Na semana passada [retrasada], Arthur Sulzberger Jr., o publisher do New York Times, demitiu a editora-executiva, Jill Abramson. Em seguida, promoveu o então vice dela, Dean Baquet, para o cargo mais alto.
Os fatos por trás da demissão podem acabar vindo à tona. Parece que envolvem uma disputa entre Abramson e Sulzberger sobre igualdade salarial e a insatisfação de Baquet e Sulzberger com o modo como Abramson tentou contratar Jane Gibson, do Guardian, para comandar a operação digital do jornal, em pé de igualdade editorial com Baquet.
Sejam quais forem os fatos, a humilhação da demissão pública de Abramson gerou, com razão, uma tempestade de críticas a Sulzberger e ao tratamento deselegante e possivelmente discriminatório dado pelo jornal a problemas internos.
Abramson foi a primeira mulher a liderar o New York Times. Era elogiada por sua excelência como jornalista e por liderar a expansão digital e a recuperação financeira do jornal. Como muitos homens em cargos de liderança, porém, seu estilo foi descrito como brusco, autocrático e volátil. Fontes descrevem Baquet como calmo, uma pessoa que evita confrontos na Redação.
Essa narrativa guarda semelhanças notáveis com a que surgiu durante as primárias democratas, quando o senador Barack Obama e a senadora Hillary Clinton disputaram a candidatura presidencial.
Questões políticas
Num debate em 2008, Obama disse a Hillary: “Você é bastante amável.” As mulheres podem ser líderes excepcionais, sugeriu a observação, mas podem perder na ascensão ao topo se não o fizerem com um sorriso. Para tornar mais explícita a analogia Obama-Hillary-Baquet-Abramson, Baquet é um afro-americano de pele clara.
Vamos supor que o aparente ultimato apresentado por Baquet a Sulzberger – ou ela, ou eu – tenha sido justificado pela falta de transparência na contratação de Gibson. E vamos supor também que Sulzberger não tenha demitido Abramson porque ela contratou um advogado para ajudá-la a conquistar salário igual ao de seu predecessor.
Ainda assim nos resta a verdade de que as mulheres nas instituições americanas precisam não apenas sobressair em suas profissões, mas também, como escreveu Ann Friedman na New York Magazine, “… (diferentemente dos homens), espera-se que moderem sua autoconfiança para que pareçam não ameaçadoras e amáveis – sob pena de enfrentar consequências profissionais”. Isto, “um trabalho emocional”, Friedman escreve, “é a responsabilidade implícita na lista de atribuições do cargo de cada mulher”.
A luta inacabada pela igualdade de gêneros nos EUA ganhará mais atenção se Hillary se candidatar na eleição de 2016. Por enquanto, penso na eleição brasileira de 2010, em que Dilma foi muito criticada por não aparentar ser amável nem estar disposta a desperdiçar energia com aquele “trabalho emocional”.
Quer os brasileiros demitam Dilma ou a promovam a um segundo mandato, ao menos poderão ter certeza de que serão as questões políticas, e não os fatores impalpáveis de gênero, que vão determinar o resultado da eleição.
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Julia Sweig é colunista da Folha de S. Paulo