O Diário Catarinense circula, desde o dia 5 de agosto, sem as tradicionais editorias de Política, Economia, Mundo, Geral e Polícia. Agrupou-as na seção Notícias e, para os demais conteúdos, exceto Esporte e Anexo, mantidos em cadernos temáticos, criou a editoria Sua Vida. Para usar uma expressão usada e abusada por Latino, intérprete de Festa no Apê e Kuduro, o DC “juntou e misturou”. Em texto destinado aos leitores, o editor-chefe informou que o jornal mudou porque “sempre se reinventou para levar informações a um leitor com hábitos em permanente mutação”.
Outros jornais já trocaram editorias específicas por seções mais abrangentes. Em parte, mudanças assim se devem ao levante interdisciplinar, que provoca transformações tanto no jornalismo quanto na vida. Ora, o aquecimento global é um problema ecológico ou social? A máquina de laparoscopia vem da computação ou da medicina? A guerra no Oriente Médio têm a ver com história, geografia, religião ou todos esses campos juntos?
A interdisciplinaridade é um dos temas mais emergentes na academia. Ela consiste, segundo o professor Héctor Ricardo Leis, do departamento de Sociologia e Ciência Política da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em “um processo de resolução de problemas que, por serem complexos demais, não podem ser tratados por uma disciplina”. Para Olga Pombo, da Universidade de Lisboa, interdisciplinaridade é “um conceito que invocamos sempre que nos confrontamos com os limites do nosso território de conhecimento, sempre que topamos com uma nova disciplina cujo lugar não está traçado no grande mapa dos saberes, sempre que nos defrontamos com um problema cujo princípio de solução sabemos exigir o consumo de múltiplas e diferentes perspectivas”.
Mundo em transformação
Na prática, a interdisciplinaridade é o contrário da especialização. No caso da medicina, por exemplo, o especialista é aquele que, de início, escolheu ser médico, depois optou por ser ortopedista e, por fim, decidiu que entenderia de ombros. Do ponto de vista interdisciplinar, é bom que o médico seja especialista. Mas seria melhor se pudesse enxergar o paciente como um todo. E se o problema no ombro tiver relação com estresse ou má circulação? Outro especialista deve ser chamado?
Do ponto de vista histórico, interdisciplinaridade e especialização opõem-se há séculos: a primeira tem raiz na Grécia Antiga, quando se formulou a ideia do Uno e do Múltiplo e se estabeleceu que Filosofia, Matemática, Letras e Artes deveriam compor a formação de um intelectual; a segunda tem base em René Descartes (1596-1650) e Galileu Galilei (1564-1642), que defendiam “a necessidade de dividir o objeto de estudo para estudar finamente os seus objetos constituintes” e, depois, recompor o todo a partir daí. Dito de outra forma, acreditavam que conhecendo a parte poderiam conhecer o todo.
A nova ciência, diz o professor João Eduardo Pinto Basto Lupi, do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas da UFSC, é claramente interdisciplinar porque considera que “tudo está em relação a algo e deve ser considerado”. Ela “tem respeito por outras formas de ciência, por ciências femininas, por ervas, por conhecimentos práticos, por ciências orientais”. Nela, “há uma integração geral e holística”.
No caso do Diário Catarinense, a recém-criada editoria Sua Vida tem um propósito parecido. Vai juntar e misturar. Ou, como informou o jornal, a editoria vai concentrar“notícias sobre comportamento, finanças pessoais, carreira, saúde, família, espiritualidade, ambiente e mobilidade”. Nas palavras do editor-chefe, Edgar Gonçalves, trata-se de um “espaço para informar os impactos no ser humano de um mundo em acelerada transformação”.
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Jeferson Bertolinié repórter e doutorando em Ciências Humanas