Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Futuro do jornal exige modelo híbrido na web

Para Raju Narisetti, editor-executivo digital do Wall Street Journal, os jornais que insistirem no modelo gratuito na internet, dependendo só de publicidade, não serão viáveis no longo prazo.

“O futuro da nossa indústria é algum tipo de modelo híbrido”, com receitas de assinaturas e de publicidade, afirma Narisetti, que vem a São Paulo para o 9º Congresso Brasileiro de Jornais.

Em entrevista por telefone, ele detalha a estratégia digital do WSJ, com paywall (muro de pagamento) para o site do próprio jornal, mas acesso gratuito para os demais sites do grupo.

Nascido na Índia e naturalizado americano, ele também comenta a janela de oportunidade que vê para os jornais dos países emergentes, como o Brasil, onde ainda há espaço para crescer na plataforma impressa.

Narisetti, 46, começou no indiano Economic Times, passou mais de uma década no WSJ, fundou o indiano Mint e comandou por dois anos a estratégia digital do Washington Post. Desde janeiro, está de volta ao WSJ.

Sua referência, para a estratégia digital do “WSJ”, é inovação. Como traduzir inovação para os jornais?

Raju Narisetti – Experiências criativas acontecem na intersecção de conteúdo e tecnologia. Minha definição de inovação é medida pela experiência que as pessoas têm com o conteúdo produzido por uma Redação. A maioria das organizações noticiosas tem as mesmas coisas. Algumas têm mais “furos” ou análise, mas 90% tendem a ser iguais. Para se destacarem, os jornais dependerão do quanto engajem as pessoas. Se elas vão para o WSJ na Olimpíada, a experiência da escrita, da análise, das artes, do vídeo da Olimpíada é o que vai trazê-las de volta, em vez de irem para o New York Times ou o Financial Times.

Como você conjuga o acesso pago ao site do WSJcom a gratuidade nos demais da rede, como o MarketWatch?

R.N.– O WSJ é o nosso modelo de assinatura premium. E o MarketWatch é, digamos, nosso modelo de massa. O conteúdo que oferecemos nesses sites é diferente porque atingimos públicos diferentes. Parte do objetivo é expor quem acessa o SmartMoney ou o AllThingsD, todos os nossos sites gratuitos, a parte do conteúdo do site premium. Mas eles também têm sua missão própria. O MarketWatch concorre com o Yahoo Finance, portanto velocidade e outros elementos são importantes.

Como você avalia o modelo de paywalldo WSJe os outros hoje no mercado, como o poroso, do NYT, que permite acesso gratuito a determinada quantidade de links?

R.N.– É difícil comparar, por algumas razões. Uma é que o WSJ sempre foi pago. Não tivemos de lidar com o desafio que modelos recentes enfrentam, como convencer as pessoas que vinham tendo algo de graça a pagar por ela, de uma hora para outra. Outra é que nosso público tem interesse central em negócios e no impacto dos negócios em suas vidas. Logo, ele quer pagar pelo conteúdo. Por isso o nosso é um modelo pioneiro e bem-sucedido de cobrança.

E o paywallporoso?

R.N.– O paywall que o NYT adotou é pouco diferente do nosso, mas é difícil comentar, pois os formatos de cobrança têm de ser muito direcionados ao modelo de negócios e ao público já existentes. Não tem como generalizar. Vários jornais regionais americanos estão abraçando esse paywall sem fazer a sintonia fina com as necessidades de seu público. Terão muita dificuldade, pois parte do conteúdo pode ser acessada gratuitamente em outros lugares. E não têm marcas com a força necessária.

E a gratuidade adotada por jornais como o Washington Poste o Guardian?

R.N.– Acho difícil acreditar que essas empresas serão viáveis no longo prazo se dependerem apenas da receita de publicidade. A oferta de espaço para publicidade é, vamos dizer, infinita. Qualquer um pode abrir um site, ele pode crescer rápido e oferecer uma alternativa aos anunciantes. O futuro da indústria é um modelo de tipo híbrido. É o passado, o presente e o futuro do WSJ. Uma marca nacional gratuita é uma proposta de negócios que tenho muita dificuldade de entender, a essa altura, na história das empresas de mídia.

NYT, FTe o próprio WSJtêm buscado atingir um público global. Esse é um caminho?

R.N.– Sim e não. Você precisa ter a marca e o conteúdo para ser um título global. Tem de atender às necessidades de muitos públicos diferentes. Nem todos podem se tornar marcas globais, não basta querer, porque isso exige investimentos significativos. Temos, na família Dow Jones de criação de conteúdo, 1.800 jornalistas pelo mundo, o que torna difícil a concorrência para quem não tenha tal alcance. E não esqueça que a publicidade digital depende muito de atingir públicos específicos. Ter um grande público global, mas com pequenos pedaços de público num monte de países, é até prejudicial para a sua posição publicitária.

Em 2007, você criou na Índia o jornal Mint. Quais são os desafios que emergentes como Índia, Brasil, talvez China, enfrentam no setor de jornais?

R.N.– É difícil juntar Brasil, Índia e China na mesma categoria e dizer que têm desafios similares. O que todos têm é uma oportunidade similar: população jovem, taxa crescente de alfabetização, ampliação da renda e parte da população se tornando mais globalizada, querendo mais informação. Há espaço para aumentar o público leitor do impresso, pois a infraestrutura de internet não é tão desenvolvida. Os hábitos de leitura ainda são voltados para o papel. Mas é claro que as mudanças digitais vão impactar esses mercados. Espero que se previnam ao ver o que está acontecendo para evitar os erros que as organizações ocidentais de mídia cometeram na transição digital.

Há pouco você levou a estrategista de mídia social do NYTpara o WSJ. Qual é sua política para as redes sociais?

R.N.– Liz Heron já havia trabalhado comigo no WP. Nós nos reunimos no WSJ pois sentimos que havia uma oportunidade global para socializar o nosso conteúdo, não só em inglês, mas em diferentes línguas, com impacto bem maior. Já somos inovadores, estamos entre os líderes no uso de Instagram e Twitter, e estamos acelerando. A minha visão pessoal sobre mídia social é que Twitter, Facebook e todas essas plataformas são tecnologias que precisam servir às nossas necessidades de negócios. Não pode ser o contrário, com os nossos negócios servindo às necessidades delas. Acredito que mídias sociais podem ser um modo efetivo de espalhar o nosso conteúdo e trazer as pessoas, de gerar assinaturas a partir de nosso conteúdo. As redes sociais são a ferramenta para isso. E também queremos participar da conversa, pois acreditamos que o nosso conteúdo, tanto o pago como o gratuito, tem valor tanto para os assinantes como para os não assinantes.

***

[Nelson de Sá, da Folha de S.Paulo]