Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Estratégias de sobrevivência para o jornalismo local

O “San Francisco Bay Guardian”, um semanário alternativo altamente popular entre os progressistas de San Francisco (costa oeste dos EUA), anunciou em outubro passado em seu site, de forma repentina, que sua próxima edição seria a última. Glenn Zuehls, o editor da empresa controladora do jornal, a San Francisco Media Company, disse na época que o “Guardian”, que tinha sua receita baseada na publicidade, não era rentável.

Os sete membros da equipe editorial do jornal se reuniram no Muddy Waters, um café situado no nº 521 da rua Valencia, para discutir seu futuro e o que cada um deles poderia fazer, mas ninguém tinha grandes idéias. Negócios atrelados à mídia local não pareciam prosperar. Marke Bieschke, o editor executivo, teve a ideia de produzir um zine feito a mão, embora duvidasse que com ele iria ganhar dinheiro (fanzines, ou simplesmente zines, são meios de comunicação independentes). Steven T. Jones, editor do jornal, pensara que teria vários meses de folga, talvez em viagens de avendura de bicicleta. Outros planejavam procurar empregos diferentes, talvez em outros setores.

Mas, velhos hábitos custam a morrer. Em 15 de abril (uma quarta-feira), Jones publicou a primeira do que será uma série de colunas ao estilo do “Guardian”. Foi veiculada em uma nova plataforma chamada Byline, que facilita a produção de reportagens bancadas por financiamento coletivo – uma espécie de Kickstarter para jornalismo (referência ao site vinculado ao “The Guardian” britânico) –, um projeto que permite às pessoas contribuírem online para ajudar a financiar reportagens e textos sobre determinado tema ou com característica permanente. Jones disse que tem conversado com outros ex-funcionários do extinto “Guardian”, que também poderão participar desta iniciativa. Através do projeto, a Byline espera incentivar uma espécie de renascimento do espírito do “Guardian”.

Em paralelo, Marke Bieschke está se preparando para participar da “48 Hills”, uma publicação on-line local sem fins lucrativos, criada por um ex-editor do “Guardian”, Tim Redmond, que tem como objetivo produzir o tipo de investigação e de jornalismo de interesse público que deu fama à publicação semanal. A “48 Hills” foi lançada há mais de um ano, com um orçamento anual superior a US$ 100 mil. Conta com algum reconhecimento entre experientes jornalistas locais e Redmond está procurando expandi-la.

Publicidade

Esses empreendimentos chegam em outro momento difícil para o jornalismo local, tanto em San Francisco como em outros lugares. Na semana passada, o “Bold Italic”, um popular blog sobre cultura da Bay Area (área da baía de San Francisco) foi encerrado com uma mensagem curta e sem assinatura – “Nós tomamos a difícil decisão de deixar de operar.” (A porta-voz da Gannett Company, editora do site, não quis fazer mais comentários.) O “San Francisco Chronicle” também tem enfrentado desafios financeiros, assim como outros tradicionais jornais da cidade. A Bay Area não é, evidentemente, o único lugar onde o jornalismo local está sofrendo. Parece haver, a cada mês, um ou outro jornal diário ou semanal sendo fechado. Nesse cenário, cada novo anúncio é surpreendente e é preocupante. As pessoas parecem estar de acordo sobre dois pontos: o jornalismo local cumpre uma importante função democrática e,  ao mesmo temp – pelo menos no formato atual -, está condenado.

Uma lição deixada por esse estressante cenário de fechamento de veículos é a constatação de que a publicidade, sozinha, não consegue sustentar empreendimentos  noticiosos locais, mesmo que sejam somente on-line, cujos custos são mais baixos do que os dos jornais tradicionais. Receitas obtidas com publicidade on-line tendem a estar atreladas ao número de vezes que determinada página é visualizada na rede. E as municipalidades – mesmo de cidades grandes como San Francisco – atraem poucos page views, incapazes de gerar receitas suficientes para sustentar um bom jornalismo. “O velho modelo publicitário poderia ser uma parte do mix, mas, tendo visto os problemas que tivemos no “Guardian” e na indústria de notícias em geral, simplesmente não dá para confiar que displays publicitários na web possam levar ao patamar em que você precisa estar para ser uma organização de notícias sustentável”, afirmou Steven T. Jones, ex-editor do “Guardian”. Outras pessoas ouvidas sobre os desafios do jornalismo local ecoaram o mesmo sentimento.

A conscientização de que a publicidade por si só não é um modelo sustentável para jornais locais tem levado algumas empresas e organizações sem fins lucrativos a olhar para outras abordagens. A Fundação Knight, que ajudou a financiar iniciativas de jornalismo local sem fins lucrativos, publicou em meados de abril o terceiro de uma série de relatórios, iniciada em 2011, sobre a forma como empreendimentos focados em cidades ou estados específicos têm avançado em direção à sua sustentabilidade financeira. (A Fundação Knight financiou muitos deles.) O relatório deste ano contém alguns detalhes fascinantes, incluindo os orçamentos de 2013 dos vinte empreendimentos estudados pela fundação. Os gastos, naquele ano, variaram de menos  de US$ 50 mil (caso do “The Rapidian”, de Grand Rapids, no estado de Michigan, que foi lançado em 2009 e teve três funcionários) a mais de US$ 7 milhões (caso do “Texas Tribune”, fundado em 2009, que abrange o estado de Texas e empregou 42 pessoas). Dezessete das vinte publicações tiveram orçamentos inferiores a US$ 1 milhão.

O relatório coloca uma de suas descobertas mais importantes em termos contundentes: “Veículos sem fins lucrativos continuam a ser muito dependentes do financiamento de uma fundação e poucos parecem estar se aproximando rapidamente de um modelo sustentável de negócios”, o que lhes permitiria viver sem subsídios. As organizações de notícias garantem, em média, cerca de 58% das suas receitas através de subsídios de uma fundação e outros financiamentos. Rendimentos do trabalho (a partir de fontes como publicidade, patrocínio de empresas, produçãos de reportagens com outros veículos etc.) representam 23%, enquanto doações individuais ou taxas de adesão representam 19%. Jonathan Sotsky, diretor de estratégia e avaliação da Fundação Knight, afirma: “Muitos desses sites são criados por antigos jornalistas, mais focados na parte editorial” e menos em um modelo de receita que sustente a publicação. “Você pode ter um grande conteúdo, mas se você não criar um modelo de negócio sustentável, não verá as luzes acesas por muito tempo”, diz Sotsky.

Do ponto de vista financeiro, os mais bem-sucedidos empreendimentos locais de mídia tendem, segundo Sotsky, a ser aqueles que definem metas monetárias específicas com antecedência. Sites que tentaram a geração de novas fontes de rendimento do trabalho, além das convencionais, como a publicidade, também tiveram retorno, assim como aqueles que deixaram de buscar doadores para atrair assinaturas de clientes com acesso exclusivo a conteúdos e eventos especiais.

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Vauhini Vara, da New Yorker