Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Facebook ajuda neonazistas na guerra da informação na Ucrânia

Ao assumir atitudes simpáticas à milícia neonazista Batalhão Azov que enfrenta as tropas russas na Ucrânia, a rede social Facebook entrou em contradição aberta com sua auto definição como plataforma tecnológica sem interferência nos conteúdos que dissemina. 

O primeiro indício da mudança de posição da maior rede social da internet surgiu já em meados de fevereiro quando o Intercept , versão norte-americana, informou que o Facebook passou a tolerar a disseminação de notícias e elogios ao Batalhão Azov no ataque às forças russas nas regiões separatistas de Donetsk e Luhansk, no leste da Ucrânia.  

Mas a institucionalização da guinada ultraconservadora da rede social criada e dirigida por Mark Zuckerberg veio no dia 10 de março quando a agência Reuters revelou que o conglomerado Meta Platforms, que controla o Facebook, Instagram e WhatsApp, autorizou a publicação de mensagens favoráveis ao assassinato de dirigentes e soldados russos envolvidos na invasão da Ucrânia.

A Reuters se baseou na troca de mensagens internas entre dirigentes da Meta nas quais se afirmava que a autorização era temporária e restrita aos seguintes países: Armênia, Azerbaijão, Estônia, Geórgia, Hungria, Letônia, Lituânia, Polônia, Romênia, Rússia, Eslováquia e Ucrânia. 

A ressalva da temporalidade e da regionalização esconde a hipocrisia da medida adotada pelo Facebook porque todo mundo sabe que conteúdos postados numa rede social não obedecem a fronteiras terrestres e ficam disponíveis online por tempo indeterminado. 

Também ficou evidente que as empresas de Zuckerberg aderiram à militância xenófoba anti-russa que contaminou grande parte dos meios de comunicação jornalística e as empresas de tecnologia da informação. Mas o que chama mais a atenção é o fato do Facebook e Instagram estarem tolerando a ação de grupos neonazistas na Ucrânia, um contrassenso quando se sabe que Zuckerberg tem origem judaica. 

Extremismo escancarado

Foto publicada no blog Nexta mostrando o treinamento de membros do Batalhão Azov, em Kiev. Um participante, à direita na foto, ostenta no ombro o escudo Wolfangel.

O Batalhão Azov, que nunca dissimulou sua postura neonazista, surgiu em 2013 quando grupos anticomunistas promoveram uma onda de manifestações na Ucrânia que culminaram, em fevereiro de 2014, com a derrubada do governo eleito do presidente Viktor Yanukovych. A partir desta dat, o Batalhão Azov foi oficializado pelo governo de Volodimir Zelensky como uma unidade de operações especiais, e em 2017 recebeu a missão de eliminar os grupos separatistas na região de Donbass, no leste do país. Já nesta época os membros do Azov, estimados em aproximadamente 300 extremistas de direita, recebiam armamentos e orientação estratégica de militares canadenses e norte-americanos. O grupo tem também subgrupos como o Centuria e Forest Brothers. O Centuria foi objeto de um estudo feito pelo Instituto de Estudos sobre Europa, Rússia e Eurásia, da Universidade George Washington. Forest Brothers (Irmãos da Floresta) foi o tema de um vídeo produzido ,em 2017, pela OTAN.

O atual Regimento Azov, da Guarda Nacional (exército) da Ucrânia foi o primeiro a receber, no final de fevereiro último, armamentos norte-americanos e britânicos, mesmo ostentando publicamente no seu distintivo símbolos nazistas como o Wolfangel (do alemão armadilha para lobos) e o Sol Negro. 

Da esquerda para a direita: o distintivo oficial do Azov atual; a identificação (Wolfangel) dos integrantes da SS na Alemanha Nazista; e o Sol Negro, símbolo dos neonazistas contemporâneos. Mais detalhes aqui.

Veículos da imprensa ocidental, que alegam ser isentos e imparciais, trocaram estes dois dogmas jornalísticos pela militância informativa na crise ucraniana, sem o menor constrangimento e escrúpulos. Seria um paradoxo inexplicável se não estivesse vinculado à estratégia da chamada “guerra da cognição”, um processo, relativamente recente, segundo o qual as guerras são decididas na mente das pessoas, tanto quanto no terreno militar. O principal instrumento desta nova estratégia bélica é a informação, mas o objetivo central é alterar a percepção e a opinião do público.  

Ao anunciar que não excluirá, temporariamente, postagens favoráveis ao Batalhão Azov, o Facebook incorporou-se ao proselitismo informativo a favor de um dos lados do conflito na Ucrânia, assumido pela maior parte da mídia ocidental. A atitude de Mark Zuckerberg contribui também para a geração de percepções e opiniões pessoais sobre a crise ucraniana, ameaçando colocar a todos nós como participantes, mesmo que involuntários, da estratégia informativa promovida pelo governo Zelensky. 

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Carlos Castilho é jornalista com doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento pelo EGC da UFSC. Professor de jornalismo online e pesquisador em comunicação comunitária. Mora no Rio Grande do Sul.