No ano passado, a tiragem dos jornais diários caiu 2% em todo mundo, segundo a Associação Mundial de Jornais e Editores de Notícias (WAN-Ifra, na sigla em inglês). As exceções foram a Ásia e a América Latina, onde as tiragens cresceram. Mesmo assim, o jornal ainda tem mais leitores que a internet. Segundo a associação, 2,3 bilhões de pessoas leram os 519 milhões de exemplares de jornais publicados diariamente, enquanto 1,9 bilhão acessaram a internet.
A transição para o digital é um desafio. Christoph Riess, presidente da WAN-Ifra, apontou que jornais que estão obtendo sucesso nessa transição foram além do modelo de venda de espaço publicitário e assinaturas, criando novos produtos digitais. A seguir, trechos da entrevista concedida ontem, durante visita ao Estado.
“A informação está muito mais rápida”
Como o senhor vê o mercado brasileiro?
Christoph Riess– As tiragens do mercado brasileiro subiram 2% em 2009. Isso está de acordo com o cenário que estamos observando. Na Europa e Estados Unidos, as tiragens, nos últimos anos, estão em queda. Nos países em desenvolvimento, aumentam. Mas já há uma diferenciação. No Chile, as tiragens estão caindo. E observamos o mesmo na Coreia e no Japão, que são países muito desenvolvidos em jornais, que já atingiram o ponto máximo e começaram a baixar.
Existe como avaliar o potencial de crescimento desses mercados em desenvolvimento?
C.R.– Acho que o mercado está virando. Hoje em dia, fazemos a medição da tiragem impressa, que já não é a medição correta, porque no mundo, para 100 leitores do jornal impresso, há 30 leitores digitais. Eles são novos. Esses leitores acrescentaram, e mais que compensaram, o decréscimo de leitores do jornal impresso. O problema é que a fidelidade desse leitor é muito menor. Por exemplo, um leitor de jornal dedica 25 minutos para cada leitura. Um leitor da internet ou do celular dedica só quatro minutos.
Por que isso acontece?
C.R.– O hábito das pessoas muda. Quando eu era jovem, as pessoas combinavam aonde iriam no sábado. Hoje, os jovens saem sem combinar porque carregam uma tela móvel. A informação está muito mais rápida. As pessoas estão acostumadas a mudar de informação muito mais rapidamente e isso agora chega aos jornais.
“Os jornais precisam aproveitar essa situação”
O mercado americano fala de centavos digitais e dólares tradicionais.
C.R.– Principalmente nos EUA, a publicidade sempre foi muito forte. Os EUA tiveram uma receita de publicidade quatro vezes maior que a de venda dos jornais, enquanto que, na Europa, o dinheiro foi sempre equivalente, por parte de venda e por parte da publicidade. Os EUA foram prejudicados mais fortemente pela queda de publicidade, que foi de mais ou menos 30% no ano de 2009. Agora, claramente, em nenhum dos países, a receita da parte digital compensa o decréscimo da publicidade na parte impressa. É muito menor.
Qual é a saída?
C.R.– Os jornais devem encontrar novas maneiras de fazer negócio na parte digital. Isso não vai ser o negócio tradicional. Hoje em dia, na Europa, empresas como Schibsted, na Noruega, já têm de 30% a 50% dos negócios na área digital. Mas a maior parte são negócios completamente novos. Por exemplo, nos classificados de apartamentos não é só oferecer o mesmo que o classificado tradicional, mas serviços adicionais para as imobiliárias, como publicações com informações sobre os imóveis, qualquer serviço próximo, mais uma forma conteúdo que uma atividade tradicional do jornal.
Serviços que são diferentes de publicidade e assinaturas?
C.R.– É o conjunto. A vida dos jornais está cada vez mais complicada. O objetivo anterior era ter o máximo de leitores com o mesmo conteúdo e o jornal conseguia um bom lucro. Hoje, o objetivo é encontrar, para cada segmento, informações que tragam um benefício para o leitor individual. Aqui, os jornais brasileiros têm grandes vantagens. As marcas são muito fortes. O leitor vai confiar mais num serviço de classificados dos jornais na internet do que em algum serviço do Google. Os jornais precisam aproveitar essa situação, pois se não aproveitarem entram outras empresas completamente alheias ao setor de comunicação. Como foi o caso do Google, que hoje tem 65% de toda publicidade digital que os jornais perderam.
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[Cley Scholz e Renato Cruz são jornalistas]