Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

‘The Huffington Post’ pode ficar sem a fundadora

Nos dois últimos anos, uma série de companhias de mídia, capitalistas de risco e indivíduos abastados experimentou adquirir discretamente uma participação em “The Huffington Post”. O valor de mercado estimado, segundo pessoas informadas sobre o assunto: cerca de US$ 1 bilhão.

Falando sob condição de anonimato, essas pessoas disseram que entre os interessados estavam as companhias europeias de mídia Le Monde e Axel Springer; o fundador do Napster, Sean Parker e a empresa de private equity General Atlantic.

Algumas das conversas navegaram pelo AOL, a companhia controladora do “The Huffington Post”, que buscava meios de levantar dinheiro. Outras via a bem relacionada fundadora do site, Arianna Huffington.

Mas quando a música parou, no mês passado, e foi anunciada a compra do AOL pela Verizon por US$ 4,4 bilhões, “The Huffington Post” ainda pertencia ao AOL – criando um improvável lar corporativo para uma das principais distribuidoras liberais de notícias do país.

Segundo executivos da Verizon, a principal razão para a compra foi a tecnologia de publicidade do AOL, o que não deixa claro o que ela poderia querer com “The Huffington Post”, e como uma relação entre eles poderia funcionar. Tampouco está claro se a independente Huffington ficará confortável operando dentro da Verizon. Seu contrato expirou este ano, e ela ainda não assinou um novo, o que coloca a perspectiva de um “The Huffington Post” sem uma Huffington.

Num memorando que enviou à direção do site na semana passada, ela delineou planos ambiciosos. “The Huffington Post” tentará crescer globalmente e expandir sua operação de vídeo, adicionar à sua rede blogueiros não remunerados, substituir artigos de agências noticiosas por reportagens originais e aumentar as ofertas de humor e estilo de vida. Ele poderia até fazer aquisições próprias, segundo uma cópia do memorando obtida por “The New York Times”.

Mas Huffington disse a amigos, segundo uma pessoa informada sobre as conversas, que não está certa de que esses planos serão executados sob a tutela da Verizon. O dilema deixou o site numa espécie de limbo enquanto cada lado se prepara para fechar o negócio, esperado para o próximo mês.

A venda ocorre num momento crucial do “Huffington Post”, que o AOL adquiriu em 2011 por US$ 315 milhões. O site foi fundado há dez anos e construiu seu crescimento com base numa agregação incansável e no aprimoramento do mecanismo de busca. Em 2010 e 2011, contratou vários jornalistas de boa reputação e procurou ampliar sua produção de notícias. Em 2012, ganhou um Prêmio Pulitzer por reportagem nacional. Alguns de seus jornalistas mais louvados saíram, porém, enquanto circularam relatos sobre uma redação desmoralizada e exigências caprichosas de Huffington, que também cultivava interesses secundários em bem-estar e cultura do local de trabalho.

Recentemente, o site procurou fortalecer de novo sua reportagem, abrindo espaço para matérias mais profundas e querendo substituir artigos de agências noticiosas por jornalismo original. “Ele coloca essa questão maior”, disse o analista de mídia Ken Doctor. “Quando se tem empresas jornalísticas pertencentes a companhias que não têm um legado jornalístico, o que ocorre quando há pressões intensas?” Na BBC ou em “The Guardian”, disse ele, “sabe-se que o legado está lá; sabe-se que vai haver tamanha resistência que a integridade editorial será mantida”. Isso não está claro com os novos players como a Verizon, disse.

Fenômeno

“The Huffington Post” está no centro de um fenômeno que alguns descrevem como o nascimento de um novo establishment de mídia: várias startups digitais, entre as quais BuzzFeed e Vice, estão tentando levantar a apresentação noticiosa como os canais a cabo invadiram a televisão aberta nos anos 1980. Por essa medida, alguns no setor disseram, US$ 1 bilhão é um valor razoável para um site com mais de 200 milhões de visitantes únicos por mês, e adquiri-lo é uma jogada astuta da Verizon, que procura seguir os passos de outras companhias de mídia, como a Comcast, e ter seu próprio conteúdo.

Outros veem um mercado frívolo que acarretou valorizações excessivamente altas para companhias de mídia, baseadas em grande parte na formação de marca e num foco incansável em técnicas de desenvolvimento de audiência. As tensões inerentes entre Verizon e Huffington não são difíceis de perceber. A Verizon tem um viés conservador. “The Huffington Post” é uma das vozes liberais mais conhecidas dos EUA. A Verizon é contra a neutralidade da rede, a noção de que provedores de serviços de banda larga devem tratar todos os dados da mesma maneira. “The Huffington Post” a defende. A Verizon cooperou com ordens judiciais do governo para entregar registros telefônicos.

“The Huffington Post” fez campanha contra aos programas de coleta de dados em massa da Agência de Segurança Nacional.

“The Huffington Post” e Arianna Huffington não quiseram comentar para este artigo. A Verizon se recusou a colocar algum de seus executivos à disposição.

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Ravi Somaiya, do New York Times