No início deste mês, Dave Weigel, na Slate, examinou o desastroso tratamento inicial pela mídia de um relatório do Escritório de Orçamento do Congresso (CBO, em inglês) e abordou uma de minhas irritações preferidas: reportagens que passam direto pelas verdadeiras questões políticas para especular sobre como elas influirão politicamente. Penso nisso como reportagem de “segunda ordem”, e é quase sempre ruim.
Escrevi a respeito na campanha presidencial de 2004, quando fiz pesquisas minuciosas percorrendo dois meses de transcrições de noticiários da tevê. O que encontrei: “O senhor Kerry propõe gastar 650 bilhões de dólares para ampliar o seguro-saúde para famílias de baixa e média renda. Quer você aprove, quer não, não pode dizer que ele não abordou o tema. Por que este eleitor não ouviu falar a respeito? Bem, li 60 dias de transcrições dos lugares citados por quatro em cada cinco americanos como onde eles costumam obter notícias, as grandes redes de tevê a cabo ou aberta. Não importa os detalhes, eu não pude encontrar sequer uma declaração clara de que Kerry quer reverter os recentes cortes de impostos para pessoas de alta renda e usar o dinheiro para cobrir a maioria dos não segurados. Quando reportagens citaram o plano de Kerry, geralmente foi uma análise de corrida de cavalos, sobre como ela se desenrola, e não o que há nela”.
Agora, é doloroso admitir, mas de modo geral as reportagens sobre questões políticas realmente melhoraram desde então. Mas você ainda vê o velho estilo preguiçoso aparecer. No caso do relatório do CBO, suspeito que uma das principais razões pelas quais os repórteres recuaram foi por encobrirem seu próprio embaraço por inicialmente entender errado a substância. Mas ainda vale a pena dizer: é a maneira errada de agir.
Weigel realmente defendeu um argumento além do que eu defendi em 2004. Não apenas a reportagem de segunda ordem nega a informação que a audiência deveria receber. A verdade é que ninguém sabe como qualquer item do noticiário em particular influirá politicamente. Segundo os cientistas políticos, na verdade, a maioria das reportagens sobre políticos que disputam cargos e que parecem importantes não importa nada: as eleições são basicamente determinadas pelos desenvolvimentos econômicos e, ocasionalmente, pela guerra, não por gafes e tudo mais.
Não sou contra toda reportagem política: ela tem de ser feita, e anedotas coloridas fazem parte do que motiva as pessoas a ler jornais. Mas a substância sempre deve vir primeiro. E se os repórteres não compreendem a substância suficientemente bem, se eles não sabem o suficiente sobre a economia da reforma da saúde para distinguir entre perda de emprego e oferta de mão de obra reduzida, eles deveriam recusar a tarefa ou consultar alguém que conheça o assunto antes de começar a escrever.
Situação estranha
Em um post recente, o economista John Quiggin escreveu sobre um novo livro que se propõe a explicar as grandes ideias da macroeconomia, mas não contém qualquer macroeconomia, por assim dizer. Sua meditação envolve uma visão útil do ocorrido com a profissão nas décadas anteriores à crise de 2008 e uma análise muito interessante da situação atual.
“Falando de maneira geral, no que diz respeito à macroeconomia acadêmica, o DSGE [Nota do autor: DSGE é a sigla (em inglês) para Equilíbrio Geral Estocástico Dinâmico, basicamente a forma particular de modelagem econômica aceita nas publicações científicas hoje em dia] ganhou o dia”, escreveu Quiggin, “não tanto pela força do argumento, mas principalmente por manter o controle dos critérios para a publicação de artigos: OK, assumir o pleno emprego e ignorar a inflação, mas não omitir microfundações rigorosas para o modelo”.
Por outro lado, com o colapso da tese intelectual a favor da austeridade (embora não se dê o mesmo com a sua hegemonia política), os termos do debate público são definidos quase totalmente por Novos Velhos Keynesianos, como Krugman e DeLong (isso é verdade, mesmo que você não acredite, como eu, que o resultado desse debate foi uma vitória por nocaute do lado keynesiano).
É uma situação muito estranha, e creio que ela implica que alguém acabará na lixeira da história. Eu me pergunto: quem?
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Paul Krugman é economista, ganhador do Nobel de Economia de 2008