New York Times” e a “CNN”, Michel, que estuda jornalismo na PUC, visitou veículos menores, como a redação de um periódico no Harlem, com tiragem de 50 mil exemplares. Voltou com mais vontade de apostar no jornalismo comunitário.

Michel se emociona ao lembrar que que moradores da parte mais alta da Rocinha só souberam da morte de um artista plástico querido na comunidade seis meses depois, graças ao jornal. E cita uma reportagem que mobilizou a Rocinha. Uma alemã, que visitara a comunidade ciceroneada por uma moradora, pediu ajuda para localizar a moça, chamada Goretti. Mas ela voltara para o Nordeste sem deixar contato.

– Fizemos uma manchete chamada “Procura-se Goretti”. Uma moradora do Nordeste, que nos acompanhava pela internet, ligou e passou os contatos.

Uma ideia na cabeça e prêmio de R$ 10 mil na mão

A ideia de criar o impresso nasceu em 2012, quando a Rocinha recebeu a primeira Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) e, com ela, a Agência de Redes para a Juventude, que trabalha com jovens entre 15 e 29 anos. Os moradores recebem estrutura para desenvolver suas ideias, desenvolver parcerias e montar projetos dentro da comunidade. Ao final do ciclo, passam por uma banca e concorrem a R$ 10 mil em prêmios para investir em sua ideia.

– Elaborei com uns amigos o projeto e não acreditamos quando ganhamos o apoio de R$ 10 mil. Começamos a fazer as reuniões de pauta na minha casa e vimos que poderíamos rodar, por cerca de mil reais, cinco mil exemplares. Hoje me sinto especial ao ver o sorriso do morador nordestino abrindo a porta para receber o jornal de graça – diz Michel.

O jovem, que conta com a apoio da PUC-Rio, onde cursa o segundo período de jornalismo, sonha em elevar as tiragens do “Fala Roça” para 15 mil exemplares e também vislumbra, no futuro, ter condições para construir a redação do jornal na comunidade:

– Prestei bastante atenção na viagem que fiz. Constatei que, diferente do Brasil, nos Estados Unidos o governo e as empresas privadas investem nos jornalistas comunitários. O Harlem, por exemplo, atinge uma tiragem de 50 mil exemplares e funciona numa redação de quatro andares. Ele praticamente esgota as vendas em todas as edições. Ainda há muito o que se fazer no Brasil e, se depender de mim, uma pequena parte já está sendo feita na maior favela do Brasil.

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Alessandro Lo-Bianco, do Globo