Em evento cultural realizado neste ano, em Porto Alegre (RS), a holandesa Saskia Sassen, uma das sociólogas mais respeitadas do mundo, enfatizou a necessidade de reforçarmos os pilares de nossa sociedade por intermédio da voz que ecoa das zonas urbanas. Para tanto, ela ponderou um dado alarmante: entre 2013 e 2014, empresas multinacionais investiram cerca de 600 bilhões na compra de áreas dentro das 100 maiores cidades do mundo. O objetivo? Criar polos de negócios, megaprojetos econômicos.
Ela cita o caso de Londres. “Os sheiks do Catar têm mais áreas no centro da capital do que a própria rainha da Inglaterra”, frisou. A crítica de Saskia é um tiro no coração do capitalismo pós-moderno. A postura predatória dos grandes empreendimentos, nacionais e estrangeiros, deixa as regiões urbanas densas, mortas. O desfecho é o afastamento dos pequenos empreendedores e o agravamento das desigualdades.
Atento a essa realidade – também registrada em solo brasileiro –, o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) decidiu inovar. A segunda-feira (5/10) marcou o dia do #compredopequeno, uma campanha que visa a estimular o consumo de produtos e serviços dos pequenos empreendedores. Adepto da iniciativa, pensei em como transmutá-la para o contexto da comunicação. Concluí que existem infinitas possibilidades.
A mídia é um cenário público onde diversas pessoas e entidades se manifestam. A imprensa corresponde a grande parcela dos discursos sociais, de modo que não há quem possua o poder de repercussão dos veículos de comunicação. Empresas importantes, como Folha de S.Paulo, O Globo e Estadão estão solidificadas nas referências do mercado jornalístico. Mas sabe o que seria sensacional? Comprar do “pequeno” que usa a comunicação para garantir o seu sustento.
Empreendedorismo é a chave
Com as vagas nos veículos cada vez mais escassas, o desemprego constitui realidade tangente a um grande volume de jornalistas – no país inteiro. As opções mercadológicas são aguardar a abertura de novas contratações, algo improvável em face da crise no país, ou empreender, fugindo da velha falácia de que só é profissional quem trabalha em jornais, rádios, TV’s ou internet.
O empreendedor em comunicação contribui para a descentralização da mídia. Em termos de apuração, por exemplo, leio sazonalmente sobre o surgimento de agências que ofertam a produção de reportagens para diferentes plataformas. Trata-se de uma considerável inovação. A audiência se beneficia pela democratização da informação, antes refém da linha editorial dos grandes veículos.
Que surpreendente, não? Nem todo profissional aceita passivamente as dificuldades do mercado. Portanto, “comprar do pequeno” no jornalismo é apoiar essas iniciativas. Mas não apenas em nível de reportagem. Há empresas de produção de conteúdo, assessorias de imprensa, portais verticais, jornais no interior etc. O difícil é ter a coragem para ser chefe, e não um empregado passível, a qualquer momento, de sofrer uma dolorosa demissão.
Como Saskia Sassen disse, os megaprojetos deixam as zonas urbanas densas. Creio que relação semelhante pode ser registrada nos veículos de comunicação tradicionais, que ofertam uma linha específica de newsmaking. Empreender, dentro de um modelo de democratização do conhecimento, tornou-se necessidade para os jornalistas. Com esforço e entusiasmo, as novas empresas de comunicação podem se constituir em uma alternativa análoga às já consagradas na preferência do interlocutor.
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Gabriel Bocorny Guidotti é bacharel em Direito e estudante de Jornalismo