Talvez o depoimento mais contundente, e significativo, nas 116 páginas do relatório “Tendências em Redações”, editado pelo Fórum Mundial de Editores (WEF), seja o da editora-chefe do escritório do The Guardian nos EUA, Janine Gibson, que liderou a cobertura do jornal durante as trepidantes semanas do affair Snowden e está de volta a Londres para assumir a edição digital do diário.
– Jornalistas são como as proverbiais baratas depois da guerra nuclear – eles vão encontrar um caminho, nós acharemos um caminho! – diz Janine em entrevista para o relatório, editado a cada ano com uma análise do que está acontecendo ou vai acontecer nas redações.
A compilação das 10 tendências de 2014 comprova que o jornalismo é mesmo resiliente e capaz de sobreviver a qualquer apocalipse, mas não sem uma boa dose de sobressaltos e de adaptações na travessia para o novo mundo. Vamos às tendências:
1. Proteção ao jornalismo na era da vigilância. Traumatizados pela ação dos serviços de segurança na apuração do caso Snowden, jornalistas estão adotando medidas similares às dos espiões e evitam ao máximo expor suas conversações, especialmente online e por telefone.
2. Mobile. Definido como “um alvo móvel” que ainda está por ser atingido pelas redações. No Financial Times, 62% do tráfego já vêm de smarthopnes e tablets. “Mobile first” é a expressão do ano, mas alguns analistas acreditam que a próxima onda será “plataformas agnósticas” – informação em tudo, complementarmente.
3. Verificação. Não acredite em tudo o que lê, especialmente se vier das redes sociais. O jornalismo profissional se volta para checar e confrontar o que está circulando – e iluminar a verdade. Seremos cada vez mais certificadores de informação.
4. Métricas. Redações se movem cada vez mais pelas análises de audiências, valorizadas agora pelo nível de engajamento – o tempo permanecido nos conteúdos e suas características.
5. Vídeo. Ok, assunto batido, mas já não se fala mais em vídeo como área à parte. Vídeo passa a fazer parte da narrativa trivial do jornal, além de ser uma forma consistente de gerar novas receitas.
6. Mulheres no comando. Maioria em muitas redações, as mulheres ainda são minoria nas cabeças das redações. Mas, apesar de saídas rumorosas dos comandos do The New York Times e do Le Monde, mulheres estão chegando ao primeiro posto em números crescentes, inclusive no mundo em desenvolvimento.
7. Jornalismo colaborativo. Crescem as formas autônomas de sites investigativos, que atuam de forma independente mas que também divulgam seus conteúdos nos veículos convencionais. A América Latina já tem uma rede deles.
8. Megamatérias. Grandes reportagens, com design excepcional e textos de tirar o fôlego. O velho e bom jornalismo em profundidade, expandido e enriquecido pelo mundo digital, separa as crianças dos homens no novo mundo da comunicação.
9. Publicidade nativa. Considerada o grande desafio para a integridade dos veículos, é uma tendência em alta, com a criação de áreas próprias de produção de conteúdo patrocinado. Cresce também a disposição dos melhores veículos de deixar claro o que é publicidade.
10. O novo editor. Em síntese, é aquele que não apenas distingue a boa e a má notícia e lidera pessoas, mas também conhece tecnologia e se preocupa com o lado business da informação.
>> A íntegra do relatório pode ser baixada em PDF aqui. Para sócios da WAN-IFRA, é grátis. Para não-sócios, custa 150 euros.
[Nota do OI: Uma versão integral, no Scribd, pode ser lida aqui (em inglês).]
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Marcelo Rech é diretor executivo de Jornalismo do Grupo RBS e vice-presidente do Fórum Mundial de Editores